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Capítulo 2: As Primeiras Pistas

Sofia acordou com o sol já alto, filtrando pelas persianas brancas do quarto. Eram quase dez horas — havia dormido pesado, exausta de tanto chorar e pensar. O celular na cabeceira mostrava 27 chamadas perdidas para Rafael e nenhuma resposta. Respirou fundo, vestiu uma calça jeans preta, tênis confortáveis e uma camiseta básica cinza. Pegou a bolsa transversal, as chaves do Mini Cooper e saiu sem tomar café. Não queria encontrar a mãe naquele estado novamente.

A primeira parada era o apartamento de Rafael em Moema. Um prédio moderno de 20 andares, com fachada de vidro fumê e portaria dupla — o tipo de lugar onde os moradores pagavam condomínio caro para ter privacidade absoluta. Sofia estacionou na rua lateral, respirou fundo e entrou.

O porteiro, Seu Antônio, a conhecia desde que Rafael se mudara para lá, três anos antes.

— Bom dia, Dona Sofia! Faz tempo que a senhorita não aparece. Seu irmão tá viajando, né?

— Bom dia, Seu Antônio. Na verdade... eu vim ver se ele deixou alguma coisa pra mim. Ele tá sumido, não atende o telefone.

O homem franziu a testa, preocupado.

— Olha, Dona Sofia, seu irmão saiu há uns dez dias com duas malas grandes. Disse que ia pro Rio a trabalho, mas depois uma moça loira veio aqui, pegou o resto das coisas dele e deixou as chaves comigo. Disse que era a noiva.

— Isabella? — perguntou Sofia, o coração apertando.

— Isso mesmo. Loira alta, muito elegante. Deixou um envelope pra senhora, aliás. Eu ia mandar pelo correio, mas como a senhorita tá aqui...

Seu Antônio foi até a guarita e voltou com um envelope branco simples, sem remetente. Dentro, apenas uma folha dobrada ao meio e a chave reserva do apartamento.

A letra era do Rafael — Sofia reconheceria em qualquer lugar, firme e ligeiramente inclinada.

"Mana, Desculpa não ter falado antes. Preciso de um tempo. Não se preocupa comigo, tô bem. Casamento é sábado. Se quiser vir, vai ser bom te ver. Se não, entendo. Te amo muito. Rafa"

Sofia leu três vezes, sentindo as lágrimas subirem. "Se quiser vir". Como se fosse uma opção. Como se ele estivesse convidando para um churrasco de fim de semana e não para o próprio casamento.

— Ele não deixou mais nada? — perguntou ela, a voz embargada.

— Não, filha. Só pediu pra eu cuidar das plantas até alguém voltar.

Sofia agradeceu, guardou o bilhete no bolso e saiu. No carro, bateu com força no volante. Tempo? De quê? Por quê?

Próximo destino: o banco onde Rafael trabalhava, no coração do Itaim Bibi. O prédio era um espelho gigante refletindo os arranha-céus ao redor. Sofia entrou na recepção climatizada, o salto dos sapatos ecoando no mármore.

A recepcionista, uma mulher de tailleur impecável chamada Marta, sorriu ao reconhecê-la.

— Sofia! Que saudade. Veio ver o Rafa?

— Na verdade... vim tentar entender onde ele tá. Ele não responde ninguém.

O sorriso de Marta morreu.

— Ah, querida... seu irmão pediu demissão na semana passada. Entregou o crachá, assinou os papéis e foi embora. Disse que ia se casar e mudar de vida. Eu até brinquei que era brincadeira, mas ele tava sério. Nem festa de despedida quis.

Sofia sentiu o chão sumir.

— Demissão? Mas ele amava esse emprego...

— Eu sei. Todo mundo ficou chocado. O chefe dele tentou convencer a ficar, ofereceu aumento, mas ele disse que era decisão tomada.

Sofia saiu dali atordoada. Dirigiu sem rumo por um tempo, acabou parando na Avenida Faria Lima, em um café moderno com mesas na calçada. Pediu um cappuccino grande e sentou-se do lado de fora, precisando de ar.

Foi quando o viu.

Um rapaz de uns 25 anos, alto, cabelo preto bagunçado caindo sobre a testa, olhos castanhos intensos. Vestia uma jaqueta de couro surrada sobre camiseta preta e jeans escuro. Estava na mesa ao lado, laptop aberto, digitando rápido, concentrado. No antebraço direito, uma tatuagem visível: uma âncora com a palavra “Resiliência” em letras pequenas.

Ele ergueu os olhos por um segundo, encontrou os dela e sorriu de leve — um sorriso torto, quase tímido. Sofia desviou o olhar, envergonhada, mas ele falou mesmo assim.

— Desculpa a intromissão, mas você parece que tá carregando o mundo nas costas. Tudo bem?

A voz era grave, com um leve sotaque paulista da periferia — nada do tom afetado da elite.

Sofia hesitou, mas algo naquele olhar direto a fez responder.

— Dia ruim. Problema de família.

Ele fechou o laptop devagar.

— Família é especialista em complicar tudo, né? Eu sou Lucas. Lucas Ferreira.

— Sofia Almeida.

— Prazer, Sofia. — Ele estendeu a mão por cima da gradezinha que separava as mesas. A mão era quente, firme. — Jornalista freelance. Vivo de fuçar a vida dos outros, então se quiser desabafar com um estranho, sou profissional.

Ela riu pela primeira vez em dias — um riso curto, mas genuíno.

— Talvez eu precise mesmo de um estranho.

E contou. Não tudo de uma vez, mas o suficiente: o irmão que sumiu, o casamento surpresa, a demissão repentina, o bilhete frio.

Lucas ouviu sem interromper, os olhos atentos. Quando ela terminou, ele assoviou baixo.

— Isso tem cara de quem tá fugindo de alguma coisa grande. Ou protegendo alguém.

— Tipo o quê?

— Dívidas, talvez? Chantagem? Eu cubro histórias de vícios e crimes organizados em São Paulo. Cassinos clandestinos, agiotas... esse mundo suga famílias inteiras.

Sofia congelou.

— Meu pai... ele j**a. Muito. Cassinos ilegais.

Lucas ergueu uma sobrancelha.

— Sério? Então pode ser isso. Já ouvi casos de filhos que casam com gente rica pra tentar salvar os pais das dívidas. Ou pra pagar agiotas antes que eles cobrem na marra.

Ele pegou o celular, abriu um bloco de notas.

— Me dá o nome completo do seu irmão e da noiva. Eu dou uma fuçada nos meus contatos. Talvez ache alguma pista.

Sofia hesitou só um segundo antes de ditar: Rafael Almeida, Isabella Monteiro.

Lucas anotou, depois olhou para ela com intensidade.

— Enquanto isso, você já pensou em ir até essa fazenda em Campinas? Confrontar ele pessoalmente?

— Pensei. Mas são três horas de estrada, e eu não sei se aguento ouvir dele que “precisa de tempo”.

— Eu topo ir junto, se quiser. Tenho um carro decente e curiosidade profissional.

Sofia olhou para ele, surpresa. Um estranho se oferecendo para acompanhar numa viagem maluca?

— Por quê?

Lucas deu de ombros, o sorriso torto voltando.

— Porque histórias como essa raramente acabam bem sozinhas. E porque você tem olhos que não merecem estar tão tristes.

O coração dela deu um salto inesperado. Não era paquera barata — era algo mais honesto, quase protetor.

Trocaram números. Ele prometeu mandar qualquer informação que encontrasse até o fim do dia.

Quando Sofia entrou no carro para voltar para casa, sentiu algo novo no peito: não era mais só dor. Era determinação. E, talvez, o começo de uma esperança.

Naquela noite, Lucas mandou uma mensagem:

“Descobri o endereço exato da Fazenda Boa Vista. E um contato que conhece os seguranças de lá. Amanhã a gente decide o próximo passo. Boa noite, Sofia.”

Ela respondeu com um simples “Obrigada” e um emoji de coração — o primeiro em semanas.

Enquanto isso, em Campinas, Rafael olhava pela janela do quarto luxuoso da fazenda, o celular na mão, o dedo pairando sobre o nome “Mana” na lista de contatos. Isabella dormia ao lado, linda e serena.

Ele quase ligou.

Quase.

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