Aurora digitava nervosamente na tela do tablet que lhe haviam entregue na recepção. Seu primeiro “procedimento” na empresa Salvatore Industries não era uma integração padrão, como esperava, mas a leitura e assinatura de um contrato digital com cláusulas confidenciais.
Nenhuma entrevista formal. Nenhuma apresentação de equipe.
Apenas ela, sentada numa sala de vidro com vista para os arranha-céus, com uma assistente discreta que aguardava em pé do lado de fora. E o contrato. Com trinta e sete páginas.
Ela esfregou a testa, relendo pela terceira vez a cláusula que dizia:
"O funcionário compromete-se a manter sigilo absoluto sobre qualquer informação adquirida em ambiente executivo, incluindo, mas não se limitando a, conversas pessoais, comportamentos não profissionais, ou interações de natureza íntima."
“Interações de natureza íntima”? Aquilo era uma cláusula padrão?
Sentiu um calafrio. Passou para a próxima página. Cláusula 21:
"É vedado ao contratado manter envolvimento afetivo ou sexual com colegas de equipe, exceto em casos sob supervisão direta do CEO, em que regras adicionais serão fornecidas."
Ela parou. Sua garganta ficou seca.
Sob supervisão direta do CEO?
Fechou os olhos por um momento. Aquilo era loucura. Ou um erro. Talvez fosse um modelo-padrão usado por alguma outra empresa? Talvez ele usasse o mesmo contrato para… outras assistentes?
A porta se abriu de repente.
— Não precisa terminar agora. — Enzo Salvatore entrou sem pedir licença. — Há cláusulas que são atualizadas pessoalmente. Por mim.
Aurora se levantou automaticamente, como se ele trouxesse consigo um campo gravitacional que a obrigasse a agir. Enzo caminhou até ela e estendeu a mão, pegando o tablet das suas mãos sem esperar autorização.
Seus dedos tocaram os dela por um segundo. E foi o bastante para Aurora sentir um arrepio escorrer pela pele como se tivesse sido invadida por uma corrente elétrica. Ela odiava o efeito que ele tinha sobre seu corpo. E odiava mais ainda o fato de não conseguir controlar.
— A maioria das pessoas para aqui. — Ele olhou para ela com aquela expressão indecifrável. — Você parou na cláusula 21.
Ela manteve o olhar firme.
— A cláusula é... incomum.
— Não nesta empresa. — Ele girou o tablet nas mãos. — Eu gosto de manter tudo sob controle. Inclusive as relações que me cercam.
Aurora cerrou os dentes.
— Está me propondo um contrato de submissão, senhor Salvatore?
Um leve sorriso dançou nos lábios dele. Mas não era deboche — era interesse.
— Submissão é uma palavra forte. Eu prefiro chamar de... parceria com benefícios exclusivos. Totalmente opcionais. — Deu um passo à frente. — Mas, para ser clara, não faço isso com qualquer uma.
— Então por que eu?
Ele a olhou como se analisasse cada centímetro da sua alma.
— Porque você parece saber o quanto vale. Mesmo que ainda não tenha descoberto.
As palavras dele bateram em algo fundo dentro dela. Aurora respirou fundo, tentando manter o controle.
— Isso é algum tipo de teste? Parte da contratação?
— Considera um convite. — Enzo entregou o tablet de volta. — Você pode assinar apenas até a cláusula 20 e terá um emprego tradicional. Secretária executiva. Bom salário. Sala confortável. Cumprimentos distantes.
Ele fez uma pausa, olhando-a diretamente nos olhos.
— Ou pode assinar até o final. E ter acesso ao que poucas já tiveram. Uma sala ao lado da minha. Um cartão preto sem limites. E noites... inesquecíveis.
O silêncio que se seguiu foi tão denso que Aurora quase pôde ouvi-lo.
Ela queria rir. Fugir. Sair daquela torre de vidro com sua dignidade intacta. Mas algo na postura dele, no tom da voz, no magnetismo impossível de ignorar… a segurava ali.
— Posso pensar? — perguntou, em voz baixa.
— Tem até amanhã às dez. — Ele virou-se para sair, mas parou à porta. — Se assinar, usará salto alto. Apenas preto. Todos os dias.
Ele saiu da sala como se não tivesse acabado de reescrever todas as regras do universo dela.
Aurora sentou-se devagar, os dedos tremendo, o coração disparado.
E ela não sabia o que doía mais: o medo de assinar... ou a vontade absurda de descobrir o que havia depois da cláusula 37.