Capítulo 5

A noite foi infernal.

Não do tipo "dormi mal" ou "acordei algumas vezes". Foi do tipo "será que vou sobreviver até o amanhecer ou vou desmaiar de exaustão no meio do quarto?"

Descobri, pela dor, que oitenta por cento do choro noturno de bebê é fome.

Choro 1, às duas da manhã: fome.

Choro 2, às quatro: fome de novo.

Choro 3, às cinco e meia: fome disfarçada de drama existencial.

Entre uma mamadeira e outra, cambaleei pelo quarto escuro, tropeçando na beirada do tapete, derrubando coisas, tentando não acordar completamente porque sabia que teria que levantar de novo em pouco tempo.

Às seis da manhã, quando Liam finalmente adormeceu feito um anjinho inocente, fiquei debruçada na grade do berço, olhando para aquele rostinho tranquilo. As bochechas rosadas, os cílios longos descansando sobre a pele macia. Ele parecia a criatura mais pacífica do universo.

— Agora você dorme, né, criatura? — murmurei, passando a mão pelo rosto cansado. — Se eu tivesse metade da sua liberdade pra gritar por mamadeira, eu estaria gritando por chocolate agora.

Mas não tinha tempo pra lamentações. Às sete em ponto, outra funcionária chegaria para assumir o turno diurno com o Liam. E minha responsabilidade da manhã era clara: deixar Olívia pronta, dar o café dela, e levá-la para a escola.

Simples. Teoricamente.

Às sete e meia, eu já estava arrependida de ter acordado.

O quarto de Olívia era organizado demais para uma criança. Paredes cor-de-rosa claro, prateleiras cheias de livros alinhados por tamanho, uma escrivaninha pequena com cadernos empilhados em ordem perfeita. Tudo no lugar. Tudo controlado.

Ela estava sentada na beirada da cama, me observando com aquela expressão de juíza severa enquanto eu tentava fazer um rabo de cavalo no cabelo castanho dela.

— Tá torto — comentou.

Desfiz e refiz pela terceira vez.

— Pronto. Agora tá reto.

Ela pegou o espelhinho de mão da mesinha e analisou criticamente.

— Hoje não é dia de cabelo maluco, sabia?

Arregalei os olhos.

— Eu não fiz um cabelo maluco! Fiz um rabo de cavalo!

— Um rabo de cavalo maluco — ela corrigiu, muito séria.

Respirei fundo, tentando manter a paciência.

— Olívia, a gente precisa descer rápido. Se o seu pai receber uma notificação que você chegou atrasada, ele não vai gostar nada.

Ela deu de ombros, mas levantou da cama e foi até o closet pegar o uniforme.

Descemos para a cozinha já um pouco atrasadas. Dava tempo, mas precisava ser rápida.

A funcionária da cozinha tinha deixado tudo pronto: cesta de pães frescos, frutas cortadas em formato de estrelas, sucos naturais em jarras de vidro, geleias artesanais. Parecia cenário de revista.

Eu só precisava servir Olívia e fazer a lancheira dela.

Coloquei frutas no prato, um pão com geleia natural, e servi o suco. Então fui até a bancada onde estavam os copos térmicos para encher de suco o que ela levaria para a escola e guardei na lancheira de Olívia.

Quando finalmente terminei de arrumar tudo, suspirei aliviada e fui me sentar na bancada ao lado dela para tomar meu próprio café.

Mal encostei o quadril no assento quando Olívia gritou:

— Não senta aí!

Levantei num pulo, o coração disparado.

Por um segundo, achei que ela estava me proibindo de me sentar com ela. Como se funcionária não pudesse dividir o mesmo espaço.

Mas então ela murmurou, baixinho, olhando para a banqueta vazia:

— Era o lugar da mamãe.

Meu estômago apertou.

Olhei para a cadeira. Para Olívia. Para a expressão no rostinho dela: pequena, vulnerável, genuinamente dolorida.

Pela primeira vez, vi algo além da mini executiva assustadora. Vi uma criança de seis anos que ainda sentia falta da mãe.

— Desculpa — disse, a voz saindo baixa. — Eu não sabia.

Ela deu de ombros, voltando a atenção para o prato, mas não disse mais nada.

Me sentei duas banquetas mais longe, em silêncio.

Foi quando ouvi passos firmes no corredor.

Senhor Novak entrou na cozinha, impecável como sempre. Terno azul-marinho, cabelo perfeitamente penteado, gravata ajustada.

— Bom dia — disse, a voz grave ecoando no ambiente.

— Bom dia — respondi automaticamente, baixando os olhos para o pão na minha frente.

Olívia murmurou um "bom dia, papai" sem tirar os olhos do prato.

Fiquei quietinha, fingindo estar muito ocupada passando geleia. Invisível. Funcionária invisível.

Senhor Novak caminhou até a bancada, olhando ao redor com aquela atenção aos detalhes que parecia parte da personalidade dele.

— Cadê o copo térmico que estava aqui separado?

— Ah — respondi, tentando soar útil. — Já guardei na lancheira da Olívia.

Ele parou. Virou a cabeça devagar na minha direção.

Então pegou o outro copo que estava na bancada.

Levantou, me mostrando.

— Por que você achou que seria uma boa ideia Olívia ficar com o copo adulto e eu levar o rosa de unicórnios para o trabalho?

Senti o sangue fugir do meu rosto.

Merda.

— Eu… eu vou resolver isso agora! — disse, levantando num pulo e indo até a lancheira de Olívia.

Peguei o copo térmico prateado e comecei a tentar abrir para transferir o líquido para o copo certo.

Só que o copo era tecnológico demais para mim. Tinha uma tampa com trava, botão, algum mecanismo que eu não entendia. Girei para um lado. Nada. Girei para o outro. Continuou fechado.

Comecei a forçar, a balançar.

— Você tem certeza de que sabe o que está fazendo? — Olívia perguntou, me observando com aquela expressão cética.

— Claro — menti, apertando mais o botão e sacudindo o copo.

Não ia admitir na frente de Senhor Novak que eu era uma fraude completa.

Forcei mais um pouco. Balancei. Torci a tampa com mais pressão.

E então ela abriu.

Bruscamente.

O suco de laranja voou em jato direto para Senhor Novak, acertando o terno azul-marinho, a camisa branca impecável, a gravata de seda.

Tudo.

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor.

Senhor Novak ficou parado, pingando suco, me encarando com aquela expressão neutra que de alguma forma era pior do que se ele estivesse gritando.

Eu estava congelada, segurando o copo vazio, ainda processando o desastre.

Se existisse um prêmio para a funcionária que mais se autossabota em menos de 24 horas, eu já podia agradecer à academia.

Foi quando Olívia começou a rir.

Uma risada genuína, alta, infantil.

— Pelo menos essa babá é engraçada — ela disse, entre gargalhadas.

Mas Senhor Novak não estava rindo.

Ele limpou o rosto com a mão, o maxilar tenso, respirou fundo, e então virou-se para sair da cozinha, pisando firme.

Antes de desaparecer pelo corredor, ouvi ele murmurar, baixinho mas perfeitamente audível:

— Depois eu que sou o ogro.

Ele ouviu.

Ele realmente ouviu.

Não era especulação. Não era paranoia. Ele tinha acabado de confirmar, com todas as letras, que escutou eu o chamando de ogro pela babá eletrônica ontem à noite.

E pior, tinha ouvido eu dizer que o achava bonito também.

Parabéns, Mareu. Talvez você devesse pesquisar no G****e como ativar o modo silencioso da própria língua.

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