Mundo de ficçãoIniciar sessãoA dor começou na base da nuca.
Sutil, quase imperceptível, como uma fisgada leve. Mas foi se espalhando. Descendo pela espinha. Espalhando-se como fogo líquido sob a pele. Selena acordou arfando, as mãos apertando os lençóis. O quarto ainda estava escuro, mas o corpo já em alerta. — De novo… — sussurrou, sentando-se com esforço. Era a terceira madrugada seguida em que o corpo reagia sem explicação. O colar queimava, a pele formigava, os sentidos pareciam afiados demais. Luz demais. Som demais. Presença demais. Principalmente uma presença. Darian. Mesmo longe, ela sentia o nome dele dançando nas veias. E isso estava começando a assustá-la mais do que tudo. Levantou e caminhou até o espelho antigo no canto do quarto. O reflexo não mostrava nada de anormal. Mas ela sabia. O corpo estava mudando. Na fortaleza, Darian estava de joelhos. A respiração pesada. Os olhos apertados. O peito arfando como se estivesse preso entre a forma humana e algo além. Eleonora o observava à distância, séria. — Está acontecendo — disse ela, sem surpresa. — Você está se quebrando por dentro. — Eu estou segurando. Mas o lobo... não vai aguentar por muito tempo. — Você está lutando contra o que foi feito pra acontecer. — E se ela ainda não quiser? — O vínculo não espera permissão. Mas a aceitação… pode salvar vocês dois. Ele se levantou com esforço, os músculos tensos como cordas prestes a arrebentar. — Eu preciso vê-la. Eleonora assentiu. — Mas sem tocar. Se tocar… você pode não conseguir parar. No vilarejo, Selena saiu de casa cedo, os passos mais rápidos do que o normal. A cabeça latejava. As mãos suavam. Cada ruído na floresta soava como um sussurro direcionado a ela. Foi até a beira do bosque. Parou. Fechou os olhos. O cheiro da terra subia pelas narinas. Mas misturado a ele… o perfume dele. Selvagem, quente, amadeirado. Real. Ela mordeu o lábio inferior, tentando conter as lágrimas. — Eu estou enlouquecendo. Mas uma parte dela já sabia: não era loucura. Era laço. Enquanto isso, no coração da fortaleza, Theron se reunia com dois guardiões mais jovens. — Ele está vulnerável — dizia ele, de forma calculada. — O vínculo o enfraquece. E quando a fera quebra o homem… alguém precisa estar pronto pra tomar o lugar. — Está dizendo que vai desafiar o Alfa? — Estou dizendo que o clã precisa de estabilidade. E um homem que perde o controle por causa de uma mulher... não é mais Alfa. É ameaça. Os olhos do mais novo guardião vacilaram. Theron percebeu. Sorriu, venenoso. — Em breve, todos verão. No cair da tarde, Selena voltou para casa cambaleando. O colar estava quente demais, queimando contra a pele. Entrou sem dizer nada. A Anciã a viu passar e apenas murmurou: — Está começando a doer, não está? Selena parou na escada. — O que está acontecendo comigo? A Anciã se levantou devagar, como quem carrega séculos nos ossos. — Seu corpo está despertando para algo que a mente ainda tenta negar. — Isso não é normal. — Nem deveria ser. Selena se virou, ofegante. — Eu não quero isso. — Mas já tem. — Como eu me livro? A Anciã se aproximou. — Você não se livra de um chamado assim. Você atravessa ele. Ou ele atravessa você. Selena se calou, engolindo o choro. — E se for mentira? Se ele estiver mentindo? A Anciã olhou nos olhos dela, firme. — O instinto não mente. Mas os homens... às vezes, sim. Naquela noite, Selena dormiu por poucos minutos. E foi suficiente para o pesadelo vir. Ela corria por uma floresta em chamas. Gritava, mas não ouvia a própria voz. Algo a puxava para dentro das sombras — algo com olhos cinzentos e uma respiração entrecortada. Quando acordou, o corpo estava coberto de suor. E o colar... partido em dois. Ela gritou. A Anciã veio correndo. — Quebrou — sussurrou a mais velha, pegando os pedaços da pedra. — O elo está mais forte agora. Não há mais contenção. — O que isso significa? A resposta foi curta. — Que ele vai sentir. E vai vir. Do outro lado da floresta, Darian acordava com um rugido na garganta. O peito ardendo. As mãos em chamas. E o nome dela cortando o ar: — Selena.






