A luz da manhã invadia o quarto amplo com cortinas de linho branco, desenhando padrões suaves sobre os lençóis. Isabela acordou devagar, como se sua mente estivesse tentando entender se tudo o que aconteceu no dia anterior tinha sido apenas um sonho absurdo.
Mas não era.
Ela virou-se e viu o vazio ao seu lado na cama — e por um segundo, sentiu alívio. A última coisa que queria era acordar com Leonardo ali, observando-a com aquele olhar de quem enxerga mais do que deveria.
Levantou-se, os pés tocando o chão frio de mármore. O quarto — em um hotel de luxo onde Leonardo havia reservado a suíte presidencial para passar a “lua de mel” — parecia uma ironia viva. Eles haviam se casado na frente de trezentas pessoas. Havia fotos, vídeos, manchetes espalhadas pelos sites de fofoca. Mas entre os dois... tudo era tão real quanto um roteiro bem ensaiado.
Ao sair do quarto, ela encontrou Leonardo já à mesa, impecavelmente vestido, lendo o jornal como se nada tivesse mudado em sua vida.
— Bom dia, senhora Vasconcellos — disse, sem tirar os olhos da página.
Isabela revirou os olhos, pegando uma xícara de café da bandeja servida sobre a mesa.
— Se quiser manter as aparências, pode pelo menos fingir que isso não é bizarro.
Ele fechou o jornal, finalmente encarando-a. O terno cinza escuro realçava ainda mais o tom azul-gelo dos olhos.
— O que é bizarro, exatamente? Ter se casado comigo? Ou estar sendo servida como uma princesa em um dos hotéis mais caros da cidade?
Ela sentou-se à frente dele, cruzando as pernas.
— As duas coisas. Mas principalmente estar casada com um estranho que fala como se fosse dono do mundo.
— Só de metade dele, por enquanto — ele respondeu, com um sorriso de canto. — E, como combinado, está na hora de falarmos sobre o contrato.
Isabela se recostou na cadeira.
— Estou ouvindo.
Leonardo tirou um envelope da pasta ao lado e o colocou sobre a mesa.
— Contrato de união estável com cláusulas específicas. Estabelece um prazo de doze meses. Durante esse período, viveremos sob o mesmo teto, teremos uma agenda pública como casal e você receberá uma compensação mensal generosa. Ao final, nos divorciamos discretamente e cada um segue sua vida.
— E o que eu tenho que fazer além de sorrir para as câmeras?
— Me acompanhar em eventos da família, manter as aparências e... não se apaixonar por mim — disse com um sorriso irônico.
Isabela bufou.
— Pode ficar tranquilo. A última coisa que preciso agora é me envolver com outro homem com ego inflado.
— Então estamos em perfeito acordo — ele disse, empurrando o contrato em sua direção. — Leia com calma. Mas saiba: quanto mais rápido assinarmos, mais rápido tudo isso pode parecer menos... improvisado.
Ela pegou o envelope e se levantou, a xícara ainda nas mãos.
— Só uma coisa, Leonardo.
— Diga.
— Não pense que pode me controlar. Eu entrei nesse jogo para vencer também. E se me subestimar… vai se arrepender.
Ele a observou sair com um meio sorriso no rosto.
Leonardo Vasconcellos podia ser muitas coisas — poderoso, controlador, misterioso. Mas, pela primeira vez em muito tempo, estava curioso. Porque, ao contrário de todas as mulheres que já passaram pela sua vida, Isabela não queria encantá-lo. Ela queria sobreviver a ele.
E isso, para ele, era perigosamente interessante.
O envelope repousava sobre a cama, intacto, como se soubesse o peso que carregava. Isabela o observava há vários minutos, sentada com as pernas cruzadas, as mãos trêmulas segurando o café agora frio.
Ela sabia que, a partir do momento em que abrisse aquele contrato, não haveria mais espaço para arrependimentos.
Casada já estava.
Mas aceitar os termos daquele jogo era outra coisa.
Respirou fundo e, finalmente, rasgou o lacre. As folhas deslizaram entre seus dedos com uma formalidade quase cruel. As cláusulas estavam lá, frias e precisas: convivência sob o mesmo teto, presença em eventos sociais, proibição de envolvimento amoroso fora do casamento enquanto durasse o contrato, confidencialidade absoluta. E a última linha:
“Nenhuma das partes deverá permitir envolvimento emocional. Este é um acordo comercial.”
Ela leu a frase três vezes, como se o papel estivesse tentando lembrá-la de que aquilo não era — e nunca seria — um conto de fadas.
Mas então, algo chamou sua atenção. Um adendo escrito à mão no final do contrato:
“Cláusula extra: qualquer das partes pode romper o contrato com aviso prévio de 30 dias — mas, nesse caso, todos os termos financeiros serão anulados.”
Isabela sorriu com amargura. Leonardo pensava em tudo. Inclusive na possibilidade de ela fugir no meio do caminho.
— Covarde — murmurou, como se ele pudesse ouvir do outro lado do hotel.
Mais tarde, desceu até o saguão e o encontrou à espera, como se já soubesse que ela viria. Estava ao celular, falando em francês com alguém do que parecia ser o conselho da empresa. Mas ao vê-la, encerrou a ligação imediatamente.
— Assinou?
Ela estendeu o contrato, assinado com uma caneta de tinta preta e traços firmes.
— Espero que esteja pronto para conviver com alguém que não vai baixar a cabeça para você.
Ele pegou o papel, conferiu a assinatura e guardou com cuidado.
— Na verdade, acho que é exatamente disso que eu estava precisando.
Isabela estreitou os olhos, desconfiada.
— E agora?
— Agora vamos para a mansão Vasconcellos. A mídia já deve estar à nossa espera e minha mãe, com certeza, também. Ela está furiosa, claro. Esperava que eu me casasse com alguma socialite de sobrenome longo e sem personalidade.
— Ela vai me odiar — Isabela concluiu, ajeitando o cabelo.
— Vai — ele confirmou, seco. — Mas se conseguir sobreviver a ela, sobrevive a qualquer coisa.
Ela ergue o queixo, desafiadora.
— Eu fui traída pela minha melhor amiga e abandonada no altar. Sua mãe vai ter que se esforçar muito para me derrubar.
Leonardo soltou uma risada rápida.
— Isso está ficando interessante.
Eles saíram juntos, a porta giratória do hotel se abrindo para uma multidão de flashes e repórteres. Isabela vestiu seus óculos escuros como uma armadura. Estava ali, de mãos dadas com um homem que não conhecia, enfrentando o mundo como se fosse uma mulher segura, intocável, imune.