O salão, preparado para uma celebração tradicional, se transformou em um campo de batalha silencioso.
As pessoas cochichavam sem qualquer pudor. Celulares eram erguidos, fotografias capturadas às pressas, olhos arregalados acompanhavam cada passo do casal no altar. Mas o que mais impressionava era a calma de Isabela. Ela estava no olho do furacão… e ainda assim, parecia inabalável.
Thiago, parado no centro do altar, os olhos fixos nela, parecia não saber se gritava ou desmaiava. Quando finalmente criou coragem para dar um passo à frente, Isabela o deteve com o olhar.
— Um movimento, Thiago, e juro que você vai sair daqui algemado — sussurrou, fria como nunca antes.
Ele estacou.
— Isso é loucura, Isabela! Quem é esse cara? O que você pensa que está fazendo?
Leonardo interveio, com um sorriso cortês, mas a voz afiada como lâmina:
— Acredito que ela está se casando, senhor. O senhor teve sua chance e desperdiçou. Agora, seja educado e sente-se.
Thiago o encarou, sem saber se ficava furioso ou humilhado. Aquilo estava longe de ser apenas um escândalo amoroso — era uma derrota pública.
O celebrante, completamente perdido, olhava para as folhas em suas mãos como se esperasse uma resposta surgir do papel. Isabela o encarou.
— Podemos continuar?
Ele pigarreou.
— É... sim, claro. Damos continuidade à cerimônia...
A voz trêmula do celebrante se sobrepôs ao murmúrio incessante da plateia. Leonardo ofereceu sua mão. Isabela a segurou com firmeza, ignorando o suor gelado nas palmas. Seu coração batia como um tambor, mas ela não podia vacilar.
A cada palavra dita, a cada voto improvisado, ela sentia que algo dentro dela se transformava. Aquela mulher romântica, sonhadora, ingênua… morria ali mesmo, no altar.
Em seu lugar, surgia uma mulher nova. Uma mulher que não aceitava migalhas, que não se deixava humilhar, que era capaz de tomar o controle da própria história.
Quando chegou o momento da troca das alianças, Clara se aproximou, entregando as joias com mãos trêmulas. Era evidente que ela ainda não conseguia acreditar no que estava acontecendo.
Leonardo pegou a aliança com delicadeza e, encarando Isabela nos olhos, deslizou-a em seu dedo.
— Prometo te proteger — disse em voz baixa, para que apenas ela ouvisse. — Pelo menos enquanto nosso contrato durar.
Ela arqueou uma sobrancelha, provocando:
— E depois disso?
— Depois disso… veremos quem protege quem.
Os convidados, ainda atônitos, explodiram em aplausos hesitantes quando o celebrante pronunciou a sentença:
— Eu os declaro marido e mulher.
Foi ali, sob o som desconfortável de palmas desconexas, que Isabela percebeu: não havia volta. Ela havia se casado com um homem que conhecera minutos antes. Por impulso. Por orgulho. Por dor.
Leonardo se aproximou e, mantendo o teatro até o fim, inclinou-se e roçou os lábios na bochecha dela, sem pressa, sem invadir. Um toque respeitoso… e cheio de promessas veladas.
Ao se virarem para encarar os convidados, ela percebeu o olhar de Marina, escondida entre os presentes. O choque em seu rosto era ainda mais saboroso do que o de Thiago.
Assim que os aplausos desconcertados cessaram, Isabela e Leonardo caminharam lentamente pelo corredor central. Os olhares continuavam cravados neles, como lâminas afiadas, e o som abafado de cochichos os acompanhava a cada passo.
Thiago permanecia parado, pálido, e Marina tentava desaparecer atrás de uma coluna de flores, como se pudesse se esconder do escândalo que ajudou a criar. Isabela ignorou os dois, mantendo a cabeça erguida como uma rainha. Por dentro, o caos ainda fervia, mas por fora... ela era puro aço.
Ao chegarem ao saguão do salão de festas, o ar parecia mais leve — ou talvez fosse só a ausência do altar e do constrangimento sufocante. Leonardo soltou o braço dela com gentileza, mas sem hesitar.
— Está pronta para a segunda parte do teatro? — perguntou, ajustando os punhos da camisa por baixo do paletó com um tique impecável.
— Dançar valsa com um estranho, sorrir para fotos e fingir que esse casamento é real? — ela respondeu com sarcasmo. — Sempre sonhei com isso.
Ele riu, brevemente.
— Você tem mais sangue frio do que eu esperava.
— E você é mais insolente do que eu imaginava — retrucou, cruzando os braços. — Agora que fomos oficialmente casados, talvez queira me explicar quem diabos é você e o que realmente quer com isso.
Ele a olhou por um momento, sério, antes de responder.
— Leonardo Vasconcellos. Vice-presidente do Grupo Vasconcellos. Meu pai está doente. O testamento dele exige que eu esteja casado para assumir o controle da empresa. Meu prazo estava acabando.
— E você achou uma esposa no corredor do hotel.
— A mais linda e corajosa que passou por ali hoje — disse com um sorriso enviesado. — Mas também a mais desesperada.
Isabela manteve o olhar firme, apesar do elogio. Por um instante, um breve calor lhe subiu ao rosto, mas ela se recusou a desviar os olhos.
— Isso é só um contrato — disse ela. — Não pense que esse casamento significa qualquer coisa além disso.
— Nem eu. Mas se vamos sustentar essa farsa… vamos precisar de regras claras.
— Concordo. E uma delas é: não tente se aproximar de mim fora do necessário.
— Isso vai dificultar as fotos do casamento, mas tudo bem.
Antes que Isabela pudesse retrucar, Clara se aproximou, os olhos arregalados e a expressão entre choque e fascínio.
— Você ficou louca? — sussurrou, puxando a prima para o lado. — Casar com um estranho? Quem é ele, Isa?
— Um problema temporário — respondeu, com um suspiro. — Um problema com sobrenome poderoso e contrato em mãos.
Clara olhou para Leonardo, que estava cercado por alguns curiosos do mundo empresarial que já o reconheciam.
— Ele não parece exatamente o tipo que aceita ser “temporário”.
Isabela sentiu um arrepio, mas disfarçou.
— Ele é tão frio quanto parece. Acredite, não há risco de romance aqui.