Amara
As peças, que vinham se arrastando há dias, se alinharam com uma nitidez dolorosa: o brilho âmbar, as marcas no piso, as camisas rasgadas, o uivo distante, a fome no seu olhar, o cuidado feroz que às vezes parece crueldade.
— Você tem medo de eu descobrir, — conclui, e doeu admitir. — Mas tem mais medo de eu não ficar quando descobrir.
Ele respirou como quem sobe à tona depois de tempo demais debaixo d’água.
— Sim.
Fiquei muda um instante. Minha pele lembrou as marcas no meu pescoço de um jeito que não era só calor, era pertencimento, era risco. Eu poderia ter escolhido a saída com flores, mas a vida não ofereceu flores. Ofereceu muralhas e instintos.
— Eu já sei o bastante para não dormir, — confessei. — E ainda assim… estou aqui.
Os ombros dele cederam um pouco. O homem empurrou o algo para o fundo do peito. Ouvi essa manobra no jeito como a sala respirou.
— Não quero você como testemunha de uma coisa que o mundo transforma em monstro, — disse. — Quero você como a pessoa que m