CAPÍTULO 9 – SOMBRAS DO DESTINO

O caminho de volta para casa foi mais longo do que deveria. Kael caminhava sem pressa, os pensamentos pesando como pedras em seus ombros. O cheiro de flor de laranjeira ainda impregnava sua pele, mesmo que ele tentasse ignorar. Mesmo que tentasse se convencer de que não importava.

Liderar sua matilha já era uma responsabilidade enorme, mas ser o Alfa Supremo exigia mais. Todas as matilhas da cidade, cada uma com seus próprios costumes e conflitos, dependiam dele para manter a ordem.

Alguns líderes confiavam nele, outros apenas toleravam sua posição. Mas, nos últimos meses, ele começou a sentir algo diferente no ar: dúvida.

Matilhas antes neutras estavam hesitantes, e rumores de insatisfação começavam a circular.

As luzes estavam acesas quando ele entrou, e o aroma de chá dominava o ambiente. Lorena estava sentada no sofá, um livro aberto em sua mão e uma xícara de chá na mesinha de centro a sua frente. Seus olhos, sempre afiados, se ergueram assim que ele cruzou a porta.

— Você demorou. — A voz dela era tranquila, mas carregava aquele tom perspicaz que Kael conhecia bem demais. Ele soltou um suspiro pesado, de jogando na poltrona ao lado da mãe.

— Precisei de respostas e fui buscar na fonte. Perguntei pro Júlio o que ele sabia.

Lorena não disse nada de imediato, apenas inclinou levemente a cabeça, observando-o. Kael odiava quando ela fazia isso, aquele silêncio calculado que o obrigava a falar.

— E? — Ela finalmente quebrou o silêncio.

Kael passou a mão pelo rosto, sentindo a tensão se acumular em sua mandíbula.

— Ele confirmou o que nós já sabiamos. Eu sou uma das partes da profecia.

O olhar de Lorena se estreitou ligeiramente. Ela pousou a xícara na mesa, o barulho sutil ecoando no cômodo silencioso.

— Mas tem mais. — Kael continuou, cruzando os braços. — meu comando não foi obedecido, tem coisas que eles ainda nao podem relevar sobre a profecia. Mas a neta deles, Camélia, ela também faz parte da profecia.

A expressão de Lorena permaneceu neutra por um momento, mas Kael percebeu o brilho atento em seus olhos.

— Faz parte como?

— É isso que também quero saber— Ele bufou, recostando-se na cadeira. — Ninguém da família sabe o que é, mãe.

Lorena franziu o cenho.

— Eles não sabem que são lobos?

— Não. Cresceram fora daqui, sem qualquer contato com essa parte da história. Eles não faziam ideia do que significa ser um lupino.

Os olhos de Lorena brilharam com um entendimento silencioso.

— Então todos cresceram sem saber o que eram, mas como? Nós sentimos nosso lobo, eles falam conosco, como nunca perceberam?

— Safira adormeceu o lobo da Flor, mãe deles. Safira achava que ela era a Luna da profecia e meu pai o supremo, mas a família Alencar percebeu que não era sobre ela, quando ela encontrou o predestinado, só não entendi o motivo de Safira ter mandando que eles saíssem da cidade.

Lorena tamborilou os dedos na madeira da mesa, pensativa.

— Bom, então realmente a neta deles é uma parte importante da profecia, falta só sabermos quem ela realmente é.

Kael passou a língua pelos dentes, incomodado.

— Não sei o que pensar, Carlina recebeu a profecia também, ao que tudo indica, Camélia é a mulher que veio por a prova meu papel e o de Tânia.

Lorena respirou fundo, fechando o livro com um movimento suave.

— Isso significa que há peças faltando. As coisas estão mudando, Kael. — Lorena disse, cruzando os braços. — Há algo acontecendo na cidade, e não falo apenas da profecia. O Conselho das Guardiãs tem discutido sobre movimentações estranhas. Não consigo dizer se Carlina é mesmo tão confiável assim.

Kael franziu o cenho.

— Você acha que Carlina está por trás disso?

— Eu acho que Carlina nunca deixou de mexer as peças no tabuleiro. E agora, mais do que nunca, ela está perto de conseguir o que quer.

Kael encarou a mãe, aturdido. Lorena nunca havia falado de Carlina assim.

— Você está falando como se ela fosse uma inimiga, não só uma guardiã ambiciosa.

— Porque talvez ela seja. — Lorena disse, sem rodeios. — E você, como Alfa Supremo, pode estar subestimando isso.

Kael ficou em silêncio. As palavras da mãe pairavam sobre ele, deixando um gosto amargo em sua mente.

— Por que você está falando disso só agora? O que você sabe sobre ela que nunca me disse?

— Não sei muita coisa além do que todo mundo sabe — Lorena suspirou. — Mas Carlina é uma velha astuta, movida pelo desejo de poder. Você tem que tomar cuidado com ela. Antes não tinha motivos para não acreditar, ela é uma pessoa que todos confiam e acreditam.

Ela fez uma pausa, o olhar distante, antes de voltar a falar

— E agora, com a volta dos Alencar, parece que muita coisa não está se encaixando.

Kael estreitou os olhos. A volta deles realmente não podia ser apenas coincidência.

— Você acha que o Conselho sabia mais sobre a saída deles do que deixaram transparecer?

Lorena fechou o livro novamente, os dedos pressionando a capa como se quisesse arrancar respostas dali.

— A única certeza que eu tenho, Kael, é que ninguém simplesmente sai dessa cidade sem um motivo muito forte, nossas matilhas sempre forma muito fiéis a Serra dos Riachos.

Kael apoiou os antebraços sobre as coxas, sentindo a tensão crescer dentro dele.

— Essa cidade já viu traições antes. — Lorena disse, a voz mais grave. — Você se lembra da história de Ícaro?

Kael não respondeu de imediato. Ícaro, irmão do pai de Davi, tentou desafiar Heitor, pai de Kael, pela liderança há anos. Foi uma disputa sangrenta, que terminou com o exílio de Ícaro e sua matilha fragmentada.

Dizia-se que ele foi exilado após a tentativa de tomar o poder, e muitos acreditavam que sua saída não tinha sido voluntária. A matilha dos Exilados logo se formou, sendo marcada pela ambição de seu líder e a busca por poder perdido. O que se sabia é que o luto da matilha não durou muito, e logo se restabeleceram em outra cidade, com outro bando.

Kael sempre pensou que a história de Ícaro fosse uma lição do passado, mas algo em sua mãe agora parecia sugerir que havia mais do que os olhos podiam ver.

— O passado tem o péssimo hábito de se repetir. — Lorena continuou. — Se não tomar cuidado, você pode acabar enfrentando algo muito pior do que o que aconteceu com Ícaro, que foi exilado. Vemos o Davi sempre querendo se impor à você.

Ela inclinou-se um pouco para frente, apoiando os cotovelos na mesa e mudando de assunto.

— E a Tânia?

Kael franziu o cenho. — O que tem ela?

— Ela parece preocupada com alguma coisa, veio aqui quando você não estava — Lorena contou — Talvez seja uma boa ideia você conversar com ela. Vocês são amigos também, no fim das contas. E apesar de agora eu estar duvidando da profecia, é bom que você vá falar com ela.

Kael apertou a mandíbula, o incômodo crescendo em seu peito. Ele queria acreditar que o destino já estava escrito. Que sua ligação com Tânia era inquestionável. Ele cresceu acreditando nisso.

Mas a cada dia, ficava mais difícil ignorar a verdade. Ele soltou o ar devagar antes de perguntar:

— Você não acredita mais na profecia? Porque até onde eu me lembro, você sempre acreditou.

Lorena sustentou seu olhar por um momento antes de responder.

— Eu acreditava. — Sua voz saiu baixa, mas firme. — Mas agora… estou começando a questionar o que realmente é destino e o que foi manipulação.

A resposta dela o fez ficar em silêncio. Se até sua mãe estava duvidando, então talvez ele precisasse começar a fazer o mesmo. E a melhor forma de garantir que tudo continuasse como deveria ser, era manter Camélia Alencar o mais distante possível.

O que Kael sabia, que não era tão fácil assim, visto que ainda sentia o cheiro da loba em si e que a mulher não saia de seus pensamentos.

— Apesar de tudo, eu sei quem você é. Você vai conseguir descobrir como ajeitar tudo, meu filho. Eu confio em você, Kael. — a mãe dele disse colocando o livro de lado e se aproximando do filho.

— Eu sei, mãe e agradeço. É só muita coisa para processar. — Ele suspirou.

— Filho, um dos motivos para que eu comece a questionar Carlina, é seu cheiro. Em todos esses anos, você nunca teve seu cheiro diferente e desde que você me disse sobre a garota dos Alencar, seu cheiro mudou. Isso nunca aconteceu com a Tânia, acho que você deve abrir sua mente pra uma nova possibilidade.

Ela disse se levantando e acariciando o rosto do filho. Antes que ele pudesse responder, sua mãe levantou e se retirou da sala.

Sua confiança despencou, no fundo, ele sentia que seu lobo clamava por Camélia e isso não era alguém tentando por a prova seu relacionamento com Tânia. Ele estava ansiando pela mulher que acabara de conhecer e isso nunca aconteceu em todos os anos que ele estava com a Tânia. Camélia não saia de sua cabeça e ele não sabia o que fazer com isso.

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