CAPÍTULO DOIS

— Nenhuma notícia, Yaminah? Não podem cancelar as buscas assim! Khalid pode estar no meio desse deserto, passando fome e sede. Por Alá! Ele é filho de um Sheik! Não pode ser abandonado à própria sorte!

Amira sentiu as lágrimas correrem por seu rosto e caírem em sua roupa. Não podia estar morto! Não Khalid, o seu Khalid. Seu amigo, seu companheiro e o homem que um dia seria seu marido. Olhou mais uma vez a serva e teve pena. Já era a quinta vez que a mandava ao Palácio de Muhabbi e ela voltava com a mesma resposta. Khalid Mofahbbi foi dado como morto. Depois de sair dois meses atrás em uma vistoria pelo território de seu pai, o Sheik de Muhabbi, nunca mais voltou. Era praticamente impossível que ele ainda estivesse vivo depois de tanto tempo perdido no deserto, mas Amira não podia acreditar. Seu mundo virou de cabeça para baixo de uma hora para outra. Há apenas dois meses ia se casar com Khalid, o homem que conheceu desde a sua infância. Agora ela se via sem Khalid e obrigada a se casar com um Lorde inglês. Caminhou até as almofadas e sentou-se por cima dos pés.

— Minha senhora, sabe tão bem quanto eu que é praticamente impossível que ele esteja vivo. O pai dele comandou buscas naquela região durante os últimos meses e nada foi encontrado.

— Não tenho outra opção, Yaminah. — Amira falou, secando as lágrimas do rosto. — Vou ter que me casar com o Lorde inglês e ir morar na Inglaterra. — Mais lágrimas caíam de seus olhos. Chorava por Khalid, por ela e por seu mundo, que estava às avessas. Iria se casar com um desconhecido e morar numa terra distante e diferente de tudo que ela já tinha vivido. Não tinha como fugir, seu pai não iria escutar nenhuma palavra sua. Estava decidido. Ela fora usada como moeda de troca em uma aliança com o Rei inglês. Agora seu destino estava traçado, viraria, como eles chamavam, uma Marquesa.

— Alia ainda não se conforma por não ser ela a se casar com o Lorde inglês.

Amira observou a serva. Alia era sua irmã mais nova, filha da segunda esposa de seu pai. Pela tradição, só poderia se casar depois de Amira. Seria Alia quem iria se casar com o Lorde inglês e Amira iria se casar com Khalid, do qual fora noiva por toda a vida. Mas, depois da morte de Khalid, seu pai ordenou que ela se casasse com o estrangeiro e nenhuma das duas teve voz.

Não adiantou Amira chorar e pedir para não ser ela a se casar. Acabara de perder seu noivo e Alia já estava feliz com o futuro casamento. Seu pai não as escutou, estava feito. Sendo a filha mais velha do Sheik de Ufahaa, Amira Yamile, seria quem se casaria com o Marquês inglês e selaria uma aliança comercial entre a Arábia e a Inglaterra. Já que Alia só poderia se casar depois que Amira estivesse casada.

— Alia sabe que eu não tive escolha. Eu faria de tudo para trocar de lugar com ela. Alá sabe! — Amira encostou-se nas almofadas, deixando as lágrimas saírem.

Nesse momento, bateram na porta.

— Amira! — Amira escutou a voz de Célia e a viu entrar, fechando a porta atrás de si. Célia era sua tutora, como ela mesma havia se intitulado. Com estatura muito acima das mulheres locais e pele bem mais clara, os cabelos loiros de Célia, agora cobertos pelo véu — embora insistissem em sair —, denunciavam que ela era estrangeira. Célia era inglesa e, assim como aconteceria com Amira, casou-se por conveniência com um dos administradores de seu pai. Desde que chegou à Arábia dava aulas de inglês a Amira e a Alia, além de ensinar sobre os costumes e as tradições da Inglaterra. Seu pai fez questão de que ambas aprendessem o inglês, pois desde cedo planejava usar as filhas como aliança.

— Amira, meu anjo, não chore mais. Já falamos sobre isso. Temos tanta coisa que planejar com a chegada dos lordes e você tem que estar bela, como sempre.

A mulher se aproximou e mimou os seus cabelos. Amira fez uma careta de desgosto. Sabia de sua beleza. Fora criada no harém de seu pai e era filha de sua primeira e mais bela esposa, de modo que, desde pequena, recebia de todas as outras mulheres elogios a sua aparência. Sim, era bonita. Mais alta que a maioria das mulheres, seus cabelos eram idênticos aos de sua mãe, assim como os seus olhos. Como o seu pai falava, olhar de esmeralda. Khalid sempre a elogiava e dizia que era a mulher mais bonita da Arábia. Mas agora isso não tinha importância, não queria usar sua beleza para impressionar o Lorde inglês, nem queria se casar com ele. Levantou-se e começou a caminhar pelo quarto.

— Não tenho outra saída, não é mesmo, Célia? — Olhou a mulher mais velha, já sabendo a resposta.

— Já falamos sobre isso, Amira. Não vai ser tão ruim quanto você pensa. No começo, vai achar estranho, mas depois se acostumara e até gostará. A Inglaterra é um país muito bonito, você irá casar-se com um Marquês, irá a muitas festas e eventos e será a sensação de Londres por um bom tempo. — Célia tentou lhe convencer mais uma vez. — Veja, eu me acostumei bem aqui, acontecerá o mesmo com você.

— Célia, você mesma falou que os ingleses não gostam de estrangeiros. Eu serei uma pária da sociedade e sei que não quero essa vida. Quero ficar aqui. — Amira tirou de maneira impaciente outra lágrima, que insistia em cair.

Agora foi a vez de Célia sentar-se nas almofadas.

— Yaminah, poderia deixar-nos a sós e providenciar que ninguém nos incomode? — Célia falou olhando para Yaminah, que observava a conversa próxima à janela.

Yaminah assentiu com a cabeça e saiu.

— Agora venha aqui, Amira. — Célia falou com um tom sério.

Amira se encaminhou até a mulher mais velha e sentou-se em sua frente.

— Você sabe da sua situação e não pode mudá-la. Vai casar-se com o Lorde inglês, seu pai não permitirá algo diferente disso. Agora escute tudo o que eu vou lhe falar. Vou falar isso no papel de mulher, amiga, tutora e de sua mãe, que infelizmente não está mais aqui. Não vou mentir para você. Chore, chore tudo o que você tiver que chorar aqui, chore por Khalid, por sua revolta com esse casamento, por ter que abandonar sua família e seu lar, por tudo que está te oprimindo. Mas a partir do momento em que o Marquês chegar e você pisar fora desse quarto, eu quero que você seja a mulher mais forte desse mundo. Jamais permita que ele veja seu medo, jamais permita que ele te humilhe ou te trate mal. Seja como sua mãe, Amira. Não vai ser fácil encarar a sociedade londrina, eles vão te chamar de estrangeira e falar mal de você por suas costas. Mas você será uma Marquesa apadrinhada pelo Rei, eles terão que te aceitar. Use isso a seu favor, mostre que você não é uma tola qualquer. Mostre ao seu marido a mulher que você é, mostre seu valor. Você é filha de um Sheik e neta de dois! Você é uma princesa aqui e filha da mulher mais forte que conheci. Seu pai a amava profundamente, Amira, ela foi a única de suas mulheres a ter poder sobre ele, então lembre-se que o sangue dela corre em suas veias. Vá para a Inglaterra e tente ser feliz com o seu casamento. Por mais difícil que pareça, vocês podem se dar bem.

Amira ainda digeria todas as palavras que ela lhe falara quando Célia se levantou sorrindo e lhe entregou um papel que tirou das vestes.

— Bem, querida, aqui estão algumas palavras em que sua pronúncia não está muito boa. Treine quando estiver sozinha. Não queremos que o Marquês pense que não poderá se comunicar com ele, não é mesmo? — Célia lhe deu um beijo nos cabelos e saiu do quarto.

Amira olhou para o papel em sua mão, piscando várias vezes para limpar o borrão de sua vista e conseguir focar nas palavras escritas ali. Seria forte! Se tivesse que aceitar esse casamento, faria de tudo para que ele desse certo. E, assim, passou o resto da tarde pronunciando as palavras em inglês.

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