CAPÍTULO TRÊS

Depois de uma longa caminhada, em que ficara coberto pelo pó, Tristan viu com alívio que o Palácio de Ufaaha se aproximava. Estava com fome, com raiva e sentia que sua cabeça explodiria debaixo daquele sol. Entretanto, a contragosto, teve que admitir que não se aproximavam de um palacete, mas sim da construção mais imponente que ele já vira. O ouro que adornava janelas e portas reluzia em sua vista e ele teve que franzir os olhos para não cegar. Escutou, ao seu lado, a breve exclamação de Tony, que cavalgava junto a ele. Era impressionante existir em um lugar tão distante uma construção como aquela. Não tinha dúvidas de que chegavam ao lar de um Rei. As areias do deserto foram substituídas pelas paredes majestosas do Palácio de Ufaaha, servos e servas faziam da entrada do palácio um local movimentado. Tristan observou enquanto os portões eram abaixados, mas uma nuvem de poeira impediu temporariamente sua visão. O cavalo, que já estava acostumado com o percurso, seguiu para dentro do palácio. Pouco a pouco, a nuvem de poeira foi se dissipando e dando lugar a um jardim que faria inveja aos da Rainha. O jardim cercava toda a extensão externa do palácio. Gramas, flores exóticas e árvores frutíferas foram distribuídas por todos os lados de maneira estratégica. Tristan ficou impressionado. Nesse momento, as portas do lugar se abriram e um homem com os mesmos trajes de Mohamed, mudando apenas a cor, saiu e falou algumas palavras em árabe. Mohamed escutou, virando-se em seguida para dizer a eles:

— Lorde Brisden, Lorde Tarlin, sejam bem-vindos ao Palácio de Ufaaha! Este é o assessor pessoal do Sheik e lhes saúdam em seu nome. Pede para que o sigamos para que vocês conheçam o palácio e seus dormitórios.

Tristan viu como o servo esperava Mohamed traduzir sua fala e depois olhou para eles, fazendo uma breve e estranha reverência. Tony desceu do cavalo ao seu lado e postou-se em frente a Mohamed como um colegial disciplinado. Tristan desceu em seguida e começaram a andar. Teve que admitir, o palácio era muito belo. Mobiliado com móveis exóticos e ricos, tudo ali demonstrava riqueza, o que fazia da sua casa um casebre perto daquele luxo. O local era bem arejado, com grandes janelas permitindo que a luz do sol entrasse. Antes de continuarem, Mohamed virou-se e falou:

— A partir daqui, devemos tirar os sapatos.

Tristan o encarou, boquiaberto, enquanto Tony obedeceu a ordem do servo sem pestanejar. Tirar os sapatos? Ele era um Marquês, não podia andar descalço por aí como um moleque. Mohamed deve ter percebido sua relutância, pois falou, antes que Tristan pudesse lhe dar uma boa resposta:

— É a tradição, Lorde Brisden.

Tristan deu um olhar ao servo que demonstrava sua contrariedade. Então retirou os sapatos.

Continuaram o percurso e Tristan não pode deixar de notar que o local era magnífico! Composto por várias salas e salões, o Palácio de Ufaaha exalava riqueza em todos os seus cômodos. As paredes eram cobertas por tapeçarias bordadas a ouro assim como os tapetes, que estavam espalhados por toda parte. Móveis exóticos eram postos em locais estratégicos e tecidos, postos como cortinas, separavam algumas áreas de um grande salão. Depois de andarem por muitos cômodos, Tristan viu uma escada e deu-se conta que o corrimão era de ouro. Por Deus! Subiu a escada ainda boquiaberto, seguindo os passos de Mohamed, e com um Tony igualmente impressionado ao seu lado. A escada levava a outro imenso salão com duas portas, uma em cada extremo. Mohamed parou o seu percurso e então falou:

— Aquela porta leva ao alojamento das mulheres. Somente o Sheik e outras mulheres podem entrar. — Tristan observou a porta apontada pelo servo, localizada no extremo oposto do salão. Não era bem uma porta, era quase um portão. Um homem careca guardava a entrada do local, mas não lhes dirigiu nenhuma atenção. Era um eunuco. Tristan olhou intrigado. Já ouvira falar deles, mas nunca tinha visto um pessoalmente.

Mohamed continuou o percurso.

— Esta é a ala masculina do palácio. Os quartos de vocês já foram preparados e, se precisarem de alguma coisa, sempre haverá um servo por perto. Estamos esperando muitos convidados para o casamento, mas os quartos designados a eles ficam afastados dos seus. — Mohamed abriu uma porta e indicou a Tony, que entrou com uma palavra de agradecimento. Em seguida, o quarto ao lado foi igualmente indicado a Tristan.

— Mohamed, estou um pouco confuso com a programação do casamento. Poderia me informar?

— Milorde, antes de tudo, o Sheik o receberá para assinarem os termos do acordo. Virei lhe chamar quando for o momento. Quanto à cerimônia, durará dois dias contados a partir de amanhã.

Ouvira falar dos cerimoniais de casamentos árabes. Era o mínimo que poderia fazer antes de entrar em um. Sua duração era longa, pois o casamento consistia em várias etapas até a união final. Tristan agradeceu ao servo e entrou no quarto.

Era como se ele estivesse na história de mil e uma noites. O quarto, se é que assim poderia ser chamado, era um conjunto composto por quarto, sala e lavabo, que ocupariam juntos o mesmo espaço que alguns dos salões de baile londrinos. O chão era coberto de tapeçarias, e enormes janelas traziam a luz do sol ao aposento. A cama, localizada no centro do quarto, tinha uma altura reduzida e estava repleta de almofadas. Móveis exóticos substituíam a penteadeira e o guarda-roupa. Moveu-se para o lavabo e ficou surpreso ao encontrar uma banheira. Tristan retornou ao aposento e sentou-se em uma cadeira acolchoada. Sua cabeça estava a mil. Não esperava por isso, mas teve que admitir que não sabia bem o que esperar. As histórias que ouvia sobre a Arábia eram muito diferentes da realidade encontrada ali. Tristan avistou na sala que fazia parte do seu dormitório uma mesa repleta de comida e logo sentiu seu corpo anunciar a fome, chegando perto para conferir o que lhe era oferecido. Carnes secas de todos os tipos estavam dispostas em vários recipientes, assim como vários pães de diferentes formas e cores, frutas exóticas — que Tristan nunca vira antes — e uma garrafa com um líquido âmbar. O cheiro estava maravilhosamente bom e Tristan comeu, distraindo-se, por um momento, da confusão de sua mente.

...

Enquanto descia as escadas seguindo Mohamed, que, pelo visto, assumiu a tarefa de guia para ele, Tristan observava todos os lugares pelos quais passava. Não vira Tony desde o momento em que havia entrado no seu dormitório. Agora ele ia para um encontro diplomático, descalço! Voltou a amaldiçoar aquela terra pagã e seus costumes. Mohamed parou na porta de um aposento que Tristan entendeu como o lugar onde o Sheik estava. O servo bateu na porta e, depois de receber uma resposta em árabe, afastou-se, pedindo a Tristan que entrasse. Tristan entrou, sendo seguido pelo servo, e demorou um pouco para que sua vista se acostumasse à quantidade de informações que havia ali dentro. O que mais chamou a atenção de Tristan foi o cheiro. Algo totalmente novo e estranhamente bom era emitido de alguns pontos do aposento pela queima de alguns palitos. Lembrou-se dos incensos de sua tia Bea, que tinham um cheiro completamente diferente desses. Olhou ao redor, indiferente à imagem que poderia estar passando. Já perdera metade de sua dignidade quando fora obrigado a andar pelo castelo descalço. Muitas mulheres andavam pelo aposento vestindo trajes diferentes. Tecidos finos e coloridos que formavam uma espécie de toga romana.

No final do aposento, um homem de meia idade estava sentado, observando-o com muita atenção. Era o Sheik. O olhar de autoridade, além das roupas e acessórios que vestia, não deixavam dúvidas quanto a isso. Tristan olhou para Mohamed, que pediu para que se aproximasse do Sheik e ele obedeceu, temendo parecer um menino inseguro, o olhar do homem o deixava desconfortável. Quando estava perto o suficiente, Mohamed lhe pediu que se sentasse em uma cadeira perto do Sheik. Tristan aproveitou o momento para observar o homem a sua frente. As feições ainda eram firmes para um homem de meia idade e a visão dos fios negros misturados com grisalhos era parcialmente impedida por uma espécie de véu que usava na cabeça. Olhos negros como a noite focaram-se nele, avaliando-o com o mesmo interesse. O homem tinha a pele de tonalidade mais escura, mas Tristan suspeitou que fosse obra do sol. Vários colares e correntes de ouro eram usados por ele. O Sheik pronunciou algumas palavras em árabe com a voz forte e autoritária. Tristan desviou a atenção para Mohamed, que já começava a traduzir o que o homem havia falado.

— O Sheik de Ufaaha lhe dá as boas-vindas pessoalmente e pergunta sobre sua estadia em Ufaaha.

Tristan considerou um segundo sobre a quem deveria responder, mas manteve o olhar fixo no homem a sua frente.

— Saúdo o Sheik de Ufaaha em meu nome e no nome do Rei da Inglaterra. Estou satisfeito com a acolhida a mim oferecida.

O Sheik não tirou os olhos de Tristan enquanto Mohamed traduzia suas palavras para árabe.

Continuaram com a conversa em torno do acordo que seria selado entre a Arábia e a Inglaterra e sobre os benefícios para ambas as partes. Uma hora se passou até acertarem todos os tópicos do acordo, que seria muito lucrativo para a Inglaterra, como o Sheik fez questão de frisar.

Tristan olhou para Mohamed e viu que os olhos do servo estavam focados no senhor. Depois Mohamed virou-se para Tristan e traduziu as últimas palavras do Sheik.

— O Sheik teme por sua filha em uma terra estranha e com costumes diferentes. Alega que ela foi devidamente preparada, mas quer sua garantia de que ela será bem tratada na Inglaterra.

Tristan sentiu a raiva o consumir. Acaso esse homem achava que os ingleses maltratam mulheres? Ele não queria esse casamento, mas não pensava em fazer mal a mulher que se uniria a ele como esposa!

Tristan controlou a voz para não transpassar a indignação que sentia.

— O Sheik tem minha palavra de que cuidarei de sua filha, que será minha esposa, a defenderei com minha própria vida e não deixarei ninguém lhe fazer mal.

Ao passo que Mohamed traduzia suas palavras, Tristan viu quando um pequeno sorriso apareceu nos lábios do Sheik. Viu quando ele tirou um papel de suas vestes e entregou diretamente para ele, enquanto pronunciava mais palavras em árabe. Tristan demorou um segundo antes de receber o papel, que estava escrito em um inglês perfeito.

Era o acordo nupcial entre Tristan Alexander Dopfelth, quarto Marquês de Brisden, e a filha do Sheik de Ufaaha, na qual era intitulada como Princesa Amira Yamile de Ufaaha, junto com o dote da moça. Tristan observou o papel com mais atenção. Esse casamento o deixaria rico! Muito mais rico do que sua família chegou a ser um dia em sua melhor fase. A verdade do que ia fazer caiu sobre ele como uma pedra. Estava se casando por dinheiro! Agora não tinha como voltar atrás, dera sua palavra ao rei e, nesse momento, ao Sheik. Mohamed pediu que Tristan assinasse os papéis. Quando feito, o Sheik se levantou e Tristan fez o mesmo, recebendo um cumprimento pela mão do homem, que se pôs a pronunciar palavras em inglês com um forte sotaque.

— Amira é o meu maior tesouro e a entrego em suas mãos.

Tristan olhou atônito o homem a sua frente, mas fez um gesto afirmativo com a cabeça.

— Cuidarei dela. Tem minha palavra.

O Sheik lhe deu mais um olhar e voltou-se para Mohamed dizendo mais palavras em árabe.

— A cerimônia de casamento começará amanhã pela manhã. Todo um ritual deve ser seguido. – Mohamed disse. Depois de escutar as palavras do servo, o Sheik começou a andar em direção à saída. Tristan e Mohamed observaram o homem sair.

— Esperamos que a sua estadia em Ufaaha seja muito acolhedora. Milorde tem o resto do dia livre, deve ter percebido que as refeições são feitas no seu próprio dormitório, mas o palácio está livre para visitação. Se precisar de qualquer coisa sempre haverá um servo por perto. - Reforçou a informação já anteriormente dada. - Existe algum lugar que Milorde gostaria de ir?

Tristan ainda estava confuso com todos os acontecimentos selados ali naquele salão. Assinara um acordo em nome de seu país que seria um dos mais lucrativos por muito tempo, comprometera-se em casamento com uma mulher árabe que intitulavam de princesa e ganhara como dote a maior soma de dinheiro que os cofres da família Brisden já vira. Observou o servo a sua frente, que esperava por uma resposta. E tudo o que conseguiu dizer foi:

– Leve-me aos jardins. — Precisava de ar.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App