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A VERDADE QUE DOEU DEMAISA.
A sala de brinquedos estava silenciosa demais para uma casa que abrigava trigêmeos de três anos e meio. — Silenciosa… e triste, Meredith, Mark e Michael estavam sentados lado a lado no tapetinho colorido, cada um com as mãos no colo, sem brinquedos, sem nada estavam de Castigo. A babá, Berta, caminhava de um lado para o outro com os braços cruzados, bufando como se cuidar de três crianças fosse uma maldição pessoal. — Olhem para vocês… — ela resmungou, balançando a cabeça, três pestinhas e pequenos demônios. Não tem jeito para vocês, é por isso que a mãe de vocês foi embora. Não aguentou vocês três nem por um segundo, e sumiu no mundo. Os três levantaram a cabeça ao mesmo tempo. Meredith apertou os lábios, sentindo o coração bater dolorido. Mark puxou o ar, como se tivesse levado um soco e Michael piscou várias vezes, segurando o choro e Beatriz continuou, sem piedade: — A mãe de vocês largou vocês e o pai de vocês, ela foi embora porque vocês são indisciplinados mimados demais. — Vocês acham que alguém suporta criança que vocês são? — Ah, meus queridos… ninguém gosta de criança que dá trabalho, e vocês, são especialistas em criar confusão. Ela ajeitou o uniforme, virou-se para pegar o celular em cima da mesinha e disse: — Fiquem aí. Quem manda nesta casa sou eu, e se levantarem desse castigo, mais tarde ficarão sem sobremesa, entenderam? Eles não responderam, nem conseguiram, a porta bateu atrás dela quando saiu para atender a ligação pelo corredor. — O silêncio que veio depois era pesado. Muito pesado. Mark foi o primeiro a desabar, uma lágrima caiu no tapete. — Meredith… é verdade o que a bruxa falou? — ele sussurrou, soluçando. — A mamãe… não gostava da gente, ela foi embora? —Michael esfregou os olhos com tanta força que ficaram vermelhos. — A mamãe… deixou a gente, é verdade o que a bruxa falou? Meredith respirou fundo, que o peitinho subiu devagar, a babá era má, ela só tinha cinco anos, mas naquele instante… parecia ter mais idade, e entendia mais do que qualquer adulto. Ela virou para os irmãos, limpou a lágrima do Michael com o dedinho e disse firme: — A nossa mamãe não deixou a gente, nossa mamãe está no céu, ela ficou doente, muito, mesmo. O papai falou que ela era boa, e não foi embora porque não gostava da gente, ela amava a gente, e ela foi para o céu, e cuida de nós de la. Os irmãos balançaram a cabeça, chorando baixinho, Meredith enxugou o próprio rosto, e foi aí que ela mudou. Seus olhos verdes ficaram sérios, determinados, com um brilho que só uma criança ferida e forte ao mesmo tempo poderia ter, ela se levantou devagar. Os meninos olharam para ela, esperando que a irmã explicasse o que fazer. Meredith apontou para a estante onde ficava a caixa das tintas que o pai tinha comprado na última semana. — Vamos pegar nossas tintas. Mark arregalou os olhos, Michael abriu a boca num “oh”. — A gente… vai pintar? — Mark perguntou. — Meredith ergueu o queixo, igualzinho o pai quando está bravo. — A gente vai ensinar uma coisa pra ela, gente malvada precisa aprender a tratar bem crianças. Deu dois passos, decidida. — Quando ela voltar, a gente vai falar que tá arrependido… para ela tirar agente do castigo. Meredith pôs as duas mãozinhas na cintura. — Aí ela vai se abaixar… e a gente vai jogar tinta nela todinha. — Michael soltou um risinho cúmplice. — Por quê, Meredith? Meredith respondeu sem hesitar: — Porque ninguém fala mal da nossa mamãe. Nunca, e quem falar não dela agente se vinga! Mark se levantou também, Michael correu até a estante, e juntos, com aquela energia inocente e vingativa que só trigêmeos sapecas possuem, abriram a caixa de tintas coloridas. Meredith escolheu o pote azul, Mark pegou o vermelho e Michael escolheu para o amarelo, ela olhou para os irmãos, levantando o potinho como se fosse um escudo. — Quando ela entrar… a gente dá um banho de tinta nela, porque a mamãe tá no céu… e a mamãe é um anjo. E essa mulher é má, e a gente não gosta de gente má. Os meninos concordaram, decididos, e naquele instante o momento de união e dor… os trigêmeos Callahan deixaram de ser apenas crianças. — Eles se tornaram um trio inseparável. Prontos para defender uns aos outros e prontos para defender a memória da mãe e enfrentar o mundo inteiro, se precisasse. Mas na mente de Meredith, havia algo mais, a ideia de que a mamãe, mesmo longe, sempre estaria com eles, como um farol de amor e esperança. Imaginando o que a mãe diria se estivesse ali, talvez rindo da travessura que estavam prestes a fazer, e isso deu a ela força, e confiança para eles três e resistência a um castigo, um lembrete de que, apesar de todos os desafios, eles ainda eram uma família. E, enquanto as águas da confusão e tristeza os envolviam, aquele novo objetivo — enterrar a mágoa sob uma explosão de cores — lhes incutiu coragem. Afinal, a arte era a maneira deles expressarem não apenas a raiva, mas o amor que ainda havia em seus corações infantis. E assim, no fundo do silêncio, que antes parecia tão opressivo, a promessa de um ato de rebeldia e liberdade começou a florescer como um arco-íris após a tempestade. Eles iriam mostrar que, mesmo pequenos, tinham voz e certas verdades nunca seriam caladas. Ela explicou baixinho, com a precisão de quem provavelmente comandava o universo na vida passada: — Quando ela voltar, a gente fala que está arrependido, que quer sair do castigo, aí ela vai se abaixar… e a gente j**a tudo nela. Eles sentaram novamente no tapete, pinturinhas escondidas atrás das costas. E esperaram, quando a porta se abriu, Beatriz voltou. —Meredith colocou a voz mais doce do mundo:— Tia Bea… a gente tá arrependido… A mulher revirou os olhos. — Aham, que bom, levantem logo—Meredith sorriu, os três se levantaram. — Tia Bea, pode se abaixar pra gente te dar um abraço ? E ela se abaixou, e no segundo seguinte… SPLASH! Azul. Vermelho. Amarelo. Tinta por todo o cabelo, rosto, roupa, braços, sapatos. Beatriz congelou. As crianças também. E então… os três comeram a gargalhar. Gargalhadas tão altas que ecoaram pelo corredor inteiro. — SEUS DEMÔNIOS! — Beatriz gritou, levantando-se suja da cabeça aos pés. — Vocês são demônios! Eu não fico mais aqui! DINHEIRO NEM UM ME FAZ TRABALHAR NESSE INFERNO!!! Ela saiu correndo para o hall de entrada, arrastando a mala. E foi exatamente nesse instante…que a porta da mansão se abriu.






