Capítulo 64 Ezequiel Costa Júnior Empurrei a porta do quarto com um suspiro mais pesado do que pretendia. Meus ombros estavam tensos, e a raiva de antes ainda martelava dentro do peito, mas quando vi Mariana ali, em pé, olhando pra mim com aqueles olhos grandes e desconfiados, algo dentro de mim afrouxou. Ela estava segurando alguma coisa — talvez uma escova, talvez só buscando algo pra manter as mãos ocupadas. Mas ao me ver entrar, o objeto escorregou de seus dedos e caiu no chão com um som seco. — Calma — falei, abaixando imediatamente. Peguei o que ela deixou cair e entreguei de volta, devagar. Mas meu olhar se prendeu no dela. Notei que ela olhava, com uma insistência muda, pra minha cintura. Mais precisamente, pra arma presa ali. A mesma que ainda não tive tempo de arrumar no coldre. — Está tudo bem? — perguntei com a voz mais baixa, tentando medir a tensão dela. Ela hesitou. Seus olhos foram da arma pro meu rosto, como se quisesse confirmar algo ali. Depois mor
Capítulo 65 Mariana Bazzi A água escorria pelos meus ombros, quente, contínua, tentando apagar a raiva e o medo que fervilhavam sob a pele, mas não conseguia. O som abafado de Ezequiel batendo na porta, chamando meu nome, me arrancava da tentativa de calma. Cada batida era como um lembrete incômodo de que ele estava ali e eu estava me escondendo, porque tinha medo. Medo de me machucar, de estar me enganando. Medo de que tudo isso não passasse de mais um papel no teatro da máfia — e que, no final, eu fosse só mais uma mulher na lista dele. Ele disse que não lembrava o que aconteceu com Sara. Mas e se lembrar? E se acordar um dia e tudo voltar? Ele mesmo falou que não era mais aquele homem… Mas se voltar a ser? Aquele homem antigo tinha várias mulheres. Quantas? Quantas antes de mim? Ele pode querer sua vida de volta. Ele dizia que queria só a mim. Mas por quanto tempo? A voz dele ficou mais alta, mais irritada, eu continuei no banho. A água continuava escorrendo
Capítulo 66 Mariana Bazzi — Eu sou o Don, Mariana. Isso não vai mudar. Eu vou ter que conversar com a Sara, com a Raquel, com qualquer mulher que for necessária. Não é sobre você. Não é pessoal. Vai precisar aprender a lidar com isso. Ele se aproximou ainda mais, e encostou uma mão na parede atrás de mim. Eu tremi, mas ele nem me tocou. Só me cercou com a presença dele. — Você acha justo querer que eu dispense todas as mulheres só porque você se sente insegura? Isso não é sobre o seu transtorno. Isso é ego. Você tá querendo que o mundo gire ao seu redor — disse ele, com a voz firme, mas não agressiva. — E eu tô tendo paciência. Eu não sou como os outros homens que você conheceu. Meu peito apertou. — Eu não te prendo, não te forço, não te machuco. Eu te dou espaço, te escuto. E, mesmo assim, você continua agindo como se eu fosse igual a eles. Minhas lágrimas escorreram sem que eu percebesse. Porque no fundo… ele tinha razão. — Sabe o que me deixa mais frustrado?
Capítulo 67 Ezequiel Costa Júnior Mesmo com Mariana adormecida, minha cabeça continuava alerta. Me sentei no escritório, ainda sentindo o cheiro dela nos dedos, o gosto do beijo, e também da discussão no fundo da garganta. Ela era um furacão. Um que eu mesmo decidi deixar entrar. Fiquei no escritório degustando um bom vinho, até ouvir batidas na porta. — Pode entrar — falei, quando ouvi a porta abrindo. Mauro entrou primeiro. Sara veio logo depois, os olhos atentos, como se lessem tudo ao redor. — Precisamos falar — disse Mauro, direto ao ponto. — Ótimo. Eu também. Fiz um gesto para que ambos se sentassem. Sara cruzou a perna com naturalidade, Mauro apoiou os cotovelos nos joelhos. — O que tem pra mim? — perguntei, encostando na cadeira. Mauro puxou o celular, desbloqueando com a digital. — Recebi de uma fonte confiável que Yulssef está comprando duas moças novas. Pode ser tráfico, pode ser fachada. Os nomes ainda são incertos, mas ele tá agindo
Capítulo 1 Mariana Bazzi — Nem acredito que é real... ainda hoje estarei livre desse lugar — sussurrei para mim mesma, com os olhos marejados ao encarar os papéis impressos e assinados sobre a mesa do escritório. Agarrei os documentos contra o peito como se minha vida dependesse disso — e, de certa forma, dependia. Saí quase saltitando entre as mulheres do cassino, com um sorriso no rosto, levando a pequena sacola com minhas poucas coisas. Guardei os papéis lá dentro com o cuidado de quem carrega um tesouro. Lágrimas escorriam, mas dessa vez eram de alívio. O presente de aniversário de vinte anos mais precioso que eu poderia receber: a minha liberdade. Hoje faz exatamente dez anos que fui vendida para esse cassino. Um acordo nojento de covardia, por quem deveria me proteger: meu pai. Mas não... hoje eu não queria pensar nisso. Hoje, eu voltaria pra casa. Veria o rosto da minha mãezinha de novo. Sentiria o abraço das minhas irmãs mais velhas. Subi as escadas desse infer
Capítulo 2 Mariana Bazzi Não tive tempo para pensar, um dos guardas apontou para o carro e desci uma pequena escada de cabeça erguida. Meu pai estava caído, gemendo de dor, incapacitado. Ele sentiu na pele um pouco da violência que sempre infligiu a mim e à minha mãe. Mas meu coração batia contra o peito. Entrei num dos veículos de luxo. Uma limusine. Meus olhos ainda estavam embaçados pelas lágrimas. Observei o outro lado da porta aberta enquanto os homens conversavam do lado de fora. Se eu descesse por ali e corresse na direção da escada me daria segundos extras. Abri com cuidado e discretamente movi meu corpo. Escorreguei pelo acento de couro, mas fui surpreendida pelo homem que me comprou. Imediatamente dei um salto pra trás, batendo as costas na porta contrária. O mesmo homem de óculos escuros entrou e sentou-se ao meu lado, cruzando as pernas com elegância. Me afastei como um animalzinho enjaulado. O olhar desse homem era diferente, talvez terno... Ou eu esta
Capítulo 3 Mariana Sentei na beirada da cama e demorei para conseguir levantar. Havia um banheiro, vi que dava para trancar, então entrei, fechei e fiquei ali por bastante tempo, olhando para tantas marcas roxas no meu corpo que eu tanto gostaria de apagar. Não havia janela ali, nada útil nas gavetas que eu pudesse usar para soltar a janela do quarto. Liguei o chuveiro, tomei um banho. Quando saí segurei a roupa que estava separada. Era um vestido bonito, diferente do que meu pai me fazia usar. Discreto, elegante e sem vulgaridade. Ele lembra um que ganhei do único homem que já confiei, junto com uma agenda. Tudo porque era o papai Noel de uma noite de natal há quase dois anos. Mas estava naquela sacolinha que perdi no caminho até aqui. — Com licença... — Alguém abriu a porta do quarto pelo lado de fora — Sou Luciana. Vim avisar que o senhor Ezequiel está esperando. — Me encolhi na toalha. — Ele só quer conversar e explicar o que está acontecendo. Depo
Capítulo 4 Mariana Bazzi — Por um momento pensei que pudesse estar dizendo a verdade, que fosse diferente. Que realmente pudesse ter algo bom, libertar mulheres — me afastei — Mas é igual todos os homens. Odeio você e toda a sua raça! Odeio todos! Me deixe em paz, e me deixe ir embora! — Me soltou imediatamente, como se nada tivesse acontecido. — Você não jantou. Sente-se e faça o que veio fazer. Está pedindo coisas, mas não cede em nada? — apontou para a mesa e puxou uma cadeira. — Se não está mentindo e sou realmente livre, me deixe sair pela porta da frente sem que ninguém venha atrás de mim. — O encarei e disse com uma coragem que não pensei que eu tinha. — Está ciente dos riscos? Porque vão te encontrar e não vou te salvar novamente se for vendida. — Eu... quero sair daqui. — Não, você não vai — entrou na minha frente com o semblante enfurecido. Seu porte grande se sobrepôs perante mim. Seu olhar estava severo. A raiva e o medo ferveram no meu peito. El