Capítulo 2
No alto da cúpula da igreja, a escuridão densa engoliu o último raio de luz e com ele, também a minha silhueta solitária.

O sino da meia-noite tocou pela décima segunda vez. E, no fim, Hugo não voltou.

Eu sabia. O casamento, que preparei com tanto cuidado, acabaria como os outros oitenta e sete, virando entulho emocional, espalhado no chão, sem ninguém para juntar os cacos.

A tela do meu celular iluminou de repente, era uma publicação da Helena no Instagram.

Nove fotos organizadas em um carrossel. Cada uma meticulosamente composta, transbordando uma felicidade de ferir os olhos.

Meus pais, sorridentes, descascando uvas cristalinas para ela com todo o cuidado do mundo.

Hugo, ao lado dela, sorrindo com ternura, tirando delicadamente uma mecha de cabelo do seu rosto.

E, por fim, a foto mais ofensiva de todas, um retrato da família, meus pais e Hugo rodeando a frágil Helena, todos com sorrisos tão brilhantes que doíam de ver.

Na legenda, ela escreveu: "A dor é insuportável, mas estar cercada por amor realmente me dá forças para vencer qualquer escuridão. Obrigada, papai e mamãe. Obrigada, querido Sr. Hugo. É o amor de vocês que me faz voltar do abismo, sempre."

Os comentários eram os mesmos:

— Filha querida, fique boa logo. O papai sempre vai te proteger. — Escreveu meu pai.

— Helena, não tenha medo. A mamãe está aqui. Você sempre será o nosso maior tesouro. — Comentou minha mãe.

— Se cuide e descanse. Tudo isso vai passar. — Disse Hugo.

Minha mãe ainda teve a coragem de me mandar uma mensagem com um tom imperativo: "Vai comentar na postagem da sua irmã. Ela está preocupada achando que você está brava e está recusando a tomar os remédios"

Eu sabia. Essa mensagem foi ideia da própria Helena. Ela estava me provocando dando a entender que tinha vencido mais uma vez.

Mesmo assim, ela conseguiu mexer com todas as emoções que eu tentava conter.

Ironicamente, eu sou a filha biológica. E a noiva oficial do Hugo. E, ainda assim, sempre que há conflito entre nós duas, as pessoas que eu mais amo nunca hesitam em ficar do lado dela.

A primeira vez que o casamento foi cancelado foi só porque o dia coincidia com o aniversário da Helena. Ela destruiu o local da cerimônia chorando, dizendo que não queria passar futuros aniversários em dor e sofrimento.

Hugo concordou em adiar imediatamente.

— Viviane, você já tem o Hugo. Por que precisa provocar a Helena? Por que você é tão cruel? — Meus pais, enquanto tiravam nossas fotos do mural, ainda me culparam.

A segunda vez foi porque ela sonhou que, depois de casado, Hugo não ia mais dar atenção para ela. No meio da madrugada, ela apareceu na casa dele, se agarrou a ele e recusava soltar.

Hugo deixou que ela deitasse na cama que escolhemos juntos. Meus pais me tiraram de lá à força.

— Não atrapalha o sono da Helena. Você não vê que ela está assustada? Até quando vai ser tão imatura?

Na terceira vez, o gato que Hugo deu para ela sumiu. Quando saiu para procurá-lo, sofreu um acidente de carro e ficou traumatizada.

Meus pais me trancaram do lado de fora por um dia e uma noite.

— Você sabia o quanto aquele gato era importante para Helena. Por que saiu sem trancar a porta? — Disseram.

E agora, a razão era que ela não foi convidada para o casamento, se sentiu excluída e adoeceu.

Os motivos se tornavam cada vez mais absurdos.

Mas, em todas as vezes, meus pais e Hugo correram para ela. Cederam por ela. E me abandonaram por ela.

Ao longo dos anos, eu gritei, briguei, chorei. Mas o resultado nunca mudou.

Sempre me pedem compreensão. Sempre me pedem para ceder. Sempre querem que eu me sacrifique. Mas já foram oitenta e sete casamentos cancelados. Isso não é o suficiente?

Olhando para o vazio da igreja, finalmente me dei por vencida.

Nesses dez anos desde que voltei para casa, não importa o quanto eu me esforce, o quanto eu me destaque, meus pais sempre acreditam que Helena é a filha exemplar. E eu sou a invejosa mentirosa que compete com a irmã.

Talvez o erro tenha sido meu, por ainda esperar algo deles.

Com alguns toques, deixei o comentário que minha mãe exigiu: "Desejo melhoras, minha irmã."

Passado um segundo, ela me respondeu com um emoji sorridente: "Vivi, você também é o tesouro da mamãe."

Cômico, não é? Só recebo migalhas de carinho quando me rebaixo para a Helena.

Mas confesso ter a curiosidade de saber se eles vão se arrepender quando descobrirem que a boa filhinha finge estar doente, é falsa, armou um sequestro, e que nunca mais vão me ver.

Soltei o lábio que vinha mordendo até sangrar, e liguei para o meu sócio, André.

— Quero me candidatar para ir desenvolver o mercado no país H.

— Tem certeza? — Do outro lado, da linha, ele respondeu em choque. — Ir para o país H significa ficar dez anos longe de casa. Você acabou de casar hoje e já vai se separar? Seu marido concorda com isso? E seus pais? Seu maior desejo sempre foi estar perto deles.

Olhei para a igreja vazia e soltei um sorriso amargo.

— Que marido? O casamento foi cancelado de novo. Quanto aos meus pais, eles têm a Helena, isso já é suficiente.

Do outro lado ele ficou em silêncio por um segundo.

— Tudo bem. Se prepara para partir amanhã.
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