Capítulo 44Maeve Jhosef O amor não me pediu permissão.Ele apenas se sentou ao meu lado, tocou minha mão, e ficou.Era estranho — e bonito — como as coisas não mudaram por fora, mas tudo dentro de mim já não era mais o mesmo. O ar que eu respirava parecia mais leve. Ou talvez eu apenas tivesse aprendido a respirar diferente desde que Isaac passou a ocupar espaços que nem eu sabia que existiam em mim.Trabalhávamos lado a lado como sempre.Olhares trocados no corredor. Toques acidentais nas pranchetas. Reuniões longas em silêncio produtivo.Ninguém imaginava o que se escondia por trás da nossa neutralidade impecável.E ainda assim, às vezes, quando eu o via falar com alguém, parte de mim queria gritar ao mundo: eu conheço o coração que ele tenta esconder. Eu toquei onde ninguém jamais tocou.Mas não dizia.E ele também não.Era nosso.---No final da semana, escapei sozinha até a parte mais discreta da cidade.Um pequeno ateliê que vendia peças feitas à mão. Um lugar que Zola recomen
Capítulo 45 Isaac AubinngétorixExistem momentos que marcam. Não por serem extraordinários aos olhos do mundo, mas por serem o grito mais íntimo da alma.Aquele era um deles.O convite veio numa mensagem curta, quase despretensiosa: “Hoje. A cabana.”Três palavras. E um mundo inteiro implodiu dentro de mim.Fazia dias que eu andava no limite — entre querer dizer e temer dizer.Entre admitir que o amor já me habitava… e aceitar que ele poderia me destruir.Porque amar, do jeito que eu amava Maeve, exigia mais coragem do que qualquer campo de batalha que já pisei.Peguei o anel. O que comprei na mesma semana em que começamos a planejar a nossa primeira vez.Um anel que não existia em vitrine alguma — feito sob medida, como o que ela representa:maior que a lógica, maior que o tempo, maior que tudo o que achei que merecia.O céu pesava de um azul profundo quando cheguei. As janelas da cabana filtravam o dourado do fim de tarde como um abraço antigo. O ar cheirava a madeira e promessas.
Capítulo 46 Maeve JhosefAlgumas decisões não precisam ser ditas em voz alta para existirem.Elas nascem no silêncio entre dois olhares, crescem na delicadeza de mãos entrelaçadas e se perpetuam na respiração entrecortada depois do amor.Foi assim que dissemos sim.Não ao mundo — mas um ao outro.Ainda sinto o gosto dele na minha boca, mesmo dias depois.Ainda carrego nas coxas as marcas suaves de sua presença, como uma tatuagem invisível que ninguém mais vê, mas que me pertence, algo tão íntimo que parece até mesmo um sonho.Ainda acordo no meio da madrugada e olho para a aliança que agora guardo no fundo da minha gaveta como quem esconde um relicário precioso — algo tão poderoso que seria perigoso expor. Ainda não era momento de usá-la de forma tão abertas.O mundo não pode saber.Ainda não.Nos corredores da empresa, continuamos sendo colegas. Olhares furtivos. Sorrisos contidos.Mas há algo que mudou em nós. Algo que arde. Que pulsa.No segundo dia após o pedido, levei o anel del
Capítulo 47 Isaac AubinngétorixA mentira mais elegante é aquela vestida de boas intenções.E minha mãe era especialista nisso.Naquela noite, enquanto os cristais tilintavam e os sorrisos falsos se multiplicavam no salão de mármore da elite farmacêutica, eu me sentia dentro de um teatro onde ninguém encenava melhor do que ela.Sempre firme, sempre calculada.— Isaac, querido — disse ela, segurando meu braço como se me moldasse para o que viria. — Quero que passe um tempo com Arlène esta noite. A família dela é influente, e eles estão interessados em um possível arranjo.Arranjo.Como se meu coração fosse um móvel que ela pudesse reposicionar de acordo com os interesses da dinastia Jhosef-Aubinngétorix.— Mãe, não acho apropriado — murmurei, mantendo o tom diplomático, embora meus dedos se fechassem num punho invisível. — Não é o momento.Ela sorriu, como quem ignora uma criança teimosa.— É exatamente o momento. Você está em evidência. Nosso projeto está se expandindo. E Arlène é um
Capítulo 48 Maeve Jhosef Não era ciúmes. Era o medo de ser invisível. O medo de, depois de tudo — depois das noites em que o silêncio era nosso idioma mais íntimo, depois dos olhares que diziam tudo que as palavras não conseguiam, depois dos suspiros entrecortados de desejo e dor —, ele ainda me esconder. Me negar. Como se eu fosse uma sombra de tudo o que vivemos. Um segredo que ele precisava manter trancado entre quatro paredes, longe dos olhos do mundo. Naquela noite, no salão dourado da sede central da Jhosef Industries, o ambiente era opressor. A beleza da decoração — cristais pendendo como lágrimas congeladas, espelhos lapidados, arranjos exuberantes — não conseguia distrair o aperto crescente em meu peito. Eu me sentia deslocada. Inadequada. Uma pintura fora de estilo pendurada na parede errada. Isaac parecia diferente. Tenso. Calado. O tipo de silêncio que não é tranquilo, mas alerta. Observei seus dedos, sempre tão firmes, agora inquietos, girando a aliança no dedo ane
Capítulo 49 Isaac Aubinngétorix O salão ainda pulsava com música, risos contidos e taças tilintando em mãos que não sabiam do que era feito o silêncio. Mas o meu mundo... havia emudecido. Ela se foi. Maeve desapareceu entre as sombras douradas das colunas e os sorrisos educadamente falsos dos convidados, como se nunca tivesse estado ali. Como um fantasma ferido. E eu fiquei, estático, prisioneiro do meu próprio corpo, sentindo o eco de cada passo dela se distanciar como uma acusação. Minha mãe falava com Arlene ao fundo, num tom calmo demais, domesticado demais, como se nada tivesse acontecido. Como se não tivesse acabado de jogar uma bomba sobre tudo o que eu e Maeve havíamos construído — ou, ao menos, tentado construir. Minha mão foi até o anel. A aliança que ela havia me dado. Simples. De prata escurecida. Gravada por dentro com uma frase que só nós dois conhecíamos. Uma promessa silenciosa. E ali estava ela. No meu dedo. Oculta pela formalidade do traje, escondida por trá
Capítulo 50Maeve Jhosef A cidade ainda estava acordada quando saí do carro, mas eu não. Dentro de mim, tudo parecia suspenso — como se algo tivesse quebrado, e eu tentasse colar os cacos com a ponta dos dedos.Não fui para casa. Não quis olhar para aquele sofá onde dividimos risos depois de longas reuniões, nem para o lençol que ainda guardava os vestígios do amor que fizemos na manhã anterior. A dor pulsava muito perto da superfície e, pela primeira vez em muito tempo, minha alma clamava por colo.Pelo colo da minha mãe.— Maeve?A voz dela soou surpresa quando abri a porta da antiga casa. Era tarde, eu sabia. Mas minha mãe sempre teve o sono leve — como se, mesmo dormindo, estivesse pronta para me acolher.— Mãe... — murmurei, a garganta apertada.Ela não perguntou nada. Apenas abriu os braços. E eu desabei.Me aninhei contra seu peito, como fazia quando era criança, e chorei. Chorei sem explicar, sem justificar. E ela apenas me segurou, acariciando meus cabelos com aquela calma s
Capítulo 51 Maeve Jhosef As luzes frias da sala de reuniões pareciam refletir o que eu tentava esconder: um desconforto que me escorria pelas veias feito chumbo derretido. Estávamos todos reunidos para revisar os relatórios do primeiro trimestre e discutir os rumos do novo projeto de expansão — rostos alinhados, frases precisas, e números voando pela mesa como lâminas.Mas nada — nada — conseguiu prender minha atenção quando ele entrou.Isaac.Impecável em sua camisa branca dobrada até os cotovelos, o blazer pendurado despreocupadamente no antebraço, o olhar firme e calculado que tantos admiravam e temiam. Mas o que capturou a sala inteira — inclusive a minha respiração — foi o brilho discreto, porém inegável, em sua mão esquerda.A aliança.A aliança que eu comprei. Que eu escondi como um segredo precioso, como um sussurro eterno entre nós dois.E ele a usava agora, sob as luzes duras do conselho, diante de todos.Os cochichos começaram antes mesmo que ele se sentasse.— “É uma ali