Apesar das dificuldades que uma vida na cidade grande lhe trouxe, Ana jamais deixou de sorrir e acreditar que um dia viveria algo extraordinário. E foi com esse pensamento e um coração incrível que ao ser abordada por um desconhecido e sem memória ela o abrigou em sua casa caridosamente e a partir de então os dois se conectaram de uma maneira genuína. O que eles não sabiam era o que estava por trás desse passado sombrio e esquecido de Miguel. Inimigos poderosos que desejavam sua morte, e não iriam descansar até que assim conseguisse. Miguel, apesar do amor que sente por Ana, terá que repensar se vale a pena permanecer ao seu lado e arrasta-la para esse furacão que é sua vida, por causa de uma promessa que fez para si mesmo em ser leal e verdadeiro com aquilo que jurou quando se tornou um Delegado Federal. Porque as vezes o amor e a justiça precisam andar do mesmo lado.
Leer másANA MARIA
Estava saindo do meu trabalho e seguindo para uma padaria ali próxima. Sempre faço este mesmo trajeto.
Trabalho numa loja de material de construção e artigos para obra há oito meses, foi a avó da minha filha quem me arranjou.
Desde que o seu filho mais velho sumiu sem se importar com a filha, ela me ajuda como pode, e não reclamo. Assim que meus pais souberam que estava grávida e que o pai não ia me ajudar, fui enxotada da família. Suei muito, passei noites de fome, poupando o pouco que tinha para que minha filha pudesse comer e hoje, depois de seis anos, digamos que nos encontramos numa boa situação.
Temos uma casa, é nossa, pequena e confortável e agora que estou trabalhando de carteira registrada, minha situação mudou um pouco.
— Me vê dois pães e 200 gramas de presunto, por favor.
Peço ao atendente que está atrás do balcão, e logo em seguida vou para o caixa, não posso demorar, pois daqui a pouco o transporte escolar passa para deixar minha Malú.
Estava distraída, guardando o troco na bolsa, quando um homem me para na rua.
— Por favor, moça, tenho fome.
Ele era alto, diria que tinha um corpo atlético, mas a sujeira e aquela barba não deixava notar. Eu vi sinceridade em suas palavras.
— Toma. Acabei de comprar alguns pães. — Eu abri a sacola pegando um pão e o partindo com minhas mãos para colocar presunto dentro.
— Obrigada. Ninguém quer me dar comida, eu estou com muito frio.
Meu coração doeu, ele estava com uma cara de cansado. Eu não tinha muito, mas quando eu precisei de ajuda, vi pessoas desconhecidas me estender a mão e eu não faria diferente com este moço. Ele estava com uma calça jeans rasgada e suja e uma blusa, que um dia foi branca, da mesma maneira.
— Qual seu nome? — perguntei a ele.
— Miguel.
— Miguel de quê?
— Não sei, não lembro.
Seus olhos, enquanto me respondia, eram sinceros. Miguel não era tão velho, mas debaixo de toda aquela sujeira ficava difícil descobrir sua idade.
Eu não podia tardar mais, o peguei pela mão e corri para casa, minha filha me esperava. Depois de uma caminhada de meia hora, cheguei no meu portão e o transporte lá estava, peguei a minha princesa, que olhou curiosa para Miguel.
— Mamãe quem é ele? — Malú perguntou curiosa.
— Um moço que precisa de ajuda, meu amor.
Eu segurei em sua mão e fomos caminhando até o portão, vendo seu olhar atento, para onde estava o desconhecido.
Quando entramos, Miguel ficou parado na porta.
— Entre, a casa é simples, mas estamos te recebendo de coração.
— Vem, moço, vou te mostrar meu quarto, que a minha mãe fez, lá podemos imaginar de tudo — disse puxando a mão dele animada.
Na verdade, o quarto dela tem uma cama simples de solteiro e uma pequena cômoda usada, que comprei no brechó. O resto é imaginação. Não tinha boas condições para dar um quarto cheio de brinquedos para minha bebê, sempre dizia a ela para imaginar e quem sabe um dia, poderíamos ter tudo o que desejássemos.
Malú ia levando Miguel para o quarto, eu a barrei no meio do caminho.
— Não, não, mocinha. Olha como ele está todo sujo, precisa urgentemente de um banho.
O guiei até o corredor dos quartos e lhe entreguei uma toalha, uma camisa e um short masculino que eu tinha guardado para meu uso. São meio gastos porque são roupas que eu uso para ficar em casa. Porém, estão em melhores condições do que as que ele usa neste momento.
Peguei uma toalha limpa, escova de dente e sabonete para a sua higiene e ele apenas assentia, nunca olhando nos meus olhos, aceitava tudo calado como se estivesse com vergonha.
Minha casa era simples, dois quartos e uma sala-cozinha. Bem pequena, mas aconchegante e o melhor de tudo, minha.
Estava preparando a janta, um macarrão com molho e frango, que minha pequena ama, quando Miguel sai do banheiro visivelmente mais limpo. Notei também alguns machucados em seu rosto.
— Está melhor?
— Sim, obrigado. Agora posso voltar para a rua.
— Não. Estou terminando a janta. Se você se sentir bem, tem o quarto da minha filha. Ela não dorme lá, está livre.
— Não quero abusar de sua boa vontade — respondeu meio desconfortável.
— Não é abuso.
Coloquei os pratos no balcão que era a divisa com a sala e chamei Malú para vir jantar.
Miguel estava silencioso, não abria a boca para falar um “a”, enquanto minha pequena espoleta lhe contava acontecimentos de seu mundo imaginário. Ele estava atento a tudo.
Comemos ouvindo sobre uma joaninha que era preguiçosa e que se deu mal quando o elefante quis tomar banho.
Malú é uma criança maravilhosa, se adapta a qualquer situação e não precisa muito para agradá-la. Eu me sinto orgulhosa da sua criação.
Eu sei que é loucura minha colocar um estranho dentro de casa, tendo uma filha pequena, ainda mais na cidade de São Paulo, onde você encontra um doido a cada esquina, mas eu vi o medo em sua expressão, parecia tão perturbado de alma.
O seu desespero quando me pediu ajuda e o fato de que ele não olha nos olhos das pessoas, por medo, me partiram o coração.
Eu vou arrumar a cama da Malú para que durma lá, mesmo que ela seja aparentemente pequena para ele. Porém, acho que seja melhor do que as noites geladas na rua.
— Você pode dormir aqui. — Apontei a cama para ele.
— Eu não quero causar desconforto.
— Vai me causar desconforto se não aceitar. — Ele só assentiu.
Entrou no quarto e fechou a porta.
Eu fiz o mesmo, e mesmo que não sentisse medo por sua presença, eu tranquei a porta.
— Mamãe?
— Oi, meu amor.
— Miguel é nosso amigo?
Pensando em dar uma resposta sincera, acabei adormecendo.
Acordei no outro dia cedo, como de costume, para preparar o café da minha filha, que se encontrava atravessada na cama com as pernas na minha barriga e a cabeça no meio da cama.
Ela é totalmente um furacão para dormir, desde pequena.
Sempre fomos nós duas. No começo foi muito difícil, passei dificuldades inimagináveis. Vim do interior para procurar uma vida melhor e emprego, mas não foi o que encontrei. O que me veio foi um homem lindo, com palavras encantadoras, que me seduziu, eu totalmente inocente nessa selva de pedra, caí feito uma tola. Anderson era um cavalheiro comigo, foi... até conseguir o que queria.
Na época eu morava numa pensão e ele sempre me levava para a sua casa à noite, depois do trabalho. Ficava encantada.
Menina muito boba, eu era.
Até engravidar e ele me dizer que não queria filhos, que tinha outros objetivos em mente, até cogitou um aborto, em que o mesmo pagaria.
Eu poderia ter sido irresponsável de engravidar, mas jamais seria tão irresponsável a ponto de matar uma vida que não tinha, e não tem, culpa dos meus erros.
Eu saí da casa dele arrasada naquela noite. Sem saber o que fazer, eu procurei a sua família para obter ajuda.
A mãe, totalmente o contrário, me deu todo apoio que precisei.
Quando meus pais descobriram, foi terrível, eu quase entrei em depressão pelas palavras do meu pai. A minha mãe nada pôde fazer. Apesar de sempre sermos cúmplices e ela fazer o máximo possível para me proteger do meu pai, nisso ela não pôde.
Eu me vi sozinha.
Angustiada.
Desamparada.
Mas com a ajuda da dona Fátima, eu consegui.
Ela me levou para morar em sua casa e lá minha filha e eu desenvolvemos um amor muito grande por ela e por Rodrigo, ou tio Digo, que com atitudes diferentes de Anderson, nos amparou e nos ajudou como pôde. Afinal, eles também não tinham condições tão boas para esbanjar.
Fiquei com eles até minha filha completar quatro anos, e como eu já tinha alguns anos na loja onde trabalhava, eu conversei com meu chefe e pedi para ele me demitir.
Com o dinheiro que juntei e o dinheiro da rescisão, comprei a minha casa no bairro da Lapa, próximo à estação. Não é lá essas coisas, e também é muito pequena, mas é minha. E aqui é perto de tudo.
Depois de zerar a minha poupança, passamos por um pouco de aperto, nada que eu não pudesse resolver, vendendo água na 12 de outubro, até que enfim, apareceu uma porta de emprego com carteira registrada, onde estou hoje.
Sobrevivendo e vivendo.
Não tenho luxo para minha filha, mas o que ela quer, eu torço o pingo d'água, e dentro do meu possível eu faço acontecer.
A minha sorte é que eu tenho a melhor filha do mundo. Muitas vezes quando estava triste e ela percebia, vinha me abraçar, dizendo que abraços e beijos curam toda ferida do coração.
Ela é luz e me incentiva a sempre buscar o melhor, fazer o melhor para ela.
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Puxei o pezinho dela e comecei a fazer cócegas.
Porque ela não é só a melhor filha do mundo, mas também é a maior bicho preguiça da face da terra.
— Naaaaaa.
Ela puxou a coberta e se escondeu naquele monte de pano.
— Eu vou esquentar seu chocolate, e quero você de pé quando voltar.
Segui para a cozinha e tomei um susto quando a porta do quarto da minha filha se abriu.
— Desculpa, Miguel, eu me esqueci que...— Que cabeça a minha.
— Não se preocupa, Ana. Queria agradecer pela comida, pela roupa e pela hospitalidade. Já estou indo.
— E vai para onde?
Não aguentei a curiosidade. Foi indiscreto, porém, pensar que ele poderia voltar para a rua me fez mal.
— Bom...
Ele passou a mão pela nuca, com os cabelos bem crescidos, com alguns fios grisalhos, num sinal claro de desconforto.
Iria voltar para a rua.
Eu posso ser muito louca em abrigar um completo desconhecido e aparentemente sem memória na minha casa, com uma filha pequena, mas nas raras vezes que ele me olha, eu percebo a insegurança, o medo, a tristeza. E saber que ele vai voltar para a rua, me deixa triste. Não sei explicar.
Talvez seja porque quando eu precisei, eu vi pessoas que também não tinham nada e nem me conheciam direito, me abrigarem sem pensar duas vezes.
É isso, gratidão pelo que Deus fez por mim um dia.
— Olha... eu sei que você não me conhece, eu também não te conheço. Não temos boas condições, mas a cama está disponível até quando você precisar.
— Não vou incomodar, Ana. Não quero trazer despesas e eu preciso voltar para onde eu vim.
— De onde você veio? O que aconteceu com você?
— Eu não sei.
— Como assim? Você não tem cara de quem sempre morou na rua. Não é julgamento.
— Não sei. — Ele me cedeu um pouco de seu olhar e vi uma confusão. Um pedido de socorro. — Eu lembro de caminhar, caminhar. A minha cabeça doer. E depois apagar. Eu acordei com uma chuva me molhando e eu fui para debaixo de uma lona. Não lembro desde quando estou andando, só sei que as pessoas não me dão comida e eu não consigo dinheiro para comprar.
— Lembra desde quando está sem comer?
— Não.
Ele não é morador de rua, ele está perdido, disso eu tenho certeza.
Fui até ele e lhe dei um abraço.
As suas palavras, uma atropelando a outra como se lembranças não existissem e sim, colunas vazias, me fizeram sentir a dor que estava em seu peito.
— Como eu disse, Miguel. A casa é pequena e se você quiser ficar, nós damos um jeito.
Ele não correspondeu o abraço. Permaneceu imóvel, enquanto eu sentia seu coração acelerado.
— Obrigado.
Ana Maria A vida tem sido generosa nesses três anos em que vivemos nesta casa. Eu e Miguel temos sido mais cúmplices a cada dia e o nosso amor cada dia mais forte. A maternidade que para mim havia sido algo assustador no passado dessa vez foi incrível. Eu tive alguém ao meu lado para me ajudar, para me apoiar e isso fez toda a diferença. Malu no início sentiu um enorme ciúme de irmãzinha, Maria Vitória. Nossa Mavi. E foi difícil para ela se acostumar a nos dividir com a irmã, mas hoje uma mocinha já entende e a ama demais. Segui sendo mãe, cuidando da minha família e dando o devido apoio a todos, porém eu sabia que algo estava faltando. Sabia que era devido ao momento, já que somos outras pessoas aqui. Temos outra vida. A maior novidade de todas foi o casamento de Felipe e Pedro, sim eles se casaram no civil, e adotaram um casal de irmãos, são amiguinhos das minhas princesas e eu fico feliz pelos dois. Rodrigo e Kátia estão bem, em uma de nossas conversas Kátia acabou soltan
Assim que eu saí do apartamento de Gabriela eu entrei em contato com a corregedoria para prestar mais uma denúncia. Apesar de ser um investigador, eu tinha provas suficientes para provar que ele esteve envolvido com toda essa sujeira. Era a prova que faltava. Uma confissão de alguém que estava envolvido. Quando eles me pediram para prender Gabriela junto com o pai eu pedi um tempo. Sabia que mais cedo ou mais tarde ela acabaria falando. E eu tinha razão. Assim que o mandato de prisão foi expedido pelo juiz eu fiz questão de ir até Vinícius. De todas as traições essa era a que eu menos esperava, ele sempre se mostrou leal. A verdade é que quando os mais velhos dizem que mais devemos temer o amigo que abraça do que o inimigo que nos ameaça, eles têm razão. Chegando na porta de seu prédio junto com os agentes eu liguei para ter certeza que ele ainda estava em casa. _ Surgiu uma prova nova contra Daniel.
Miguel Dante: Ela pegou uma arma e um rastreador. Eu não precisei dizer muito, porque ele já sabia o que fazer. Aliás, já estava fazendo. Ruy estava ativando o rastreador. Ah, Ana, a vontade que tenho agora é te pegar sobre meus joelhos e te encher de palmadas. Como você faz uma loucura dessas sabendo que eu perdi meu pai a pouco tempo? Angustiado, foi assim que fiquei até que Ruy me mostrou a sua localização. Achei estranho ela estar indo em direção a sua mãe, foi então que me recordei, eu falhei. Eu reforcei a segurança de todos e esqueci da minha sogra. E claro, Ana com o coração que tem não iria pensar nas consequências antes de agir para proteger a mãe. _ É a casa da mãe dela. Dante: Certo, vamos atrás, você fica aqui. _ Eu vou. Não está claro para você
Felipe _ Acorda amor, eu estou sentindo tanto a sua falta. Meus dias tem sido tão sombrio. Nunca pensei que fosse amar alguém da mesma maneira que amo Pedro e vê-lo assim sem vida me abalaria tanto. Desde que os médicos disseram que ele poderia acordar a qualquer momento, então eu vivo em uma expectativa gigantesca. Cida já não tem idade para ficar em hospital então eu a mandei para casa, no período da tarde ela sempre vem para visitá-lo. E ele continua assim, na mesma. Para seu prognóstico é bom. Ele não podia mexer um músculo para não mover a coluna, e ela ter uma boa recuperação, mas eu não consigo ficar sem ouvir sua voz, ou até mesmo sentir seus beijos. É uma agonia inexplicável. Pedro: Sentiu muito minha falta? Sua voz baixa chamou a minha atenção, estava segurando sua mão com a cabeça abaixada, mais uma vez
Dante: O que você fez foi irresponsável. Eu estava ali para te proteger e você quase me fez falhar em uma missão. Sua voz mansa não escondia a repreensão. E eu pude senti-la também no olhar de Miguel que não falava nada, mas observava enquanto Dante o fazia. Acho que eles pensam que sou de vidro, porque? Por causa da gravidez? _ Eu sei, só queria ajudar. Dante: Poderia ter nos falado que conversou com ele. Eu notei você estranha, sabia que iria fazer algo, mas fugir e direto para os braços do inimigo Ana? Estávamos no escritório de Miguel, depois de eu muito insistir para que eles me contassem o que aconteceu depois que eu recebi a pancada na cabeça, mas é claro que primeiro eu tive que ser chamada a atenção. _ A minha mãe estava em perigo. Eu não ia deixar ela sozinha com ele. Miguel: Meu mel. Foi muito arriscado.
_ Não encosta em mim! Recolhi toda a coragem que tinha e o soquei bem na virilha com o meu joelho. Com certeza ele não esperava esse golpe, o que o fez se afastar para tentar abrandar de alguma maneira a dor que eu sei que sentia. Alexandre: Desgraçada! Veio com tudo em minha direção e eu só pude me encolher. Porém isso não impediu de eu sentir o impacto forte em minha cabeça. Fiquei tonta porque apesar dele ser uma pessoa de porte médio, ainda assim era um homem e comparado sua força com a minha eu com certeza sairia perdendo. Recebi um outro soco de surpresa após abaixar meus braços bem no meu olho esquerdo e fiquei tonta. Senti apenas meu corpo escorregar pela parede de concreto enquanto ele gritava atrocidades para cima de mim, também segurando em suas partes íntimas. Se as lágrimas já embaçaram a minha visão, agora também um olho inchado me impedia de enxergar claramente
Último capítulo