capítulo 3

Lavínia acorda confusa, mais uma vez, não sabe onde está. Ela respira fundo e tenta se mexer, mas sente algo prendendo-a à cama. Ao olhar para baixo, percebe que está amarrada. As cintas grossas de couro envolvem suas pernas, tronco e braços, impedindo-a de se mover um milímetro sequer.

Desesperada, percorre o quarto com os olhos. Este lugar é diferente do anterior: as paredes ainda são brancas, mas o material é outro. Não há janelas, e a porta de ferro é grossa como uma parede. No quarto, não há nada além da cama onde ela está e outra, mais à frente; o teto é alto, e as lâmpadas emitem uma luz diferente. Também não há interruptor.

Claramente, o quarto foi feito para prender pessoas, não para tratá-las.

Lavínia pensa em gritar, mas, assim que abre a boca, Allister entra, empurrando a porta como se fosse feita de papel.

Os dois se encaram por alguns instantes, e ele se aproxima.

- Está mais calma? _ Ele pergunta com voz baixa e suave, como se tentasse não assustá-la.

- O que está acontecendo? Por que estou aqui?

Ele se surpreende com a pergunta e se aproxima mais.

- Você não lembra?

Ela nega com um movimento de cabeça, e ele franze a testa, preocupado.

- Talvez isso te ajude a lembrar...

Ele fala, e em segundos seus olhos ficam totalmente brancos. As lembranças invadem a mente de Lavínia como uma pancada. Por alguns minutos, ela fica atordoada, mas logo entra em pânico novamente, gritando para que ele a tire dali. Allister observa em silêncio, impassível, como se ali não existisse emoção alguma.

Quando Lavínia finalmente se cala, ele sai do quarto e retorna em seguida com uma tesoura e uma cadeira.

- Está mais calma agora? Não adianta gritar por socorro, este quarto é à prova de som... _ Diz enquanto corta as tiras grossas que a prendem.

Quando termina, ela tenta se levantar, mas ele se aproxima, como se quisesse deitar sobre ela. O perfume dele, a proximidade do corpo quente e rígido como uma rocha tiram totalmente a concentração de Lavínia, que apenas se cala e encara aqueles olhos negros como a noite.

- Se eu fosse você, ficaria quieta. Não tente se levantar, sua perna pode piorar... _ Ele sussurra perto do ouvido dela. A voz rouca percorre seu corpo como um arrepio. Ela fecha os olhos, tentando recuperar o fôlego, e agradece aos céus quando ele se afasta.

Ela permanece de olhos fechados por alguns minutos, tentando organizar os pensamentos. O quarto está em completo silêncio, não se ouve nem mesmo a respiração de Allister.

Quando se sente mais calma, finalmente abre os olhos e o vê sentado, uma perna cruzada sobre a outra e os braços apoiados sobre ela. A expressão dele permanece impassível, os olhos cravados nela sem desviar um segundo sequer

- Não vai perguntar nada? _ ele finalmente quebra o silêncio. Muitas perguntas passam pela mente de Lavínia.

- Minha mãe... ela já chegou? O que você vai dizer a ela quando não me encontrar no quarto?

Ele olha o relógio e depois volta o olhar para ela.

- Vai depender de você. Ainda são 2h45; ela chega às 6. Até lá, posso te levar novamente para o quarto, e então ela nem vai imaginar que você saiu.

Lavínia sente um lampejo de esperança.

- Então você não vai me matar?

Ele arqueia levemente a sobrancelha, surpreso com a pergunta, e então j**a a cabeça para trás, soltando uma gargalhada estridente que fere seus ouvidos.

- Oooh, garota... Me nego a acreditar que você seja assim tão burra...

- Não precisa me ofender...

- Inevitável diante dessa pergunta... Qual seria o nome certo? Descabida. Esse é o nome certo. Se eu te quisesse morta, você já estaria morta, aliás... nem teria sobrevivido àquela festa...

Ele pronuncia a última frase em voz baixa, quase um sussurro, despertando lembranças em Lavínia.

- O que eram aquelas coisas? Quem é você, afinal?

Allister sorri satisfeito, eram essas as perguntas que ele queria ouvir.

- Aquelas coisas são lobisomens. O Clã Sentinelas da Morte, para ser mais exato. Eles são inimigos mortais do nosso clã; estamos em guerra há décadas... Mas desta vez foram longe demais. Há um acordo, e eles o quebraram... _ Allister sussurra como se falasse para si mesmo.

- E eu sou Allister Morgan, futuro Alfa do Clã Escarlate e filho do Alfa.. Vim de uma linhagem de alfas que começou a séculos atrás, talvez até milênios! _ Ele fala com orgulho, surpreso quando Lavínia não reage. Ela luta para acreditar que tudo é real.

- O que eles queriam comigo? _ ela pergunta finalmente.

- Te matar. Achei que fosse óbvio!

- Mas por que eu?

- Porque você era a presa mais fácil no momento. Na verdade, você evitou uma carnificina. Descobri que planejavam invadir a festa e matar o máximo de gente possível, mas você desviou a atenção e deu tempo para reagirmos.

Lavínia ri com deboche.

- Acho que mereço uma medalha, não é mesmo?

Allister a observa com curiosidade.

- Havia crianças lá. Filhos de humanos que dormiam na mansão ao lado, sem ideia do risco que corriam...

Ele fala calmamente, e um arrepio percorre Lavínia.

- Nem todos eram lobisomens, a maioria eram humanos, acionistas, sócios e funcionários...

- Espera... como você fez para que confirmassem que eu caí da escada?

- Pura sorte. A festa já acabava; todos os humanos já haviam ido dormir. Ficaram apenas os lycans, e como todos estavam envolvidos na briga, disseram apenas o que tinham que dizer.

- Como você me achou?

- Aaah, isso... precisei de você, fui procurá-la e não encontrei. O segurança disse que você saiu sozinha estrada afora. Fiquei preocupado, fui atrás, senti o cheiro dos Sentinelas, voltei e informei aos outros, rastreamos seu cheiro e o restante você já sabe.

Lavínia respira fundo, sentindo o corpo doer.

- E agora, o que vai ser?

Allister fica em silêncio, e Lavínia percebe uma sombra escurecer seus olhos.

- Agora você vai para minha fazenda até se recuperar...

- Por que você insiste nisso?

Ele a encara por alguns segundos e responde:

- Porque você corre mais perigo agora do que correu naquela noite!

Ele percebe que Lavínia entende a gravidade da situação e continua:

- Você viu demais. Viu nossa existência, nossa aparência e sabe quem somos. Agora não são apenas os Sentinelas que querem você morta, meu próprio clã também quer.

Lavínia fica em silêncio. A seriedade da situação a atinge com força.

- Por isso quero levá-la para minha fazenda. Sou futuro alfa, minha palavra está abaixo apenas da do meu pai. Lá, ninguém se atreveria a te machucar. É o único lugar seguro para você neste momento!

- Mas e minha família?

- Não se preocupe, eles estão a salvo, não são do interesse dos clãs. Mas você é, e, se quiser continuar viva, terá que fazer sua mãe concordar. Entendeu?

Lavínia encara Allister por alguns segundos e surge uma dúvida em sua mente.

- Por que você está me protegendo?

- Digamos que me sinto responsável pelo que aconteceu! — ele dá de ombros, como se fosse irrelevante.

- Digamos que você é! Se tivesse me ouvido, eu teria ido para casa em segurança...

- Se tivesse te ouvido, talvez pais e mães estivessem chorando a morte de seus filhos... ou talvez não sobrasse muitos de nós para chorar... Você foi um mal necessário...

Ele dá de ombros, e Lavínia se sente menosprezada.

- Obrigado por deixar claro que não sou importante. Pode me mandar pra casa, aceito as consequências e você pode viver tua vida de glamour, esquecendo minha existência... o que não seria difícil!

Allister a encara por alguns segundos, olhos indecifráveis deixando Lavínia desconfortável.

- Se não fosse importante, eu não estaria assumindo a responsabilidade por você, não estaria brigando contra minha família para mantê-la viva... E você consegue mesmo assumir as consequências? Mesmo que envolva sua família?

A pergunta a atinge como um soco. Ela entende o perigo que sua família corre.

- Ok... concordo em ir para sua fazenda e farei minha mãe concordar.

Ele sorri.

- Então irei levá-la de volta ao quarto!

Ele abre a porta de ferro, pegando Lavínia no colo sem dar tempo para ela reagir. Ela, pega de surpresa, apenas aceita.

Ela envolve os braços sobre o pescoço dele, sentindo seu corpo reagir à proximidade; ele percebe e a encara por um momento.

- Está desconfortável? Desculpe, mas as enfermeiras estavam proibidas de entrar aqui, então terei que levá-la assim mesmo.

- Tudo bem... só... estou um pouco cansada, a noite foi longa. _ ela gagueja.

Ele sorri.

- Eu sei, mas logo poderá voltar a dormir. Deite a cabeça no meu ombro relaxa, o caminho até o quarto é curto, logo estará na sua cama.

- Não... imagina, não precisa, estou bem assim... _ ela fala aflita. Aproximar-se mais talvez não fosse uma boa ideia.

- Pensei em ir de elevador, mas haverá gente lá; vamos pela escada de trás, não quero que ninguém veja você assim.

“Assim?” Lavínia pensa.

- Assim como? _ pergunta, confusa. Ele a observa atentamente.

- Assim. Com cabelos bagunçados, roupa larga... _Ele fala, contendo um riso.

“Merda. Devo estar horrível. Há quanto tempo estou sem banho? Sem escovar os dentes?” _ pensa, sentindo vergonha e náusea.

- Calma, você não está tão mal assim. Na verdade, diria que nem toda essa situação tirou sua beleza.

Ele a encara novamente e sorri.

- Duvido muito... _ ela sussurra.

- Não sou mentiroso. Você é tão naturalmente bonita que, mesmo bagunçada, fica mais bela que a maioria.

Ele diz com um sorriso de canto de boca. Ela se pergunta se ele é apenas gentil ou sincero, mas decide deixar pra lá, há coisas mais importantes para se preocupar.

Ao chegarem ao quarto, uma enfermeira os espera com a porta aberta. Ele a coloca na cama, e a enfermeira pergunta se ela está com dor.

- Sim, o pé dói um pouco... _ diz, extremamente cansada.

- Ok, vou pegar um remédio e já volto.

- Moça, por favor, não me dê remédios que me façam dormir, estou cansada de acordar e não saber onde estou.

A enfermeira olha para Allister, que concorda com um movimento de cabeça.

- Me tira uma dúvida, Allister... É você quem vai me proteger? Ou terei seguranças?

Ela pergunta assim que a enfermeira sai. Ele pensa antes de responder.

- Não posso confiar em ninguém neste momento. Nem mesmo nos meus amigos mais próximos. A segunda principal regra do clã é: a segurança do clã sempre em primeiro lugar. Isso quer dizer que, se dependesse deles, você já estaria morta e quem a matou seria considerado herói, mas como a primeira regra é: a palavra do alfa está acima de qualquer coisa, eles não podem fazer nada...

A enfermeira chega e aplica o remédio. Allister espera ela sair e continua:

- Decidi que você viveria. Agora você é minha responsabilidade. Enquanto estiver indefesa, cuidarei de tudo...

- E depois que eu me recuperar?

Allister se cala.

- E depois? _ Lavínia insiste, já sentindo o medo dominar sua mente.

- Espero que tudo esteja resolvido até lá. O médico disse que você poderá voltar a andar normalmente entre seis e oito meses, tempo suficiente para resolver tudo.

Ele não responde, mas Lavínia não insiste. Cansada, decide terminar a conversa e tentar dormir.

Ele deita ao lado dela e logo adormece; porém, Lavínia, apesar do cansaço, não consegue. Vira-se na cama diversas vezes, acordando Allister.

- Está tudo bem? Ainda não dormiu? _ ele pergunta com voz levemente rouca.

- Não consigo dormir... _ ela sussurra.

Ele se levanta e puxa a cama para mais perto dela, como se fosse feita de isopor.

- Ei, quero que relaxe, tá bom? Sei que foi muita informação para um dia só, mas você precisa descansar. Não se preocupe com nada; estou aqui e não vou deixar ninguém te machucar, eu prometo!

Ele volta para a cama e estende a mão para segurar a dela. Lavínia não entende o motivo, mas imediatamente se sente mais segura; seu corpo relaxa, e adormece em minutos.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App