Alerrandro entrou no quarto com passos lentos, ainda com a camisa molhada colada ao corpo, os cabelos úmidos escorrendo pelas têmporas. O frio da água já não incomodava tanto quanto a inquietação que crescia dentro dele. Ao ver Milena encolhida na cama, abraçando os próprios joelhos, seu semblante endurecido suavizou.
  — Lorena?... — murmurou, com a voz baixa, quase hesitante. — Está tudo bem? Aconteceu alguma coisa quando você entrou no hotel? Alguém lhe tocou?... — Seus olhos estavam fixos nela, e a preocupação era evidente no tom. — Pode me contar... você sabe que pode.
  Milena ergueu o rosto devagar, os olhos ainda marejados, mas sem lágrimas. Tentou falar, mas as palavras pareciam presas na garganta.
  — Não é que eu... Eu... — balbuciou, a voz trêmula, como se lutasse contra algo dentro de si.
  Alerrandro se aproximou e se sentou ao lado dela, o colchão afundando levemente com seu peso. Sem dizer nada, afastou delicadamente os cabelos que caíam sobre o rosto dela, revelando seus traços suaves. Seus dedos roçaram sua pele com cuidado, e ele a olhou com uma expressão que misturava carinho e confusão.
  Ele não amava Lorena, isso era um fato que ele já havia aceitado há tempos. Mas havia algo nela que o fazia querer protegê-la. Talvez fosse o costume, talvez fosse o senso de responsabilidade. Ou talvez fosse aquele olhar perdido que, por algum motivo, o tocava mais do que ele gostaria de admitir.
  Milena, por sua vez, sentia o coração apertado. O gesto de Alerrandro, tão gentil e inesperado, a desarmava. Ela nunca havia recebido esse tipo de cuidado. Seu ex-namorado era rude, impaciente, e a tratava como um fardo. A traição com sua melhor amiga havia sido o golpe final, desde então, ela se fechou para qualquer tipo de afeto.
  E agora, ali, diante de um homem que a confundia com outra, ela sentia algo que não sabia nomear.
  — E então, Lorena... — disse ele, com a voz mais suave. — O que aconteceu?
  Milena desviou o olhar, tentando esconder a emoção que começava a transbordar.
  — Eu... Eu tive um pesadelo... — respondeu, quase num sussurro.
  Alerrandro arqueou uma sobrancelha e soltou uma risada breve, sem maldade.
  — Pesadelo? — repetiu, com um sorriso de canto. — Você é o próprio pesadelo, Lorena.
  Ele se levantou da cama, ainda sorrindo, e passou a mão pelos cabelos molhados.
  — Bom... Vou tomar um banho de verdade agora. Você já me deu um banho — disse, apontando para a camisa encharcada e balançando a cabeça com leve ironia.
  Milena o observou em silêncio, o coração acelerado. Ela queria dizer a verdade. Queria explicar que não era Lorena, que tudo aquilo era um engano. Mas o cuidado nos olhos dele, mesmo que direcionado à pessoa errada, a fazia hesitar.
  Alerrandro saiu do quarto, deixando para trás o perfume de dúvida e a sensação de que, naquela casa, nada era exatamente o que parecia.
  Na mente de Milena, uma pergunta martelava sem descanso: Como ele pôde me confundir assim? A semelhança com Lorena podia ser impressionante, mas a ponto de enganá-lo mesmo de perto? Mesmo olhando nos olhos, tocando seu rosto, ouvindo sua voz? Era difícil acreditar que não houvesse ao menos uma pequena diferença perceptível. E se houvesse algo mais por trás disso, algo que ela ainda não compreendia?
  Ela se encolheu no centro da cama, segurando o lençol com força, como se fosse uma barreira entre ela e aquele mundo estranho. Seus olhos percorriam o quarto luxuoso, tentando encontrar alguma pista, algum detalhe que a ajudasse a entender o que estava acontecendo. Tudo ali era refinado demais, distante da realidade que conhecia. E, ao mesmo tempo, havia uma sensação inquietante de familiaridade.
  De repente, o som da água do chuveiro começou a ecoar pelo corredor. Milena se levantou devagar, os pés descalços tocando o chão frio. A curiosidade crescia dentro dela como uma chama. Ela saiu do quarto com passos silenciosos, hesitantes, e seguiu até o banheiro. A porta estava entreaberta, e o vapor começava a escapar pelas frestas.
  Ela se aproximou e, com o coração acelerado, puxou levemente a cortina do box. O gesto foi quase involuntário, movido por uma mistura de dúvida, medo e fascínio.
  Alerrandro estava de costas, desabotoando a camisa com movimentos lentos, um botão de cada vez. Seus ombros largos se contraíam levemente a cada gesto, e o som da água caindo preenchia o ambiente com uma tranquilidade quase hipnótica. Quando ele finalmente tirou a camisa e se virou, seus olhos encontraram os de Milena.
  Por um instante, o tempo pareceu congelar.
  — Lorena!? — exclamou, surpreso, a voz carregada de tensão. — Aconteceu alguma coisa? Que diabos está fazendo aqui?
  Seu rosto se fechou num misto de confusão e irritação. Ele deu um passo à frente, ainda segurando a camisa molhada, os olhos fixos nela como se tentasse decifrar suas intenções.
  Milena recuou instintivamente, o rosto corado, os olhos arregalados. Ela não sabia o que dizer, não sabia se devia contar a verdade, fugir, ou simplesmente fingir que nada havia acontecido.
  Mas naquele instante, ela percebeu: por mais que Alerrandro a chamasse de Lorena, ele ainda não enxergava quem ela realmente era. E talvez, só talvez, isso fosse sua única vantagem.