Se Sandro havia sido capaz de trair Isabela, certamente poderia fazer o mesmo com Clara no futuro. As pessoas raramente mudavam seus padrões de comportamento.— Deixa ela. — Jorge suspirou, passando a mão pelos cabelos.Ele conhecia bem sua irmã. Mimada desde pequena, Clara só aprendia quando se machucava. Não adiantava ninguém tentar convencê-la do contrário. Apenas a própria vida seria capaz de ensinar essa lição tão amarga.Luan abriu a boca para argumentar, mas logo desistiu. A teimosia de Clara era lendária. Se ela decidisse que o céu era verde, não haveria força no mundo capaz de fazê-la enxergar o azul.Jorge encerrou a chamada e, ao levantar os olhos, notou um iate ancorado perigosamente próximo. Franzindo a testa com desconfiança, observou a embarcação vizinha. Era estranho. Quem vinha para o mar geralmente buscava privacidade, não era comum duas embarcações ficarem tão próximas assim.Da posição onde estava, Jorge não conseguia distinguir Sandro e os outros na cabine de com
A gola levemente aberta da camisa de Jorge revelava seu pescoço longo e sedutor, enquanto seu pomo-de-Adão subia e descia quando ele quebrou o silêncio com voz rouca:— Te assustei?Isabela balançou a cabeça em negativa, mas seus olhos fugiram instintivamente dos dele. O olhar de Jorge era intenso demais, havia algo ali, indefinível e perturbador, que a deixava desconfortável.Aquela conversa anterior ainda martelava em sua mente como um eco persistente. Ele havia dito que ela se parecia com a mulher que ele nunca conseguiu ter. Será que ele estava a usando como substituta? Um estranho alívio percorreu seu peito ao chegar a essa conclusão. Só podia ser isso, a única explicação plausível para aquele olhar, porque Jorge não gostava dela de verdade. Não podia gostar."Ainda bem que percebi isso a tempo. Ainda bem que não me deixei iludir.", refletiu ela consigo mesma.— Ora...Janete apareceu de repente, prestes a dizer algo para Isabela, mas parou abruptamente no meio do caminho. A ce
— O mundo nunca foi justo. — Afirmou Jorge.Ele suspeitava que Isabela ainda enxergava as coisas de forma idealizada, já que estudar Direito era uma coisa, mas ver como a justiça funcionava na prática era algo completamente diferente. Muitas vezes, trabalhar nos limites da lei se tornava necessário para atingir certos objetivos, e nem sempre se tratava apenas de buscar a justiça. Desde o início dos tempos, a injustiça não era exclusividade de um país ou outro, era uma realidade universal, presente em todos os cantos do mundo.Isabela mergulhou num silêncio reflexivo. Ela já sabia disso, era claro. A vida nunca foi justa. Desde o momento em que nasciam, os destinos já eram moldados por fatores que estavam completamente fora do controle. Algumas pessoas vinham ao mundo em meio à pobreza extrema e, para mudarem de vida, precisavam lutar incansavelmente contra obstáculos intransponíveis. Outras já nasciam cercadas de luxo e privilégios incontestáveis. Para aquelas que naciam ricas, o qu
Na verdade, não era que a família não pudesse criar a menina. Eles simplesmente queriam ter um filho homem. Devido à rígida política de controle de natalidade vigente na época, seriam severamente multados caso tivessem mais de um filho e, incapazes de arcar com essa penalidade, optaram por deixar a pequena sob os cuidados dos avós.A criança jamais chegou a ter documentos oficiais. Era considerada uma filha excedente, nascida fora da cota permitida pelo governo. Para registrá-la legalmente, seria necessário pagar uma taxa substancial, mas a família alegava não ter recursos para isso ou, mais provavelmente, não julgava que valia a pena investir numa menina. Era apenas mais uma boca para alimentar, um fardo desnecessário na visão da tia.Os vizinhos frequentemente comentavam sobre os maus-tratos. A tia batia na sobrinha por qualquer motivo, xingava-a e muitas vezes a deixava passar fome como castigo. E quanto aos avós? Não tinham coragem suficiente para defendê-la, temerosos de desagr
Assim que pisaram em terra firme, Viviane agarrou Isabela pelo braço com urgência. O outro iate estava se aproximando rapidamente do cais, e se permanecessem ali por mais um minuto sequer, Isabela inevitavelmente encontraria Sandro. "Que dia desastroso. Primeiro, o Jorge apareceu do nada durante o que deveria ser uma comemoração tranquila, e agora, como se não bastasse, o Sandro também decidiu aparecer no mesmo lugar!".— Isa, será que na hora que você nasceu não olharam direito o calendário? — Brincou Viviane.Senão, não tinha explicação para tanto azar concentrado numa pessoa só!Isabela ficou sem palavras, seu rosto virou uma mistura de confusão e resignação. Antes que conseguisse sequer responder, a outra embarcação já havia atracado no cais.Fabiano foi o primeiro a desembarcar com seu característico ar despreocupado. Assim que avistou Viviane, abriu um sorriso largo e caminhou diretamente em sua direção.— Olha só que coincidência! — Exclamou ele com falsa surpresa. — Você tamb
— Eu te levo para casa. — Ofereceu Jorge com naturalidade.— Tudo bem. — Isabela acenou sem hesitação. Finalmente, incapaz de se conter por mais tempo, Sandro esqueceu o orgulho. Avançou num impulso e agarrou o pulso dela com força.— Isa... — Sua voz soou quase suplicante.Isabela se virou devagar para encará-lo, indagando com frieza:— Algum problema, Sr. Sandro?A distância e indiferença naquelas simples palavras o atingiram como um soco violento no peito. Sandro sentiu o coração literalmente doer.— Fe... Feliz aniversário. — Ele conseguiu dizer com voz rouca, engolindo em seco antes de ir direto ao ponto. — Isa, eu me arrependi de tudo. Vamos nos casar de novo.Jorge imediatamente apertou o braço de Isabela num gesto protetor. Ela, por sua vez, soltou um riso curto e sem qualquer traço de humor.— Ah, já que está me dando os parabéns, então vou fazer um pedido. — Disse ela, inclinando levemente a cabeça enquanto seus olhos transbordavam desprezo. — Eu desejo sinceramente que você
Sandro sentiu o sangue ferver, subindo por suas veias e queimando como lava. Se antes ele ainda nutria alguma esperança de reconciliação, agora não restava absolutamente nada. A verdade o atingiu como um golpe certeiro. Isabela realmente queria ir embora, não desejava mais estar ao seu lado.Ele simplesmente não conseguia aceitar aquela realidade!Dentro do carro, Isabela prendeu o cinto de segurança com movimentos mecânicos. Embora pudesse ouvir claramente os gritos enfurecidos de Sandro do lado de fora, não demonstrou qualquer reação.Jorge virou o rosto para observá-la e, ao constatar sua impressionante impassibilidade, um leve sorriso de satisfação surgiu no canto de seus lábios. Deu partida no veículo com tranquilidade, fazendo o motor ronronar potentemente antes de girar o volante e acelerar suavemente, permitindo que o carro deslizasse pela pista como uma sombra elegante na noite.Quando finalmente se afastaram por completo da área do cais, Isabela quebrou o silêncio que paira
Jorge desligou o telefone e já se preparava para sair do carro quando um toque insistente ecoou pelo interior do veículo. Ao olhar para o lado, percebeu que o celular de Isabela tinha ficado esquecido sobre o banco do passageiro.Ele pegou o aparelho e na tela iluminada um nome chamou sua atenção imediatamente: "Mamãe". Um sorriso espontâneo surgiu nos seus lábios enquanto se lembrava daquela mulher calorosa. Lara era, no mínimo, uma figura divertida. E talvez agora ele tivesse um bom pretexto para procurar Isabela novamente?Com o celular em mãos, saiu do carro, tomou o elevador até o térreo, atravessou a rua e entrou no prédio de Isabela. Enquanto aguardava o elevador no saguão, o telefone tocou de novo com insistência.Jorge hesitou brevemente. Já passava da meia-noite, e se a mãe dela ligava repetidamente àquela hora, poderia ser algo urgente. Decidiu atender, mesmo sabendo que não era apropriado.Nem teve tempo de pronunciar uma saudação quando a voz animada de Lara já ecoava do