Capítulo 4

Rodrigo

Querem saber o que me fez mudar? O que fez o delegado frio e racional perder o chão? Então senta, porque essa história não começa com heroísmo… mas com tragédia.

Era um dia comum na delegacia. Café quente na mesa, relatórios sobre a mesa e o silêncio típico das manhãs de segunda-feira. Até o telefone tocar.

— Delegado Rodrigo? É sobre o seu sobrinho e o seu cunhado... houve um acidente...

O tempo parou.

Minha respiração travou e meu coração... bom, esse já sabia o que vinha. Levantei num salto, largando tudo. Dirigi feito um louco até o local indicado, cada segundo uma eternidade. Quando cheguei e vi o carro completamente destruído, meu mundo caiu.

Não precisei de laudo técnico. Aquilo era uma sentença.

Me ajoelhei no asfalto ainda úmido da madrugada anterior, olhos arregalados e mãos tremendo. As sirenes ao fundo, os bombeiros tentando manter a ordem... mas dentro de mim, tudo era caos.

— Não pode ser... não ele, não meu menino!

Meu sobrinho. Meu anjinho de sorriso fácil. Meu parceiro de pescarias, partidas de videogame, tardes no parque. Eu o amava como se fosse meu filho. E agora… eu o perdera. Junto com o pai, meu cunhado. O homem que amava minha irmã com todo o coração.

Meus colegas tentavam me consolar, mas as palavras sumiam no barulho dos meus próprios pensamentos. Só conseguia pensar em uma coisa: minha irmã. Como eu iria contar? Como alguém encara uma mãe e diz que ela perdeu o filho e o marido no mesmo dia?

Dirigi até a casa da Brianna ao abrir a porta e  me ver, olhos inchados e a alma morta, ela entendeu sem que eu precisasse abrir a boca.

Ela cobriu o rosto com as mãos e chorou em silêncio. Não tive forças para impedi-la. Ela amava aquele menino como um neto.

Subi as escadas com o coração na garganta. Quando entrei no quarto da minha irmã, ela estava lendo calmamente, totalmente alheia à tempestade que se aproximava. Levantou os olhos e sorriu.

— Rodrigo, aconteceu alguma coisa?

— Sim… — Minha voz saiu falhada. — É o… o Richard... o Pedro…

Antes que eu pudesse concluir, ela desabou. Seus olhos reviraram, o corpo perdeu força, e desmaiou nos meus braços. Foi um desespero silencioso. A partir daquele instante, ela deixou de ser a mulher forte que eu conhecia e passou a ser apenas... uma mãe devastada.

Tive que tomar conta de tudo: hospital, funerária, velório. Minha noiva Vivienne foi meu porto seguro. Ela não me deixou um minuto sequer.

— Você não está sozinho, amor. Estou aqui. Vamos passar por isso juntos. — dizia ela, com firmeza.

Depois do sepultamento, voltamos para casa. Eu estava emocionalmente destruído. Ela me puxou para o chuveiro, me abraçou sob a água quente e sussurrou:

— Vai ficar tudo bem… você é forte. E eu estou aqui, meu delegado lindo.

Me agarrei a ela como quem se agarra à última tábua no mar revolto.

— Obrigado por ser minha fortaleza… sem você, eu teria desabado.

Naquela noite, ela me fez adormecer em paz. Seus dedos percorreram meu cabelo até que o cansaço venceu e eu apaguei. Depois de quase três dias sem dormir, finalmente descansei.

Acordei com uma visão que parecia vinda do paraíso. Vivienne, usando uma camisola vermelha que contrastava com sua pele clara, estava sentada ao meu lado, sorrindo.

Seu toque era leve, mas firme. Seus olhos diziam: Você ainda tem motivos para viver.

Mas a vida ainda guardava mais crueldade.

Fui até a casa da minha irmã para vê-la e, ao chegar, percebi que havia algo errado. Portas fechadas, janelas escuras. Nem o cachorro latiu como de costume. Meu sangue gelou.

— CLAIRE? — gritei, batendo na porta.

Nada.

Sem pensar, arrombei a entrada e corri pelos cômodos. Foi quando a vi. Minha irmã caída no chão do quarto, a pele pálida, um frasco de remédios vazio ao lado. Por um segundo, achei que fosse tarde demais.

— NÃO! NÃO FAZ ISSO COMIGO!

Liguei para a emergência com mãos trêmulas. Gritei com os paramédicos. Pressionei seu pulso, soprei esperança em seus pulmões. Não sei quanto tempo passou, mas ouvir um dos socorristas dizer “Ela ainda tem pulso!” foi como ouvir um milagre.

Ela sobreviveu. Mas algo em mim morreu.

A dor que se instalou naquele dia me mudou para sempre.

A alegria fácil se tornou rara. A leveza… virou peso.

E agora eu vivo para proteger quem ainda resta. Minha irmã. Minha noiva. Minha missão.

Porque o que aprendi é que a felicidade é frágil, e pode ser esmagada em um piscar de olhos.

Mas eu estou de pé.

E por mais que a dor ainda queime, é ela que me move.

Os dias seguintes foram um teste de resistência. Eu deixei tudo — minha carreira, minha rotina, minha noiva — para me dedicar à minha irmã. Não havia margem para distrações quando o que estava em jogo era a vida de Brianna.

Ela estava frágil como nunca. Dormia pouco, comia menos ainda. Andava pela casa como um vulto, um eco da mulher vibrante que fora um dia.

— Brianna, por favor, você precisa procurar ajuda… Você é forte, minha irmã! — implorei mais uma vez, segurando suas mãos trêmulas.

Ela me olhou com olhos apagados, e foi como encarar um abismo.

— Eu não quero mais viver, Rodrigo… Eu só quero morrer.

Ouvir aquilo foi como ser apunhalado. Minha irmã sempre foi o meu alicerce. E agora... eu era o dela, mesmo que ela não percebesse.

Passei a vigiá-la dia e noite. Deixei de ir à delegacia. Minhas prioridades mudaram. Mas, ao fazer isso, negligenciei a única pessoa que até então me dava suporte: Vivienne.

Cheguei em casa um dia e a cena me derrubou: malas prontas na sala, Vivienne parada na porta.

— Vou embora, Rodrigo. Cansei de ser deixada de lado. Você só pensa na sua irmã! — disse, com os olhos marejados de mágoa, mas sem remorso. — Tomara que ela morra logo. Assim, quem sabe, você volta a olhar para mim.

Eu congelei.

— Vivienne, o que você está dizendo? — perguntei, engolindo o ódio que subia pela minha garganta. — Minha irmã perdeu o filho, perdeu o marido, tentou tirar a própria vida. E você está me pedindo para abandoná-la?

— Ela não é sua mulher, Rodrigo! Eu sou!

— Então talvez você nunca tenha entendido nada do que é amor. Porque se ela morrer… eu morro com ela.

Ela me lançou um olhar carregado de desprezo e jogou a aliança no chão.

— Fica aí com sua doente. Eu mereço alguém inteiro. Adeus.

A porta se fechou. E com ela, tudo o que eu pensava saber sobre Vivienne.

Naquela noite, chorei como há muito não fazia. Não pelo fim do relacionamento, mas por finalmente enxergar quem ela realmente era. Como pude amar alguém tão… raso?

Mas foi nesse vazio que a transformação começou.

Depois de mais uma tentativa de suicídio, consegui internar minha irmã. Ela foi acolhida por uma clínica especializada, onde teria o acompanhamento que precisava. Mas nem ali ela reagia. Silêncios intermináveis, recusa em interagir, apatia completa.

Meu coração se partia a cada visita.

E, enquanto ela lutava (ou desistia) silenciosamente, eu precisei encontrar um modo de não enlouquecer. Foi quando conheci um mundo novo. Um universo que me trouxe controle quando tudo ao meu redor parecia fora dele.

O BDSM.

No início, foi pura curiosidade. Mas bastou um contato, uma primeira experiência… e eu soube que ali estava a minha catarse. A dor e o prazer entrelaçados, a entrega e o domínio, os limites rompidos. Eu renasci naquele submundo.

Me tornei um Dominador.

Os gritos de prazer, o som do couro contra a pele, o arrepio que precede a ordem obedecida… aquilo me preenchia. As mulheres que se ajoelhavam diante de mim me davam algo que ninguém mais dera: entrega incondicional.

— Sim, Senhor… por favor… mais uma vez...

A submissão, o olhar de desejo misturado ao medo, a pele marcada por mim… tudo isso se tornou meu escape. E ali, naquela sala escura, com os brinquedos expostos, os olhos vendados das submissas e suas bocetas molhadas, eu deixava minha dor escorrer junto ao suor e ao prazer.

Não era apenas sexo.

Era o poder de sentir que eu controlava algo outra vez. Que eu decidia o ritmo, o limite, o ápice.

Hoje, sou outro homem.

A dor me moldou, o abandono me transformou e o prazer me reconstruiu.

Vivienne me queria submisso ao ego dela.

Agora, sou eu quem impõe as regras.

E que ironia... quando me dei liberdade, descobri que nunca fui tão forte.

Mas não pense que esqueci da minha irmã.

Ela ainda é meu elo com o passado. E talvez, um dia, o amor que temos seja o único laço que ainda me torne... humano.

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