Dmitry abriu os olhos, e soube que não estava mais no mundo desperto.
Não era a primeira vez.
Aquele salão luxuoso, de arquitetura antiga e silenciosa opulência, já o havia acolhido antes. Um reflexo distorcido da realidade, talvez.
Mas naquela noite… Algo era diferente.
O calor que vinha da lareira no canto não era reconfortante. Era denso. Quase opressor. Carregado de uma eletricidade primitiva. Como se o fogo não queimasse madeira, mas sim o véu entre os mundos.
“Ela está aqui.”
A voz do seu Lycan ecoou dentro dele, tensa.
“Dessa vez… Ela nos puxou. Com força.”
E então ele a sentiu.
Antes mesmo de vê-la, ele soube. O cheiro dela, sutil e indecente, mistura de mel e tentação. A presença que se arrastava por dentro de sua mente, entorpecendo tudo que antes fazia sentido.
Dmitry se virou, e a viu a poucos passos de si.
Diferente das visões confusas e sem rosto dos sonhos anteriores. Agora, Susan estava lá de verdade. Tão real quanto o sangue em suas veias.
Ela estava de costas, mas o corpo dele reagiu antes que sua mente conseguisse entender. Os músculos se contraíram. A besta vibrou sob sua pele.
“Nos encontrou… Finalmente.”
Susan se virou devagar, como se sentisse o mesmo peso arrastando seus ossos, e o olhar dela se prendeu ao dele.
Ver aqueles olhos verdes, ali, naquele plano... Era como ser tragado para dentro de um feitiço.
— Você me trouxe. — A voz dele saiu mais baixa do que pretendia, rouca, carregada demais. Mas verdadeira.
Ela estremeceu, e Dmitry soube: aquela não era uma ilusão criada por ele. Não era desejo projetado.
Era ela. Real. Sonhando. Chamando.
Susan tentou responder, mas a confusão se misturava ao medo. Ele viu. E aquilo doeu. Mais do que deveria.
— Dmitry… O que você está fazendo aqui?
Ele deu um passo à frente. A energia do ambiente pulsou com o movimento, e algo dentro dele rugiu com aprovação.
“Toca nela. Sente. Marca. Reivindica.”
Ele ignorou a fome, ou ao menos tentou. Precisava entender o que aquilo era. Como ela o puxava. E por que diabos, mesmo no sonho, ele se sentia à beira da submissão.
— Você sabe. — Disse com firmeza. — Não fui eu que vim até você, malyshka (pequena). Foi você quem me puxou pra cá.
Ele a sentiu se abalar. O instinto dele rugiu outra vez.
“Ela nos quer. Mesmo quando não entende.”
Susan tentou negar. Mentiu. Dmitry viu nos olhos dela. Ouviu a hesitação. E soube.
— Não minta pra mim. Nem aqui. — Sua voz caiu, grave, densa. — Você me chama mesmo quando não sabe. O seu corpo me chama. A sua mente. Até no sono... Você me quer.
Ela recuou, mas seus pés permaneceram presos ao chão do sonho. Como se o plano ao redor os obrigasse a enfrentar aquilo que, no mundo real, os dois ainda fingiam não ver.
— Dmitry… Isso é só um sonho…
— Não, milaya (linda). — Ele se aproximou mais. Podia sentir o cheiro dela, mesmo ali. A alma dele vibrava com a proximidade. — Isso é você. É o que você esconde. E aqui… Você não pode fugir de mim.
O toque foi leve. Mas detonou o inferno dentro dele.
Seus dedos roçaram o braço dela, e Dmitry quase perdeu o controle. O calor da pele dela era como um raio atravessando sua espinha.
“Nossa. A fêmea feita pra nós. Goza nela agora. Rasga o tempo, o espaço. Entra.”
Ele cerrou os dentes, tentando conter o rosnado.
Susan fechou os olhos, o corpo inteiro estremecendo sob seu toque. Ela sentia também. Aquele não era só um encontro. Era o começo de uma ruptura.
— Como alguém tão pequena… — Ele sussurrou, a voz embargada pelo desejo que queimava sob sua pele. — Consegue brincar assim com a minha sanidade?
Ela não respondeu. Não precisava. Dmitry via nos olhos dela: Susan sabia que tinha esse poder sobre ele.
Que carregava em si um chamado primitivo, antigo. Um código ancestral que quebrava todas as defesas dele, desde o primeiro toque.
“Toca mais. Beija. J**a ela no chão e faz ela gritar teu nome.”
Mas ele não podia. Não ainda.
Queria tocá-la de verdade. No mundo real. Na cama certa. No tempo certo. Queria ver os olhos dela se dilatarem de prazer, não de medo. Queria merecer cada gemido, cada entrega.
Quando Susan fechou os olhos, Dmitry se inclinou, incapaz de resistir ao impulso. Quase a tocou. Quase a puxou contra si.
Mas ela desapareceu, e ele foi arrancado daquele plano como se tivesse sido arremessado para fora de si mesmo.
O quarto escuro da mansão o recebeu com silêncio. Mas o corpo… Ardia. O coração batia como se tivesse lutado. A pele formigava. E sua alma… Sangrava.
“Ela nos abriu. Nos viu. Nos sentiu. Agora, ou a temos… Ou morremos tentando.”
Dmitry passou a mão pelo rosto, o suor frio escorrendo por suas têmporas.
Aquilo tinha sido um chamado. E se soubesse que ele estava à beira da rendição completa…
Talvez fugisse. Ou talvez… O chamasse de novo. E ele sabia, não teria forças para voltar.
…
Dmitry mal percebia o aroma do café na sala de jantar. Seus olhos fixavam um ponto qualquer na mesa, enquanto a mente insistia em vagar para outro lugar. Para outra pessoa.
"Como ela estará vestida hoje?"
Ele cerrou o maxilar ao perceber o rumo de seus próprios pensamentos.
Susan.
A maldita ruiva de olhos verdes não saía de sua cabeça, e para piorar, aquele sonho só tinha piorado tudo. Ele passou a madrugada inteira lidando com sua mente insubordinada, evocando imagens proibidas.
Dmitry a imaginou completamente nua em sua cama, a pele clara e convidativa, pedindo para ser marcada. Os lábios carnudos entreabertos, o brilho em seus olhos verdes enquanto o olhava, as curvas delineadas de seu corpo.
Ah… E aqueles seios fartos, implorando para serem devorados. Sentia seu membro pulsar, louco para explorar seu interior quente.
Seu Lycan rosnou em deleite e Dmitry segurou a xícara com força.
Ele sabia que esse desejo era uma armadilha perigosa. Não apenas porque Susan era sua funcionária, mas porque a simples presença dela fazia algo em seu âmago rugir por liberdade. E isso era inaceitável.
Um ruído à sua frente trouxe sua atenção de volta para a realidade. Ele ergueu o olhar, encontrando os olhos azuis de Natália fixos nele.
— Você está distante. — Ela mexia a colher dentro da xícara, a voz suave, mas com uma leve inflexão calculada. — Pensando no trabalho?
Dmitry assentiu devagar, mantendo o olhar vazio.
— Entre outras coisas.
Natália apoiou os cotovelos na mesa, o rosto levemente inclinado.
— Os conselheiros perguntaram sobre nós ontem. Querem saber quando teremos um herdeiro.
Ele soltou um suspiro leve, sem encarar diretamente a mulher à sua frente.
— Eles sempre perguntam.
— E sempre recebem silêncio em troca. — O sorriso dela era sereno, mas os olhos observavam cada nuance dele. — Dmitry, nós dois sabemos que isso vai acabar acontecendo.
Ele apertou a xícara com mais força do que o necessário.
— Talvez. Mas não do jeito que eles esperam.
Ela inclinou a cabeça, tentando decifrar suas palavras.
— Você fala como se tivesse uma escolha. O clã precisa de continuidade.
Dmitry se recostou lentamente na cadeira, a voz baixa e arrastada.
— O clã precisa de equilíbrio… E eu preciso de paz.
Natália sustentou o olhar dele com uma serenidade treinada.
— Paz pode vir com estabilidade. Com um herdeiro.
Ele manteve o olhar fixo nela por um instante, antes de responder, com o tom medido:
— Paz não nasce de obrigações. E você sabe disso.
Natália desviou o olhar por um breve momento, depois o retomou.
— As pessoas falam, Dmitry. Dizem que somos... Frios. Distantes demais.
— E quando nos casamos, elas diziam que éramos perfeitos juntos. — Ele ergueu uma sobrancelha, o sarcasmo quase imperceptível. — As pessoas sempre falam.
— Isso não pode continuar assim para sempre. Você tem responsabilidades, e eu também.
— Eu cumpro as minhas. — A voz dele soou mais firme, mas ainda controlada. — E você, Natália, tem feito o que acha necessário para manter as aparências.
Ela ergueu levemente o queixo.
— Isso é uma acusação?
— É apenas uma constatação.
Natália respirou fundo, como se estivesse tentando manter a compostura.
— Eu sou sua esposa, Dmitry.
Ele fitou sua xícara por alguns segundos antes de responder.
— Você é parte de um acordo, Natália. Não se trata de sentimento. Nunca se tratou.
Ela hesitou, o rosto impassível, mas os dedos apertando discretamente o guardanapo denunciavam o incômodo.
— Talvez, com o tempo, as coisas possam ser diferentes.
Dmitry a encarou, os olhos ligeiramente semicerrados.
— Algumas coisas não mudam, por mais que se queira.
Ela se levantou devagar, pegando sua bolsa com um movimento suave.
— Não se atrase para suas reuniões, Alfa.
Ele apenas assentiu, observando enquanto ela saía. Um alívio gélido que caiu sobre ele como um cobertor de inverno.
O Lycan em seu interior se agitava com impaciência.
"Ela não é nossa. A presença dela nos fere. O cheiro dela nos repele."
Dmitry levou os dedos à testa, massageando as têmporas.
"Mas Susan..."
A imagem dela surgiu em sua mente com uma força quase violenta.
"Ela sim... É calor. É verdade. É desejo. Nosso desejo. Toque nela. Lamba cada curva. Marque aquela pele pálida. Ela quer ser tomada. Quer ser nossa."
Ele cerrou os dentes. Aquela obsessão estava saindo do controle. Cada pensamento, cada sonho… A simples ideia de cruzar o olhar com Susan fazia seu corpo responder de forma traiçoeira.
E depois daquele sonho, até seu Lycan se recusava a fingir.
"Susan sente. E ela pertence a nós."
Dmitry rosnou baixo, apenas para si. Ele não a rejeitaria. Mas também não cederia.