O cheiro do café forte preenchia a sala de jantar, mas Dmitry mal percebeu o aroma. Seus olhos fixavam um ponto qualquer na mesa, enquanto a mente insistia em vagar para outro lugar. Para outra pessoa.
"Como ela estará vestida hoje?" Ele cerrou o maxilar ao perceber o rumo de seus próprios pensamentos. Susan. A maldita ruiva de olhos verdes não saía de sua cabeça, e para piorar, aquele sonho só tinha piorado tudo. Ele passou a madrugada inteira lidando com sua mente insubordinada, evocando imagens proibidas. Primeiro em seu escritório, depois em seu quarto. Dmitry a imaginou completamente nua em sua cama, a pele clara e convidativa, pedindo para ser marcada. Os lábios carnudos entreabertos, o brilho em seus olhos verdes enquanto o olhava, as curvas delineadas de seu corpo. Ah… E aqueles seios fartos, implorando para serem devorados sem reservas. Sentia seu membro pulsar, louco para explorar seu interior quente. Seu Lycan rosnou em deleite e Dmitry segurou a xícara com força. Ele sabia que esse desejo era uma armadilha perigosa. Não apenas porque Susan era sua funcionária, mas porque a simples presença dela fazia algo em seu âmago rugir por liberdade. E isso era inaceitável. Um ruído à sua frente trouxe sua atenção de volta para a realidade. Ele ergueu o olhar, encontrando os olhos azuis de Natália fixos nele. — Você está distante. — Ela mexia a colher dentro da xícara, a voz suave, mas com uma leve inflexão calculada. — Pensando no trabalho? Dmitry assentiu devagar, mantendo o olhar vazio. — Entre outras coisas. Natália apoiou os cotovelos na mesa, o rosto levemente inclinado. — Os conselheiros perguntaram sobre nós ontem. Querem saber quando teremos um herdeiro. Ele soltou um suspiro leve, sem encarar diretamente a mulher à sua frente. — Eles sempre perguntam. — E sempre recebem silêncio em troca. — O sorriso dela era sereno, mas os olhos observavam cada nuance dele. — Dmitry, nós dois sabemos que isso vai acabar acontecendo. Ele apertou a xícara com mais força do que o necessário. — Talvez. Mas não do jeito que eles esperam. Ela inclinou a cabeça, tentando decifrar suas palavras. — Você fala como se tivesse uma escolha. O clã precisa de continuidade. Dmitry se recostou lentamente na cadeira, a voz baixa e arrastada. — O clã precisa de equilíbrio… E eu preciso de paz. Natália sustentou o olhar dele com uma serenidade treinada. — Paz pode vir com estabilidade. Com um herdeiro. Ele manteve o olhar fixo nela por um instante, antes de responder, com o tom medido: — Paz não nasce de obrigações. E você sabe disso. Natália desviou o olhar por um breve momento, depois o retomou. — As pessoas falam, Dmitry. Dizem que somos... Frios. Distantes demais. — E quando nos casamos, elas diziam que éramos perfeitos juntos. — Ele ergueu uma sobrancelha, o sarcasmo quase imperceptível. — As pessoas sempre falam. — Isso não pode continuar assim para sempre. Você tem responsabilidades, e eu também. — Eu cumpro as minhas. — A voz dele soou mais firme, mas ainda controlada. — E você, Natália, tem feito o que acha necessário para manter as aparências. Ela ergueu levemente o queixo. — Isso é uma acusação? — É apenas uma constatação. Natália respirou fundo, como se estivesse tentando manter a compostura. — Eu sou sua esposa, Dmitry. Ele fitou sua xícara por alguns segundos antes de responder. — Você é parte de um acordo, Natália. Não se trata de sentimento. Nunca se tratou. Ela hesitou, o rosto impassível, mas os dedos apertando discretamente o guardanapo denunciavam o incômodo. — Talvez, com o tempo, as coisas possam ser diferentes. Dmitry a encarou, os olhos ligeiramente semicerrados. — Algumas coisas não mudam, por mais que se queira. Ela se levantou devagar, pegando sua bolsa com um movimento suave. — Não se atrase para suas reuniões, Alfa. Ele apenas assentiu, observando enquanto ela saía. Os saltos dela ecoaram pelo corredor, deixando para trás um silêncio denso — um alívio gélido que caiu sobre ele como um cobertor de inverno. O Lycan em seu interior se agitava com impaciência. "Ela não é nossa. A presença dela nos fere. O cheiro dela nos repele." Dmitry levou os dedos à testa, massageando as têmporas. "Mas Susan..." A imagem dela surgiu em sua mente com uma força quase violenta. "Ela sim... É calor. É verdade. É desejo. Nosso desejo. Toque nela. Lamba cada curva. Marque aquela pele pálida. Ela quer ser tomada. Quer ser nossa." Ele cerrou os dentes. Aquela obsessão estava saindo do controle. Cada pensamento, cada sonho… A simples ideia de cruzar o olhar com Susan fazia seu corpo responder de forma traiçoeira. E agora, até seu Lycan se recusava a fingir. "Susan sente. E ela pertence a nós." Dmitry rosnou baixo, apenas para si. Ele não a rejeitaria. Mas também não cederia. *** O caminho até a sede da Rurik Motors foi percorrido em absoluto silêncio. A cidade pulsava do lado de fora, indiferente à tempestade que girava dentro dele. Dmitry mantinha uma mão firme no volante e a outra sustentando o queixo, os olhos fixos na estrada, mas a mente longe dali. Ele precisava se concentrar. Tinha reuniões com investidores, ajustes em projetos de expansão, decisões comerciais que poderiam afetar o clã por anos. Mas nada disso parecia importar. Nada. Um nome ecoava em seu peito. "Susan." Seu Lycan se remexeu sob a pele, inquieto, faminto. Os sentidos aguçados captavam a aproximação antes mesmo do corpo racional compreender. "Ela tá perto." Dmitry cerrou os olhos por um instante, pressionando os dedos contra as têmporas. Ele precisava manter o controle. Precisava ser frio. Objetivo. Lúcido. Mas ela o desarmava sem nem saber. Assim que entrou no prédio, cumprimentou os funcionários apenas com acenos curtos, sem se deter. Subiu direto para o último andar, para o refúgio temporário que seu escritório representava. Mergulhou nos contratos, tentou ignorar o cheiro suave que começava a permear o ar. Flores e mel. Doce. Inconfundível. Ela. O telefone tocou. — Senhor Rurik… — A voz da secretária soou firme, mas havia algo hesitante ali. Curiosidade mal contida. — Susan Grigorieva pediu para avisar que enviou os esboços com as ideias para a campanha. Silêncio. Ele não respondeu de imediato. Apenas encarou a tela do computador, onde o e-mail dela já estava aberto. Palavras bem alinhadas. Objetivas. Profissionais. Mas seus olhos não viam mais texto. Ele via o nome. Susan. “Chame-a.” A voz da fera sussurrou dentro dele com uma nitidez cruel, quase como se estivesse do outro lado da sala. Dmitry sentiu o impacto do nome dela se espalhar por seu corpo como um raio, aquecendo suas entranhas e despertando lembranças da noite mal dormida — e do corpo que ele tentou esquecer em vão. — Mande-a vir até mim. — Ordenou, a voz baixa, rouca, carregada de algo que nem ele fingia mais conter. Esperou. Os olhos fixos na porta, como se ela pudesse atravessá-la a qualquer instante. Quando o telefone tocou novamente, não deu chance para palavras. — Mande-a entrar. Disse antes que a secretária respirasse, a voz pesada, opaca, inegociável. A batida veio minutos depois. Suave. Quase tímida. Seu corpo se enrijeceu num reflexo que o traiu. A fera dentro dele se calou por um instante, em expectativa. — Entre. — Ele disse, contido, embora a tensão vibrasse em cada sílaba. A maçaneta girou. E então ela apareceu. Como um feitiço que toma forma diante dos olhos, ela surgiu no limiar da porta com uma presença que era doce e devastadora ao mesmo tempo. Os cabelos ruivos emolduravam seu rosto como fogo. Os olhos verdes, vívidos, o encararam com naturalidade desconcertante. A blusa clara delineava seus seios com uma ousadia que parecia inocente. A saia lápis moldava suas curvas como um segredo que ele não deveria saber. E mesmo assim, sabia. O corpo dela parecia ter sido desenhado para provocar falhas no seu controle. Dmitry esqueceu como se respirava. "Toque-a." A voz veio de novo. Baixa. Exigente. "Sinta. Marque. Reivindique." — Bom dia, Sr. Rurik. — Ela disse, com a voz educada, gentil. Como se não carregasse nada. Como se não tivesse ideia do caos que plantava apenas ao existir. — Bom dia, Grigorieva. — Respondeu. A voz soou mais grave do que esperava. Quase rouca. Ela se aproximou, passos firmes, postura segura. Abriu o caderno de esboços sobre a mesa, e Dmitry acompanhou o movimento de seus dedos com uma atenção insana, como se aquelas mãos pudessem desarmar um império inteiro. Ou ele próprio. — Trouxe os conceitos para a campanha. Se houver algo que o senhor não gostou… Algumas ideias exigem contexto emocional. — Disse, folheando o caderno. "Emocional." A palavra provocou algo dentro dele. Porque nada nela parecia só conceito. Havia uma naturalidade orgânica nos gestos dela, uma sensualidade inconsciente que se infiltrava por baixo da pele dele como veneno lento. Ela virou mais uma página, explicando algo sobre impacto sensorial, conexão com o cliente, liberdade... Dmitry ouvia, mas não escutava. Cada frase parecia uma metáfora involuntária para o que ela despertava nele. E então, como um acidente divino, seus dedos roçaram os dele. Por um segundo. Um toque banal. Quase imperceptível. Mas para ele, foi o equivalente a ser atravessado por um raio. "Ela nos tocou." A fera se moveu sob a pele. Os músculos de Dmitry enrijeceram. Seus olhos escureceram por um instante, o coração acelerou num ritmo irregular. Um rosnado abafado ameaçou escapar de sua garganta, mas ele conteve. Forçou o controle de volta, prendendo a respiração por alguns segundos. Ela continuou falando, alheia à tensão que deixava no rastro dos próprios movimentos. — Aqui, essa imagem sugere que dirigir um Rurik não é apenas sobre velocidade… É sobre pertencer. Sobre encontrar um lugar onde você é você mesmo. A ironia daquilo quase o fez rir. Porque, sem saber, ela havia descrito exatamente o que ele sentia ao olhar para ela. Pertencer. Ser ele mesmo. Palavras perigosas para um monstro como ele. Ela era humana. Comum, talvez até ingênua à própria força. E mesmo assim, ali estava ele, um Alfa de um clã antigo, à beira de ruir diante do toque de seus dedos. E essa fraqueza… O apavorava.