A Teia de Mentiras

— Ele não se lembra, mãe! — Brittany exclamava, os olhos faiscando. — Mas eu vi no celular dele. Estava lá... "Amor". Uma tal de Ashley ligou. E ele não lembra dela! Deve ser alguém recente... antes do acidente.

Dona Vivian, elegante apesar das contas atrasadas, bufou, cruzando os braços no sofá já gasto.

— Claro que ele não lembra, minha filha. E mesmo que lembre, você já fincou a bandeira. Agora mantenha. Não pode fraquejar.

Brittany mordiscou o lábio, pensativa.

— Ele não conta detalhes... está confuso. E se ele começar a lembrar?

— Não vai lembrar tão cedo. Enquanto isso, você se mostra a noiva atenciosa. Precisa cercá-lo, Brittany. Nosso dinheiro está no fim. Você sabe que precisamos garantir esse casamento.

A filha assentiu, decidida.

No dia seguinte, com um sorriso ensaiado e um vestido recatado, Brittany e a mãe foram visitar Philipe na casa dos pais.

Ele estava na suíte do térreo, conversando com o fisioterapeuta e um enfermeiro.

— Philipe, querido! — Brittany adentrou o cômodo com doçura artificial. — Vim ver como você está. Se quiser, posso ficar com você, te fazer companhia... posso até parar de trabalhar para cuidar de você.

Philipe ergueu o olhar, sereno mas firme.

— Não, Brittany. Você tem o seu trabalho. Já tenho dois enfermeiros e um fisioterapeuta.

Se quiser me visitar de vez em quando, tudo bem. Mas não precisa largar suas obrigações para ficar aqui.

Dona Vivian não perdeu a chance:

— Ora, Philipe, ela é sua noiva. É natural querer cuidar de você.

Philipe manteve o tom respeitoso.

— Agradeço a disposição. Mas estou na casa dos meus pais, tenho o suporte que preciso. Prefiro assim.

A tensão ficou evidente. Mas antes que o clima piorasse, a mãe de Philipe apareceu à porta com um sorriso acolhedor.

— Brittany, Vivian... já que vieram, aceitem um chá conosco. Preparei um lanche na varanda. Vamos conversar um pouco.

Brittany e a mãe se entre olharam, engolindo a frustração.

— Claro, senhora Fitzgerald. — Brittany respondeu com falsa doçura.

Brittany lançou um olhar rápido para a mãe, antes de voltar a falar, a voz carregada de falsa doçura.

— Phil... eu poderia cuidar de você com tanto carinho... É diferente de enfermeiros. Nós temos um laço... — sorriu, tentando mascarar a insistência.

Mas a reação de Philipe foi imediata.

Seus olhos se estreitaram, a voz soou firme, cortante:

— Não me chame assim.

— Mas... — Brittany tentou disfarçar o nervosismo.

— Você sabe o meu nome. Chame-me por ele. Não temos essa intimidade.

Um leve rubor subiu pelo rosto da jovem.

Vivian apertou os lábios, tensa.

Mas Philipe manteve a postura firme.

— Já disse... estou bem assistido aqui. Prefiro que você siga sua rotina. Não quero que abandone nada para ficar aqui.

Vivian interveio, a voz mais incisiva:

— Mas ele é seu noivo, Brittany! Que tipo de noiva seria você se não estivesse ao lado dele nesse momento tão delicado?

Antes que Philipe respondesse, a mãe dele, que até então acompanhava em silêncio, falou com suavidade, mas firmeza.

— Senhora Vivian, Brittany... compreendemos a preocupação. Mas aqui ele tem tudo de que precisa. E o principal agora é respeitar o espaço e o ritmo de recuperação do meu filho.

Visitas são sempre bem-vindas, mas em momentos apropriados.

Brittany forçou um sorriso amarelo.

— Claro, senhora Fitzgerald. Vamos respeitar isso.

Por dentro, fervia.

Mas ao sair do quarto, não pôde deixar de pensar na reação de Philipe.

Por que tanta aversão ao ser chamado de “Phil”?

Mal sabia ela que, naquela noite, essa palavra seria a chave que despertaria memórias ocultas no coração dele.

Enquanto se dirigiam à varanda, a mãe de Philipe observava atentamente cada gesto das visitantes, notando o brilho ganancioso no olhar de Vivian e a pressa forçada de Brittany em se afirmar noiva de um homem que, claramente, não recordava de lhe ter feito tal promessa.

A teia de mentiras estava lançada — mas o fio da verdade começava a se tensionar.