Mundo de ficçãoIniciar sessãoElena saiu do escritório com o contrato provisório nas mãos, ainda sem acreditar no que havia acontecido. Isabella caminhava ao lado dela, passos rápidos, postura rígida, como se preferisse estar em qualquer lugar do mundo, menos acompanhando a nova contratada.
— Assine aqui, aqui e aqui — disse Isabella, colocando o contrato sobre uma mesa lateral no corredor. Elena leu com atenção. As cláusulas eram claras, mas extremamente rígidas: horários fixos, vigilância de rotina, proibição de entrar em áreas determinadas da mansão sem permissão, total sigilo sobre tudo o que visse ou ouvisse. Nada além do esperado para alguém que trabalharia para um homem tão influente quanto Dominic Valenti. — É normal ter tantas regras? — Elena perguntou, levantando os olhos. Isabella sorriu, mas não havia gentileza no gesto. — O senhor Valenti não tolera imprevistos. Ele gosta de controle absoluto. “Controle absoluto.” Aquelas palavras a fizeram lembrar do passado que tentava deixar para trás. Mas Dominic, embora intenso, não parecia perigoso da mesma forma. Apenas… disciplinado. Misterioso. — Pronto, assinado — disse Elena. — Ótimo. — Isabella pegou o contrato com uma rapidez que quase arrancou o papel das mãos dela. — Vou encaminhar ao setor jurídico. E quanto às suas coisas? — Estão em uma mochila — respondeu Elena, tentando não corar de vergonha. — Apenas isso? — Isabella arqueou uma sobrancelha. — É tudo o que eu tenho no momento. A assistente a observou por alguns segundos, e pela primeira vez, houve algo além de frieza em seu olhar. Talvez pena. Talvez julgamento. — O quarto das babás fica no segundo andar, ala leste. — Isabella disse finalmente. — Vou levá-la. A ala leste era silenciosa, com paredes claras e janelas amplas que deixavam a luz entrar. O quarto destinado a Elena era simples, mas muito melhor do que ela imaginava: cama confortável, armário embutido, escrivaninha e um pequeno banheiro privativo. — O senhor Valenti não gosta de empregados circulando pela casa sem motivo — Isabella explicou, como se deixasse um alerta final. — Sua rotina começará amanhã às seis e meia. Hoje, mantenha-se no quarto ou na área das babás. — Certo. — Boa noite, senhorita Duarte. E então Isabella desapareceu corredor adentro, como uma sombra elegante. Elena se sentou na cama e respirou fundo. Pela primeira vez em semanas, sentiu uma pontada de alívio. Talvez aquele fosse, de fato, um recomeço. Talvez ela finalmente conseguisse dormir sem medo. Mas seu coração ainda batia rápido. Não apenas pela ansiedade do novo emprego… e sim pela lembrança do olhar de Dominic — firme, profundo, quase polido demais para um ser humano comum. Ela tirou da mochila suas poucas roupas, colocando-as no armário. Depois tomou um banho rápido, deixando a água quente aliviar a tensão acumulada nos ombros. Quando saiu, o relógio marcava nove da noite. Estava exausta. Deitou-se, fechou os olhos. Mas não dormiu. O que a acordou antes mesmo de dormir foi um som baixo — um choro distante. Fraco. Contido. Infantil. Liam. Elena se levantou imediatamente. O som vinha do corredor. Ela hesitou. Isabella havia sido clara: permanecer no quarto. Mas se o menino estivesse precisando de ajuda? Seu instinto falou mais alto. Ela abriu a porta devagar e seguiu o som. O quarto de Liam tinha uma pequena luz acesa. A porta estava entreaberta. Quando Elena entrou, o viu sentado no berço grande, abraçando o avião de brinquedo. As lágrimas escorriam silenciosas pelo rostinho dele. Um choro quase sem som, como se o menino tivesse aprendido a sofrer calado. Elena sentiu o coração se partir. — Liam… — ela sussurrou, aproximando-se devagar. — O que aconteceu, querido? Ele levantou os olhos, assustado no início. Depois a reconheceu… e relaxou um pouco, mas não o suficiente. Ela se ajoelhou diante dele, mantendo uma distância confortável. — Quer que eu fique aqui com você um pouquinho? O menino não respondeu, mas soltou o avião e estendeu as mãos para ela. Aquele gesto simples foi mais decisivo que qualquer palavra. Elena levantou-o do berço, segurando-o com cuidado. Ele encaixou a cabeça no ombro dela como se aquela fosse sua posição natural no mundo. Ela passou a mão devagar pelos cabelos dele. — Tudo bem… estou aqui. Ninguém vai machucar você. Liam respirava tremido, agarrado ao tecido da camiseta dela. Elena começou a balançá-lo suavemente, andando pelo quarto. — Sabe, eu também já tive noites em que senti medo… — ela disse, quase sem perceber que falava. — Mas aprendi que às vezes tudo muda quando alguém segura a gente com carinho. O menino finalmente relaxou, os olhinhos fechando aos poucos. Foi então que ela ouviu passos atrás. Ela virou rapidamente — e engoliu seco. Dominic estava parado na porta. Ele não parecia bravo. Nem surpreso. Apenas intenso — como sempre. Vestia camisa social preta, dobrada nos antebraços fortes, e estava sem gravata, o que o deixava menos rígido… porém ainda mais imponente. — Ele chorou — Elena explicou antes mesmo que ele perguntasse. — Eu… não consegui ignorar. Dominic avançou alguns passos. O olhar dele deslizou do rosto dela para o filho dormindo em seu ombro. Havia algo ali… algo vulnerável. Um contraste brutal com a postura impenetrável que ele sempre exibia. — Ele nunca deixa ninguém pegá-lo quando está assim — Dominic disse baixo. Elena não sabia se aquilo era um elogio ou um alerta. — Eu só quis ajudar. Dominic aproximou-se ainda mais. Ele parou tão perto que Elena sentiu o perfume dele — amadeirado, sofisticado, quase hipnotizante. Sentiu também a energia que emanava dele, como se ocupasse todo o espaço ao redor. — Não tem obrigação de vir quando ouvir algo — ele disse, mas a voz era baixa demais para ser repreensão. — Ainda assim… ele escolheu você. Elena olhou para Liam, dormindo profundamente. — Ele só estava triste. — Elena — Dominic chamou, e ouviu seu nome na voz dele fez algo inesperado percorrer sua espinha. — Quando você toca no meu filho, ele muda. Isso não acontece desde… — Ele parou, desviou o olhar por um segundo. — Há muito tempo. Elena sentiu um nó na garganta. — Eu fico feliz em ajudar. Dominic levantou a mão, como se fosse tocar no ombro dela, mas recuou no último instante. Era como se estivesse lutando contra algo dentro dele. — Continue assim — ele disse por fim. — Você fez mais em poucas horas do que todas as babás dos últimos meses. Elena sorriu, tímida. — Obrigada. Dominic respirou fundo e sua voz voltou a ficar firme: — Amanhã, às seis e meia, começaremos a rotina. — Ele a olhou mais uma vez, profundamente. — E Elena… não saia do quarto de Liam sem chamar alguém. Eu não quero problemas. Nem para você… nem para ele. Ela assentiu. Dominic a observou levando Liam de volta ao berço e ajeitando o cobertor com cuidado. Houve um momento — quase imperceptível — em que o bilionário a observou como se estivesse vendo algo que não sabia que precisava. Algo que ele jamais admitiria. Quando ele se virou para sair, Elena ouviu-o murmurar, quase inaudível: — Como você consegue…? Mas ele não terminou a frase. Elena voltou ao próprio quarto com o coração acelerado. Não era medo. Era a sensação estranha de que estar naquela casa não apenas mudaria sua vida… mas também abalaria alguém que não permitia ser tocado nem pelo próprio mundo. E ela… já havia tocado.






