Mundo ficciónIniciar sesiónLeonardo curvou-se diante de Lucy, a governanta que o servia há tantos anos com discrição e lealdade.
— Ela o observava com olhos marejados, segurando Sofia nos braços como se fosse sua própria neta. — A bebê dormia tranquila, ignorando o imenso vazio que se abria ao seu redor. — Cuide dela… — disse Leonardo, a voz arranhada pela dor que parecia consumir sua alma. — Contrate uma babá. — A Ellen sempre fez questão de cuidar pessoalmente da nossa filha, mas agora... agora ela precisa de alguém que a acompanhe dia e noite. — Alguém que a embale, que cante para ela… que a proteja como se fosse sua mãe. Respirou fundo, engolindo um soluço com dificuldade. — A babá precisa ter empatia, Lucy, amor, paciência nos gestos, carinho na voz. Hesitou, uma sombra de desespero cruzando seu rosto. — Mesmo que me mate... A dúvida me consome. — Ellen não queria ninguém ocupando esse lugar; ela dizia que ninguém cuidaria da nossa filha melhor que ela mesma. — Mas agora... — fechou os olhos por um instante, buscando força nas memórias. — Agora, eu preciso, que arrumei, Ellen vai entender e me perdoar... eu não consigo cuidar desse detalhe neste momento. Lucy assentiu, um nó na garganta, enquanto enxugava discretamente uma lágrima que teimava em escapar. — Pode deixar, senhor, começarei a seleção imediatamente, Sophie será bem cuidada, eu vou cuidar dela até arrumar a babá, lhe prometo. Leonardo olhou para Sofia uma última vez antes de subir. — Os olhos da bebê se abriram por um breve instante, encontraram os dele — e naquele olhar puro, iluminado pela inocência, ele viu tudo o que ainda tinha a perder se não lutasse. — Subiu os degraus em silêncio, sentindo cada passo pesar como se estivesse escalando a montanha da própria dor. Ao empurrar a porta do quarto, o aroma familiar de Ellen tomou seus sentidos como um abraço nostálgico. — A essência floral adocicada que ela usava ainda flutuava no ar, misturada com o cheiro do talco do bebê, do perfume nos travesseiros e dos cremes na penteadeira. — O roupão dela, de cetim branco com detalhes rendados, estava pendurado no gancho da porta. — Leonardo o pegou com mãos trêmulas, pressionando-o contra o rosto; ali estavam traços dela: a delicadeza, a suavidade, o calor que ele nunca mais sentiria. Chorou em silêncio, abraçado ao tecido, como se fosse o próprio corpo dela, buscando consolo nas fibras que ainda guardavam seu cheiro. — Depois, abriu o armário e acariciou os vestidos que ela adorava usar, passando os dedos pela escova de cabelo ainda com fios dourados, detentora de tantas histórias. Parou diante da foto que ficava sobre o criado-mudo. — Ellen sorria naquela imagem, um sorriso largo e despreocupado, capturado pouco antes do nascimento de Sofia. — Ele pegou a moldura com delicadeza, como se fosse um cristal, e a beijou com um carinho profundo. — Vou levar você comigo, amor, — para que esteja presente em sua última despedida. No banheiro, tomou um banho rápido, tentando controlar a tremedeira das mãos que pulsava em sincronia com sua agonia. — Vestiu-se com sobriedade, usando uma camisa preta e um terno escuro que pareciam pesar em seus ombros. — A imagem do corpo de Ellen na funerária lhe vinha em flashes dolorosos, como um pesadelo que não queria enfrentar. Quando saiu do quarto, ainda com a fotografia apertada contra o peito, parou diante da escada e respirou fundo, o coração acelerado na expectativa do que estava por vir. — Lá embaixo, Lucy o esperava com Sofia nos braços, a pequena envolvida em um cobertor suave, sua serenidade contrastando com a tempestade de emoções que consumia Leonardo. Ele desceu devagar, como se cada degrau o puxasse para baixo, e se aproximou da filha, acariciando o rosto dela com ternura, sentindo a pele macia contra os dedos. — Cuide da nossa pequena até eu voltar — sussurrou. — Beijou a testa da filha, seus olhos inflamados de tristeza e choro. — Ellen... onde quer que esteja, me guie agora. Porque eu estou perdido. Lucy engoliu em seco e disse baixinho: — Vá em paz, senhor. — Ela está orgulhosa do senhor, Sofia será bem cuidada. Leonardo saiu, sem olhar para trás, carregando o retrato da mulher que jamais esqueceria e a dor que o acompanharia por uma vida inteira. — Ele caminhou rapidamente à medida que as lágrimas se acumulavam em seus olhos, a lembrança de risadas e carinhos perdidos sendo rapidamente substituídas por um abismo de saudade. O peso da responsabilidade de ser pai e a angústia de perder Ellen se entrelaçaram em seu peito como uma serpente sufocante. — O ar parecia mais denso enquanto lutava para encontrar seu caminho no mundo que se tornara irremediavelmente escuro. — Cada passo se tornava um ato de coragem, um ímpeto de amor que o impulsionava a avançar, mesmo quando a dúvida tentava segurar seus calcanhares. Ele sabia que precisava ser forte; — por Sofia, por Ellen e por si mesmo. — O futuro se desenhava nebuloso, mas, enquanto mantivesse o retrato dela ao seu lado, uma parte de Ellen sempre permaneceria viva, guiando-o na sua jornada solitária através da dor e da perda.






