Clarice Martins Estava no lugar errado e na hora errada? Talvez, mas eu havia planejado isso. No entanto, só não planejava que os olhos verdes da senhora Armina me encontrariam atrás das árvores, assistindo ao enterro de seu filho. Prendi a respiração por influência de Laura, que o tinha feito ao meu lado, e isso me fez pensar rápido nas minhas únicas opções disponíveis: o grupo de curiosos ou permanecer ali e atrair ainda mais a atenção dos demais da família dele. Puxei o boné que tinha sobre a cabeça e o capuz que o casaco possuía. Laura fez o mesmo. Então, com um último olhar na direção em que estava sendo jogada a terra, fechei o casaco completamente para que não vissem minha barriga pequena e as conclusões certas não chegassem aos ouvidos e olhos do público intrometido. “Se ele não ficou sabendo que era o pai do meu filho, o mundo também não precisa saber.” Quase corri em direção ao portão. Entretanto, ainda sentia o peso do olhar dela — da avó do meu filho. Praticamente tiv

Clarice Martins— Tem gente que homenageia os mortos em um ser novo, como o filho. Tem outros que preferem reforçar que vão amar mais aquele que ficou, dando um nome que reflita o sentimento e que seja sentido pelo seu escolhido. Assim como Deus e os seus prometidos: Abraão, Sara, Israel, dentre outros. — Uma promessa. — murmurei com completa compreensão.Eu podia fazer uma promessa a mim mesma e, ainda assim, podia mostrar ao meu filho que ele era o meu maior tesouro do mundo, onde eu sempre o assegurasse de que ele nunca estaria sozinho todas as vezes que chamá-lo por seu nome.Meu coração pesado agora estava aquecido. Eu estaria aos prantos de agradecimento se não fosse a felicidade maior que a vontade de chorar. — O senhor é uma bênção! — agradeci sinceramente. Ele não fazia ideia do quanto havia me iluminado com aquela conversa.Ele me sorriu e acenou. “Só preciso encontrar algo que tenha uma combinação adequada.”Saí da sala renovada. Aquela era a luta que eu vinha tentando g

Clarice Martins— Devo ligar para o proprietário. — avisei, tirando o smartphone da bolsa. Enquanto isso, Laura e Ruan foram conhecer o espaço. A espera parecia que seria longa, então comecei a andar pelo local. “Isso realmente não parece algo que poderia ser pago por uma simples policial.” Escaneei o lugar por onde passava. — Olá, sou eu, Clarice Martins… — disse assim que o proprietário atendeu. — Senhorita Souza, como vai? — respondeu com animação. — Está gostando do seu apartamento? — Bem… esse é o problema… — passei a explicação da forma mais simples e clara possível. — De fato. Não posso mentir para os meus clientes, é um apartamento de luxo. Mas o preço não a assustou, e isso seria estranho, certamente. No entanto, como está vendo, o espaço sequer possui um vaso de flores… — recordei que ele falava a verdade. — A única exceção que terá é se considerar os quatro banheiros em cada quarto. Apenas isso está completo. Então, se fizer a contagem certa, perceberá que gastará mu

Clarice Martins Naquele momento eu nem me preocupava mais se ele estava finalmente vivo e dando as caras ou não. Isso não fazia diferença. Eu só queria chegar ao hospital. Respirei fundo e soltei, reclamando internamente sobre minha falta de senso: “Eu devia ter ido ao hospital assim que as dores leves começaram. Podia contar os minutos de contração no caminho.” Sabia que estava sozinha e cometi a burrice de achar que seria fácil. Senti que estava preparada novamente, então me pus em movimento, mas, antes que chegasse ao elevador, praticamente balancei entre a porta e a parede. Neste momento, me vi entrar em desespero; as bolsas caíram e me puxaram junto com elas. “Não. Eu não posso cair!” Era muito perigoso para mim e para o bebê. De repente, fui impedida de chegar ao chão por alguém segurando embaixo dos meus braços, quase como um abraço por trás. Respirei ofegante, agradecendo mentalmente a Deus por aquele ser ter ressuscitado dos mortos justo naquele dia. Quase desmanchei

Clarice Martins Uma onda de lembranças me atingiu, me deixando desnorteada assim que o bebê sumiu dos meus braços. Por apenas um momento, eu pude reviver tudo que havia passado — lembranças de antes, vívidas, capazes de acalentar ou esfaquear a alma. Ciente da razão daquela dor, eu tentei muito não ter os olhos marejados, mesmo com a alma destroçada por dentro. Aramis e eu não tínhamos vivido um romance de verdade. Pelo menos não havia chegado a virar um relacionamento. Não tinha sido mais do que dois encontros noturnos, uma visita à delegacia onde pude conhecê-lo, um encontro na estrada, uma conversa do elevador aos corredores do hospital — quase um tour — e o dia em que tentei ajudá-lo depois do seu “acidente”, que na verdade havia sido um atentado à sua vida. Se eu tivesse sido menos dura com a situação e mais receptiva, talvez tivéssemos ao menos esclarecido as coisas. — Você está bem? — a voz familiar me chamou. Damien tinha uma expressão preocupada em seu rosto. Sent