O domingo começou lento, com a luz do sol filtrando pelas janelas da casa como se até o tempo quisesse se estender mais um pouco. Evelyn acordou antes de Lucas. Observou-o dormir por alguns instantes, os traços relaxados, os lábios entreabertos, como se estivesse sonhando com alguma lembrança boa.Ela se levantou devagar, tentando não fazer barulho, e desceu até a cozinha. O cheiro de café começou a preencher o ar enquanto ela organizava a bancada, ainda vestida com a camisa dele. Cada gesto seu parecia carregado de significado: a xícara escolhida, o som da chaleira, os pés descalços no chão frio.Evelyn não se lembrava da última vez que se sentira tão... presente.Durante tanto tempo, tinha vivido como quem caminha em neblina — entre o que foi e o que poderia ter sido. Agora, cada pequeno detalhe era nítido. Concreto. Como se o mundo estivesse finalmente voltando ao foco.Ela colocou duas canecas sobre a mesa e, instintivamente, pegou o caderno. O de Benjamin.Ainda não havia termina

Naquela noite, a casa parecia respirar junto com eles. O som do vento pelas janelas entreabertas, o ranger sutil da madeira sob os passos, o murmúrio de um mundo que havia diminuído de tamanho — agora cabia em apenas dois corpos, dois corações, dois silêncios entrelaçados.Evelyn estava na cozinha, sentada à bancada com uma xícara de chá quente entre as mãos. Vestia uma camiseta larga de Lucas e meias grossas que ele tinha lhe emprestado. Havia algo de íntimo e tranquilo naquela simplicidade. Como se o tempo tivesse afrouxado o ritmo, permitindo que eles respirassem sem pressa.Lucas se aproximou com um prato nas mãos — duas fatias de torta de maçã que ele encontrara no freezer e aquecera no forno. Colocou diante dela e sentou ao lado, os joelhos se encostando de leve.— Achei que podia ser nosso jantar. — Sorriu.— Perfeito. — Evelyn respondeu, sorrindo de volta.Eles comeram em silêncio por alguns minutos, os talheres fazendo pequenos sons metálicos. Era curioso como, mesmo nos inst

As roupas de Evelyn estavam jogadas no canto do quarto do hotel, como se tivessem envelhecido junto com o silêncio que ela deixara ali. O ambiente parecia menor agora — como se, depois da casa de Lucas, tudo ali tivesse perdido o brilho. O quarto não carregava mais a sensação de refúgio, e sim de algo temporário, transitório, como se aquele espaço soubesse que o coração dela já havia partido para outro lugar.Ela se abaixou e começou a pegar as poucas roupas que havia deixado no armário. A arrumação era metódica, quase automática, mas sua mente vagava em direção a tudo que havia acontecido nos últimos dias. Cada palavra, cada toque, cada revelação ecoava com uma nitidez nova. Havia uma paz estranha nela — não a paz dos que esquecem, mas dos que enfim compreendem.Pegou a nécessaire no banheiro, olhou-se no espelho e passou um batom claro, como quem marcava uma nova fase, ainda que não dissesse isso em voz alta. Deixou a chave do quarto sobre o balcão da recepção e agradeceu à atendent

Na volta do mirante, Evelyn não dizia muita coisa. Havia algo nos olhos dela — não tristeza, mas uma espécie de reverência silenciosa. Como se aquela vista, aquele vento, aquele instante compartilhado com Lucas tivessem aberto um espaço dentro dela que precisava de tempo para ser entendido. E ele respeitou isso. Colocou uma música instrumental no carro e manteve a estrada em silêncio, acompanhando os pensamentos dela sem exigir que se transformassem em palavras.Quando chegaram à casa, já era fim de tarde. A luz dourada filtrava pelas janelas, pintando o chão de sombras quentes. Evelyn tirou os sapatos na entrada e caminhou descalça até a cozinha, onde pegou um copo d’água. Lucas ainda tirava a chave da ignição quando ouviu a voz dela, baixa, firme:— Lucas?Ele apareceu no batente da porta, os cabelos um pouco desalinhados do vento.— Sim?— Eu quero escrever sobre o Benjamin. Sobre a nossa história. Sobre… nós três. — Ela o encarou, os dedos ainda envolvendo o copo de vidro. — Quero

A manhã seguinte trouxe um céu nublado, como se o tempo acompanhasse o peso no peito de Evelyn. Ela despertou antes mesmo do alarme tocar, os olhos fixos no teto, sentindo o calor sutil do corpo de Lucas ao seu lado. Eles haviam adormecido juntos, sem promessas, sem certezas. Apenas um silêncio compartilhado que, pela primeira vez em muito tempo, não doía.Deslizou para fora da cama com cuidado, tentando não acordá-lo. Caminhou até a cozinha, onde a luz suave da manhã filtrava-se pelas janelas. O aroma de café fresco logo preencheu o ambiente, uma tentativa inconsciente de trazer normalidade ao que ainda era incerto.Enquanto a chaleira apitava, Evelyn olhou ao redor da casa. As paredes agora lhe pareciam familiares, como se tivessem absorvido as conversas sussurradas nas últimas noites, os olhares evitados, os toques ainda tímidos. Era estranho como a dor podia transformar-se em intimidade quando compartilhada.Lucas apareceu minutos depois, com os cabelos desgrenhados e o olhar sono