O sol ainda nascia tímido quando desci as escadas e encontrei Miguel já de camisa social clara, a manga dobrada até os cotovelos, e Giulia terminando o cereal com os pés balançando no ar. Ele me olhou com aquele sorriso calmo e me estendeu uma xícara de café como se fosse um gesto antigo entre nós.Estávamos nos habituando a isso — à rotina compartilhada, aos pequenos gestos.— Está pronta para enfrentar o mundo, señorita? — ele perguntou brincando, ajeitando a mochila de Giulia.— Acho que nunca estive — respondi com uma meia risada, pegando minha bolsa.O trajeto até a escola foi leve. Giulia tagarelava no banco de trás sobre a apresentação de ciências, e Miguel ria das explicações mirabolantes que ela dava sobre planetas e foguetes de papel. Tudo deveria ser perfeito.Mas não foi.Assim que estacionamos e caminhamos juntos até o portão da escola, senti. Os olhares. O cochicho abafado de mães com coques perfeitamente arrumados, roupas elegantes e saltos caros. As mesmas que um dia j

As luzes da casa ainda estavam suaves quando desci as escadas com os saltos fazendo um som leve no piso de madeira. Giulia estava na sala com Maria, já de pijama, e quando me viu, seus olhos brilharam.— Uau, Isa! Você tá igual princesa! — ela exclamou, com a voz fina e encantada.Sorri, nervosa. O vestido vermelho com decote delicado e tecido fluido me fazia sentir bonita e exposta ao mesmo tempo. Miguel entrou logo atrás de mim e entregou um beijo na testa da filha.— Vai ser uma noite rápida, meu amor. Maria vai te dar o sorvete que prometi, está bem? —Giulia assentiu, depois correu até mim e me abraçou pela cintura. Inclinei-me e retribuí o abraço com carinho.— Boa noite, minha estrelinha — sussurrei, sentindo meu peito apertar pela primeira vez ao deixá-la.Nos despedimos e seguimos até o carro. Miguel estava elegante em um terno preto sob medida, e ao abrir a porta para mim, seu olhar demorou no meu corpo com um sorriso orgulhoso.— Você vai ofuscar todas as estrelas da noite.

Estávamos entrelaçados nos lençóis como se o mundo lá fora tivesse deixado de existir. A luz suave da manhã filtrava pelas cortinas, dourando a pele de Miguel enquanto ele sorria, os olhos semicerrados, bagunçando meu cabelo com preguiça e carinho. Eu me sentia aquecida, leve. Quase como se estivesse sonhando — mas era tudo real. Miguel, seus toques, seu riso baixo, seus dedos passeando despreocupados pela minha cintura enquanto a ponta do nariz dele roçava o meu. — Isso é perigoso — murmurei, rindo ao sentir os lábios dele roçarem minha mandíbula. — Muito perigoso. — Por quê? — perguntou com um sorriso travesso. — Está com medo de se apaixonar? — Acho que esse perigo já passou — brinquei, tentando disfarçar a verdade com leveza. A verdade é que eu já estava completamente entregue. Ele me puxou ainda mais para perto, nossas pernas entrelaçadas, a respiração sincronizada. — Sabe — comecei, a voz baixa —, às vezes eu acho que não fui feita para momentos assim. Para paz. Para es

O avião havia acabado de pousar em solo francês quando senti Miguel entrelaçar os dedos nos meus. Eu olhei para ele com um sorriso discreto, tentando ignorar o aperto no peito que me acompanhava desde que saímos de Sevilha. Estávamos ali para o aniversário da avó de Giulia, e por mais que fosse uma celebração em família, o clima era outro. Bastava lembrar do telefonema da mãe de Helena para sentir minha ansiedade pulsando mais forte.Giulia estava entre nós, sonolenta, a cabeça escorada no ombro do pai. O avião taxiava pela pista e eu me obriguei a focar no essencial: proteger aquela menininha. Não importava o que viesse, eu a amava. E agora, também amava o homem que segurava minha mão com tanta firmeza.Descemos do avião particular e logo vimos o carro da família já nos esperando na pista. O motorista nos cumprimentou com um francês impecável, e Miguel respondeu no mesmo tom fluente, embora sua expressão tenha ficado mais dura ao ver quem descia do carro: os pais de Helena.— Ah, Mig

A luz suave do final da tarde entrava pelas janelas da suíte, pintando a cena diante de mim com tons dourados e cálidos. A brisa leve movia as cortinas brancas, e por um momento, senti como se o tempo tivesse desacelerado. Ali, diante de mim, estavam elas: minha filha e a mulher que, pouco a pouco, reescrevia tudo o que eu entendia sobre amor, paciência e recomeço.Isa estava sentada na beirada da banheira vazia, com uma escova na mão e um pequeno elástico de cabelo preso entre os dentes. Giulia, de pijama com estampa da Minnie, sorria e balançava os pés, enquanto a deixava pentear os fios dourados com cuidado e carinho. Os dois estavam tão envolvidos um no outro que nem perceberam minha presença na porta do banheiro.A forma como Isabella falava baixinho com minha fil