— Relaxa, não entendi nada errado. — Respondi num tom sereno, me esforçando para parecer tranquila. — Vai lá cuidar dos papéis da adoção, vou te esperar no carro.
Sam soltou um suspiro cheio de alívio e abriu um sorriso enorme.
— Fica quietinha lá, tá? Eu volto rapidinho.
Segui em direção ao estacionamento. Pelo caminho, percebi que vários membros da alcateia olhavam para mim de canto de olho e cochichavam entre si.
— Pobre coitada. Nem imagina o que está acontecendo.
— O Alfa vive vindo aqui só para ver a Lily. Falaram que eles já têm até certificado de companheiro oficial. No fim das contas, a Echo é só a amante.
Ignorei tudo aquilo, fingi que não escutava. Com os dedos tremendo, mandei uma mensagem ao meu pai, mesmo depois de tanto tempo sem falar com ele.
[Pai, estou muito cansada. Quero voltar para casa.]
Assim que cheguei, meu pai me ligou por vídeo. Cinco anos sem vê-lo e agora ele estava com muito mais cabelos brancos.
— Filha, o Sam está te tratando mal? — A voz dele saiu preocupada.
Não aguentei e chorei, a saudade mal cabendo em mim.
— Pai, que saudade de você!
Parecia que toda a discussão feia de cinco anos atrás nunca tinha existido. Naquele tempo, ele gritava comigo:
— Vai embora! Eu finjo que nunca tive filha!
Agora, só de imaginar que eu pudesse estar sofrendo, ele perdia a cabeça por mim de novo. No olhar dele havia ternura e uma preocupação sincera de pai.
— Não importa o que aconteça, você sempre vai ter um lar aqui. — Ele disse baixinho. — Amanhã mesmo mando gente ir te buscar.
Depois que a ligação acabou, passei a noite inteira sem conseguir dormir, presa no arrependimento de ter deixado minha família e na culpa por tudo que vivi desde que parti impulsivamente com Sam.
No dia seguinte, desci para tomar café e encontrei Sam e Lily tomando café com a Kitty. Os três juntos pareciam uma daquelas famílias perfeitas de revista, e eu era como se eu fosse só uma estranha invadindo o cenário alheio.
Assim que me viu, Sam se levantou, claramente nervoso para se explicar:
— A Kitty está estranhando tudo por aqui. A Lily só veio passar alguns dias, para ajudar ela a se adaptar.
Desconfiada, Kitty logo gritou:
— Quero que papai e mamãe durmam comigo toda noite!
Ela segurou as mãos deles com força, como se tivesse medo de perdê-los.
Lily sorriu para mim, meio envergonhada, a boca se contraindo num gesto simpático.
— Desculpa, Echo. A Kitty ainda não acostumou com a cama nova. Você sempre foi compreensiva, né? Não vai se importar, vai?
O rosto de Sam ficou pálido. Abriu e fechou a boca várias vezes, mas não conseguiu dizer nada que realmente contestasse.
Meu coração já estava tão machucado, mas mesmo assim doeu mais um pouco.
— Fiquem tranquilos, sério. Não ligo de jeito nenhum. Quando a criança chega num lugar novo, é até natural querer ficar com quem conhece melhor. Vamos comer alguma coisa.
Sentei à mesa, tentando forçar um clima de normalidade.
Lily puxou um pedaço de pão e me ofereceu com carinho.
— Fui eu que fiz, experimenta! Coloquei erva-doce, sei que é sua preferida. — Depois, ela ainda piscou, fazendo charme. — Foi o Sam que me contou, viu? Você tem que comer tudinho.
Peguei o pão, mas bastou uma mordida para perceber que não tinha nada de erva-doce ali.
Larguei o pedaço de pão no prato, disse com a voz trêmula de raiva:
— Não sabia que você gostava de fazer pão no capricho com erva venenosa.
Lily, do nada, começou a chorar como se tivesse sido ofendida de verdade, se fazendo de vítima.
— Echo, mesmo se não gostar, não precisava me acusar de propósito.
Sam me repreendeu, puxando o tom:
— A Lily acordou cedo só para fazer o pão para você. Como pode achar que ela te faria mal? Para com esse drama, Echo.