Sam respondeu à Lily com um tom decidido, sem hesitar:

— Fica tranquila, eu nunca deixaria ninguém levar a nossa filha embora.

Os dois estavam tão próximos e a intimidade entre eles era tão natural que, por um momento, pareciam mesmo um casal apaixonado. Eu, parada ali, me sentia como alguém de fora, uma intrusa numa história que não me pertencia.

Depois de alguns instantes, vi Sam segurar a mão de Lily e os dois subiram juntos para o segundo andar. Só então criei coragem para sair do carro e fui atrás deles, subindo devagar para o andar de cima.

Perto do escritório no fim do corredor, já tinha um grupo de funcionários reunido, todos cochichando alto o suficiente para eu ouvir.

— É aquela a criança que o Alfa Sam quer adotar? Ela se parece tanto com ele que dá até medo.

— Claro que parece, né? Aquela menina é filha dele de verdade, todo mundo sabe. Ele só inventou essa história de adoção porque era a única maneira de trazer ela para perto sem causar confusão, assim ela vira herdeira de uma vez.

— Nossa, quem será a mãe dela? Não é a Echo, né?

— Ouvi dizer que a Echo nem pode ter filho. Falaram que ela se machucou quando era pequena e ficou assim.

— Não é assim também. Dizem que a Echo aprontou muito quando era mais nova, fez um monte de aborto e por isso não consegue engravidar. Se não fosse assim, o Alfa Sam não ia ter que dar esse jeito para assumir a menina.

— Pois é. O verdadeiro amor do Alfa Sam sempre foi a Lily. Quem conhece os dois desde criança sabia que iam acabar juntos. Olha só como combinam quando estão ao lado um do outro!

Ouvir tudo aquilo era como levar facadas geladas direto no coração, uma atrás da outra.

Durante cinco anos ao lado do Sam, nunca consegui engravidar. Ele sempre dizia que não ligava para isso, que estar comigo já era o suficiente.

Agora eu via bem que ele tinha pensado em tudo, só não comigo, pois já estava decidido a adotar a filha da Lily desde o começo.

Senti o peito apertar tanto que precisei me apoiar na parede para não cair.

De repente, a porta do escritório se abriu. Sam apareceu com a Kitty no colo e, com a outra mão, segurava firme a mão de Lily. Quando nossos olhares se cruzaram, percebi o pânico no rosto do Sam.

— Oi, Echo, quanto tempo! — Disse Lily, acenando para mim com um sorriso.

Na mesma hora, Sam largou a mão dela e veio até mim.

— Echo, o que você está fazendo aqui? Não pensa besteira, por favor. — Ele se apressou em dizer, um pouco atrapalhado. — A Lily só está trabalhando aqui no orfanato, toma conta das crianças. Eu vim pela adoção da Kitty...

Ele olhou para Kitty no colo, depois me ofereceu a menina, como se quisesse mudar de assunto:

— Essa é a Kitty. Vê se não é uma fofura? Ela é educada, tranquila, a criança mais comportada do orfanato inteiro.

Assenti, tentando sorrir, e passei a mão de leve pela bochecha dela.

— Ela parece mesmo com você. Se você não tivesse explicado tudo, eu juraria que é filha de sangue.

Eu não queria, mas já estava sentindo o cheiro de Sam e Lily misturados na menininha. Não tinha mais como fingir.

Sam ainda tentou continuar explicando, mas antes que dissesse qualquer coisa, Kitty começou a chorar no colo dele.

— Me deixa segurar ela. — Lily logo apareceu ao lado, pegou a menina nos braços com tanta naturalidade que parecia ser a mãe desde sempre.

Kitty se aconchegou e murmurou baixinho:

— Mamãe...

O rosto do Sam perdeu toda a cor. Ficou claro que ele estava nervoso.

— Não se engane, Echo. — Disse ele depressa. — A Lily trabalha aqui há muito tempo, todas as crianças gostam dela e chamam de mãe. Quando concluir a adoção, converso com a Kitty e ensino ela a chamar a Lily do jeito certo.

Ver ele tentando se explicar daquele jeito só aumentou minha tristeza.

Se ele realmente se importasse comigo, por que faria tudo isso às escondidas? Por que me transformaria numa simples espectadora, alguém que sequer tinha direito de opinar? Por que insistiria em adotar uma filha que não era minha, me deixando exposta a tanta fofoca maldosa dos outros?