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[04] Trabalho no zoológico

Gustavo Delmon ✨

O sol ainda não havia alcançado o ponto mais alto do céu quando atravessei os portões de ferro do zoológico. O ar da manhã estava fresco e trazia aquele cheiro misturado de terra úmida e folhas molhadas, junto ao som dos animais despertando para o novo dia. As árvores balançavam com o vento leve, como se me recebessem em silêncio, e por um instante senti que aquele lugar tinha uma vida própria, pulsando em cada canto.

Assim que entrei, fui recebido com sorrisos e gestos acolhedores. A equipe já me esperava: veterinários, biólogos, zootecnistas e técnicos de saúde. Todos vestiam jalecos, com pranchetas nas mãos e olhos atentos. Era fácil perceber o amor que sentiam pelo que faziam, mesmo com o cansaço estampado no rosto. Havia ali um tipo de cumplicidade silenciosa, como se todos compartilhassem o mesmo propósito, o de cuidar da vida.

Apesar de não ser a primeira vez que eu visitava um zoológico, era a primeira vez que eu trabalhava dentro de um. Isso fazia tudo parecer novo, mesmo para alguém com anos de experiência. Sentia o peso da responsabilidade, mas também o prazer de estar onde sempre sonhei. Trabalhar diretamente com tantas espécies, lidar com desafios diários e ver de perto o resultado do meu esforço era o tipo de experiência que me fazia lembrar o motivo de ter escolhido essa profissão.

Minha carreira até ali havia sido longa e cheia de aprendizados. Desde os tempos da faculdade, eu me destacava por ter precisão nas cirurgias e paciência nos atendimentos. Sempre acreditei que um bom veterinário trata feridas, mas o melhor deles trata a alma do animal. Talvez por isso eu tenha conquistado tanto respeito e reconhecimento.

Já fui homenageado por universidades, elogiado em congressos e citado em revistas especializadas. Mas, mesmo com tudo isso, eu ainda tinha ambições maiores. O meu maior objetivo era conquistar o cargo de diretor técnico em manejo clínico de grandes mamíferos, uma posição que exigia mais do que conhecimento, exigia sensibilidade e coragem.

Mesmo sendo considerado um dos melhores na minha área, ainda sentia que sempre havia espaço para crescer. E esse desafio no zoológico era uma nova chance de provar a mim mesmo que eu podia chegar ainda mais longe. A ausência de Diego, meu colega de profissão e amigo de longa data, era sentida por todos. Ele era um dos veterinários mais talentosos que já conheci, especialista em cirurgias e partos. Até o retorno dele, a responsabilidade de manter tudo funcionando recaía sobre mim. Eu sabia que ele confiava plenamente no meu trabalho, e isso me dava força para seguir.

Depois da reunião inicial, onde fizemos as apresentações e dividimos as tarefas entre a equipe, o zoológico começou a se mover num ritmo acelerado. Era como observar uma grande orquestra: cada pessoa sabia exatamente o que fazer. Alguns seguiram para os recintos de alimentação, outros para os setores de observação e tratamento. O som das portas metálicas, os passos apressados e as vozes coordenadas enchiam o ar, dando a sensação de que o próprio lugar respirava junto conosco.

Enquanto eu conferia os relatórios e revisava o estado de alguns animais, não conseguia deixar de pensar em Murilo. Ele chegaria em breve, e eu estava curioso para ver como se sairia no campo. É um rapaz dedicado, com talento, e eu sabia que teria muito a aprender ali dentro. Mais do que técnica, queria que ele entendesse o valor que existe no olhar de um animal curado, no toque que transmite calma, e no respeito que temos que ter por cada vida sob nossos cuidados.

O rádio preso à minha cintura emitiu um chiado, interrompendo meus pensamentos. A voz da cuidadora soou aflita do outro lado, informando que uma das elefantas estava entrando em trabalho de parto. Imediatamente, peguei minha maleta de instrumentos e segui em direção ao setor dos grandes mamíferos. O som dos meus passos ecoava pelos corredores, misturado ao barulho dos animais.

Enquanto caminhava, pensei em tudo o que me trouxe até ali. Desde criança, sempre fui fascinado pelos animais. Eu me lembro de quando resgatava pássaros feridos ou alimentava filhotes abandonados. Nunca quis somente ser um médico. Queria ser alguém que entendesse o medo e a dor deles, alguém capaz de devolver-lhes a paz. Era isso que significava ser veterinário para mim.

Trabalhar no zoológico me permitia unir tudo o que aprendi. Além de realizar exames de rotina, diagnosticar doenças e tratar ferimentos, também estava envolvido em partos, cirurgias e planejamentos nutricionais. Criava dietas específicas para cada espécie, supervisionava programas de vacinação e pensava em medidas preventivas contra doenças. Era um trabalho complexo, mas apaixonante.

Quando cheguei ao recinto da elefanta, percebi a tensão no ar. Ela respirava com dificuldade, balançando o corpo de um lado para o outro, e os cuidadores faziam o possível para acalmá-la. Aproximei-me devagar, observando seus movimentos e o modo como seus olhos me seguiam. Havia inteligência e desespero naquele olhar.

Preparei os instrumentos e orientei a equipe com calma. Em momentos como aquele, cada gesto precisava ser preciso. Eu conseguia sentir a energia do ambiente mudar à medida que todos se concentravam. Era como se o tempo diminuísse o ritmo, como se tudo se resumisse àquela vida que estava prestes a começar.

Enquanto me posicionava para iniciar o procedimento, senti um arrepio percorrer minha pele. Era o mesmo sentimento que me acompanhava sempre que lembrava o motivo pelo qual escolhi esse caminho. A vida de um veterinário é feita de desafios diários, mas também de recompensas que não cabem em palavras. O zoológico, naquele instante, parecia refletir a minha própria trajetória: cheio de riscos, trabalho duro, mas também de momentos de beleza e significado. Eu sabia que aquele seria somente o primeiro de muitos dias intensos, e que cada um deles me aproximaria ainda mais do profissional que eu queria ser.

Nosso trabalho no zoológico vai muito além de cuidar da saúde física dos animais. Uma das nossas funções mais importantes é enriquecer o ambiente deles, criando desafios e estímulos mentais que ajudam a manter o equilíbrio emocional e o bem-estar de cada espécie. Não se trata somente de alimentar ou tratar feridas, mas de oferecer qualidade de vida. Animais que vivem em cativeiro precisam de estímulos constantes, e isso exige criatividade, paciência e um olhar atento para o comportamento de cada um.

Minha especialidade também envolve lidar com distúrbios comportamentais. Alguns animais desenvolvem comportamentos repetitivos por estresse, e cabe a mim identificar a origem desse problema e ajudar a reverter a situação. Trabalho lado a lado com os cuidadores, oferecendo treinamento e orientação, mostrando como detalhes do dia a dia podem fazer toda a diferença. Cada espécie tem sua própria forma de se expressar, e compreender esses sinais é o que separa um bom veterinário de um excelente.

Os espaços internos do zoológico são amplos e muito bem planejados. Cada área é dividida de acordo com o habitat natural das espécies, para poderem viver em um ambiente o mais próximo possível do que teriam na natureza.

A Savana Africana, por exemplo, é um dos lugares mais impressionantes. Lá ficam os grandes herbívoros, como elefantes, girafas e zebras, e também os leões, que observam tudo com aquele olhar atento e imponente.

A Floresta Tropical abriga uma variedade de animais exóticos, como macacos, aves coloridas e pequenos felinos de hábitos noturnos. O som dos pássaros e o cheiro úmido das plantas criam uma atmosfera vibrante e viva.

Os aquários são um espetáculo à parte. Ali, o reflexo das luzes na água cria um efeito quase hipnótico. Golfinhos, tartarugas e peixes de diferentes cores deslizam tranquilamente, trazendo uma sensação de paz difícil de descrever.

O Recinto de Répteis é mais silencioso, mas igualmente fascinante. Cobras, lagartos e tartarugas vivem em ambientes controlados que imitam desertos e florestas, cada um com sua temperatura e iluminação ideais.

E há também as Áreas de Interação, onde os visitantes têm contato direto com animais domesticados, como cabras, coelhos e aves menores. É uma parte que encanta as crianças e aproxima o público do trabalho que fazemos aqui.

Cada canto do zoológico é pensado com cuidado. Tudo é planejado para oferecer segurança e estímulo aos animais, ao mesmo tempo em que serve como uma grande sala de aula para o público. O objetivo é despertar a consciência sobre a importância da conservação da vida selvagem e mostrar que cada espécie tem seu valor.

Lembro-me da fazenda do meu irmão Ryan, onde eu era o responsável por todos os animais. Foi lá que aprendi a lidar com os primeiros partos, doenças e emergências. Tinha minha própria equipe, e juntos cuidávamos de dezenas de espécies diferentes. 

Quando recebi a proposta para trabalhar aqui no zoológico, precisei me afastar e deixei no meu lugar o Lipe, um dos meus melhores auxiliares. Meu irmão garantiu que ele tem se saído muito bem, mantendo tudo em ordem e seguindo exatamente o que aprendeu comigo.

Hoje, estou acompanhado por uma equipe dedicada e atenta. Todos se movem com energia e concentração, como se já soubessem que algo importante está prestes a acontecer. À minha frente está Ellie, uma elefanta africana imponente, mas visivelmente aflita. Seu corpo se move inquietamente, e suas orelhas se agitam com frequência. Ela está em trabalho de parto. O filhote pode chegar a qualquer momento, e isso exige ação imediata.

Os monitores cardíacos estão posicionados, e os sinais vitais do filhote aparecem estáveis na tela. O som do coraçãozinho ecoa ritmado, firme, trazendo um misto de ansiedade e esperança para todos nós. Cada pessoa da equipe ocupa sua posição: anestesista, auxiliares, enfermeiros e cuidadores. Tudo está pronto.

Nesse momento, escuto passos lentos se aproximando. É Antônio, meu colega e um grande amigo. Ele chega acompanhado de sua prima, que o empurra em uma cadeira de rodas. Mesmo com suas limitações físicas, Antônio nunca deixou que isso o afastasse da profissão. É um homem admirável, apaixonado pela medicina veterinária, e faz questão de participar de tudo, mesmo que somente observando.

Ele tem cabelos castanhos que tocam o alto das orelhas, olhos azuis intensos e uma barba bem cuidada. Sempre foi vaidoso, mesmo nas condições mais difíceis. Quando nossos olhares se encontram, vejo a empolgação nele. Ele está ansioso, e sei que esse parto é especial para ele.

Ele se aproxima e diz com a voz firme, mas carregada de emoção:

— Gustavo, por favor, faça de tudo para salvar o filhote e a mãe. Isso é de extrema importância para mim. Vou ficar aqui para assistir ao parto.

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