**Dias atrás…**
— Não! Não! Não levem M.G.! — gritava Rafael, meu irmãozinho, a voz dele embargada de choro e desespero. Eu só conseguia chorar também, não apenas de medo, mas de vergonha profunda. Que cena triste para ele, tão pequeno, tão inocente, e já me ver nessa situação humilhante.
— Maria Gabriel? — perguntou o policial diante de mim. Engoli seco e assenti rápido. Seja lá o que fosse, eu precisava encarar.
— Tem visitas para você.
Levantei num pulo e fui surpreendida por uma mulher que parecia saída de uma revista de moda: fina, elegante, deslumbrante. Sua presença dominava o ambiente como se a esquadra fosse passarela.
— Maria… Cristina… Gabriel! Acertei? — perguntou, saboreando cada parte do meu nome como se degustasse colheradas de chocolate derretido. Sua voz era pequena, suave, quase hipnótica.
Assenti de novo, desconfiada.
— Sente-se. — ordenou. — Tenho uma proposta… honrosa para você.
— Já viu alguma coisa honrosa numa esquadra policial? — retruquei amarga.
Ela riu baixo, tirou os óculos escuros e revelou olhos cinzentos, tempestuosos.
— Para ser sincera, tem verdade no que diz. Mas nem tudo que se encontra aqui é lixo. Como você, por exemplo. Acha-se indigna? — perguntou, e meus olhos desviaram involuntariamente dos dela.
O que ela estava insinuando?
— Estou aqui para um trato. — disse, apoiando os cotovelos na mesa e unindo as mãos sob o queixo. — Quero tirar você daqui. Em troca, trabalha para mim.
Arqueei as sobrancelhas e ri com ironia, nada contente.
— Depois que provarem minha inocência, vou embora. Não preciso da sua ajuda. — falei, me levantando.
— Você não sabe aproveitar. Qualquer um aceitaria mil vezes. Por que nega?
Aproximei meu rosto do dela e respondi firme:
— Porque eu não sou qualquer um.
Já ia sair, quando ela me atingiu em cheio:
— Mas o seu irmão é. Ele precisa de ajuda. Sei da hipoteca da casa, do risco de despejo, e da sua acusação de tráfico. Acha mesmo que um menino de sete anos aguentaria quinze anos longe da irmã?
Travei.
— Como sabe tanto da minha vida? Quem é você afinal?
— Certamente não sou um OVNI. — riu sarcástica. — Conheço bem minhas pedras raras. Alguém que gosta muito de você e do seu irmão falou de ti: Atina.
— Atina? Cadê ela? — perguntei nervosa, com vontade de chutar a cara daquela traidora.
— Lamento, mas Atina já não existe. — ergueu o celular, mostrando foto dela, linda e elegante, agora morena.
— Essa é Atina! Nem disfarçou o rosto! — exclamei.
— Hoje ela é Berian. Nossa missão não é esconder rostos, é fazê-los brilhar. O seu pode brilhar ainda mais… se aceitar.
Pegou meu queixo, avaliou meus cabelos e voltou a se sentar.
— Qual é, finúria? Eu não pedi nada disso.
— Se estivesse bem, diria *estou*, e não *tô*. Afavelada.
— Ei, calma aí, professora de português!
— Não, só quero que assine. Lá fora terá aulas, dinheiro, estabilidade.
Droga. Ela tinha razão. Estávamos por um fio, eu e Rafael. Mas e se fosse máfia?
Olhei para cima, fiz o sinal da cruz. “Óh Santa Teresinha…”
— E então? — perguntou a mulher.
— Qual seu nome mesmo?
— Irma. Irma Barreto.
— E que negócio é esse?
Ela abriu a pasta, ajeitou a caneta, e sorriu.
— Acompanhante. Você será uma das minhas acompanhantes de luxo.
— O quê? Quer que eu seja uma quenga?