Ethan Narrando Assim que estacionei o carro em frente ao condomínio da Sophie, fui direto pro interfone. Pressionei o botão com a mão suada, o coração batendo mais rápido do que deveria.— Boa tarde, portaria — atendeu uma voz masculina.— Boa tarde, aqui é Ethan Ferraz. A senhorita Sophie está?— Só um minuto, senhor. Vou verificar.O silêncio que se seguiu pareceu eterno, mesmo que não tenham se passado dois minutos inteiros. Então a resposta veio, firme e direta, como um soco no estômago.— Ela não está no apartamento, senhor. Quer deixar recado?Respirei fundo, tentando disfarçar a frustração.— Tudo bem. Obrigado.Voltei pro carro com o orgulho ferido e a mente a mil. Fiquei ali, no banco do motorista, esperando. Olhava pro prédio de tempos em tempos, na esperança de vê-la chegando. Três horas se passaram, e nada. Nenhum movimento. Nenhuma ligação. O celular dela continuava desligado, e eu não fazia ideia de qual clínica ou hospital ela poderia ter ido, se é que tinha ido mesmo.
Ethan Narrando Eu ainda tava ali, mergulhado nos meus próprios pensamentos, encarando o nada, tentando entender em que momento tudo desandou, quando ouvi duas batidinhas suaves na porta.— Senhor Ferraz? — Era a Clara, com aquele jeitinho educado e sempre cuidadoso. — O investigador chegou, posso mandá-lo entrar?Assenti com a cabeça, voltando à realidade.— Pode sim. E você já vai indo?— Sim, já deu meu horário.— Pode ir, Clara. Ela sorriu de leve e se despediu, dando passagem ao homem que entrou em seguida.O investigador entrou, me cumprimentou com um aceno rápido e se sentou na minha frente sem rodeios.— Senhor Ferraz, eu consegui acessar documentos que não foram tornados públicos — começou, abrindo uma pequena pasta e tirando de lá algumas folhas amassadas. — O laudo oficial que a polícia divulgou não é o laudo verdadeiro.Minha testa franziu na hora.— Como assim?— O laudo real, assinado antes de ser substituído, mostra que a Sra. Penélope Ferraz não estava acompanhada de
Sophie Narrando Consegui dormir um pouco, não sei dizer por quanto tempo, mas foi o suficiente pra acalmar minimamente aquela tempestade que tava dentro de mim. Acordei com um cheiro bom vindo da cozinha, alho refogado, cebola na manteiga, alguma coisa que mexeu direto na minha memória afetiva. Fiquei deitada por uns segundos, olhando pro teto, tentando lembrar onde eu tava. Quando olhei pela janela, vi que já era noite. A claridade alaranjada dos postes deixava tudo com cara de início de noite.Levantei, amarrei meu cabelo de qualquer jeito num coque bagunçado e fui até o banheiro. Lavei o rosto pra tentar despertar de vez, mas a tristeza continuava agarrada em mim como uma segunda pele. Fui andando em silêncio até a cozinha, pisando devagar, e quando cheguei na porta, lá estava ela: Lizandra. De avental, mexendo a panela, falando sozinha e dançando com a colher de pau na mão.Ela se virou e arregalou os olhos.— Ué! Já tá em casa? — disse surpresa. — Não te ouvi entrando!— Cheguei
Sophie Narrando Acompanhei o Ethan até o elevador em silêncio. Não tinha clima pra conversa, não depois de tudo, senti e engoli calada. Entrei primeiro, ele veio logo atrás. O silêncio entre nós pesava, mas não me importei. Me recostei discretamente na lateral da cabine e encarei meu reflexo nas portas de aço escovado. Ele parecia desconfortável, talvez por perceber que eu não faria nenhum esforço para aliviar o clima.Assim que entramos no carro, ele ligou o motor e, claro, tentou puxar assunto.— Sophie, eu queria esclarecer as coisas entre nós. Eu estou com saudades.Respirei fundo e virei o rosto pra ele com firmeza.— Senhor Ferraz, por favor. Se for algum assunto profissional, estou aberta a discutir. Fora isso, gostaria que o senhor respeitasse que este é o meu horário de trabalho.Falei sem levantar a voz, mas com toda a seriedade que ele precisava ouvir. Ele me olhou por um segundo, como se não esperasse por aquela resposta direta. Voltou a atenção para o trânsito sem dizer
Ethan Narrando O olhar dela me matou. Desde o momento em que entramos no elevador, Sophie manteve aquele silêncio cortante, frio, distante. Eu sentia cada centímetro da distância que ela impôs entre nós como se fosse uma barreira invisível. E, mesmo assim, lá estava ela, ao meu lado, cumprindo o trabalho com toda a competência que sempre demonstrou. Mas aquilo... aquilo não era só trabalho. Era mágoa. Era dor.No carro, tentei puxar assunto. Queria qualquer abertura para consertar as coisas, nem que fosse com meia dúzia de palavras mal colocadas. Mas, antes mesmo de eu concluir a frase, ela me cortou.— Senhor Ferraz, por favor, se for algum assunto profissional, estou aberta a discutir. Fora isso, gostaria que o senhor respeitasse. Esse é o meu horário de trabalho — disse ela, séria, sem hesitação.Fiquei em silêncio, engolindo seco. Não era a resposta que eu queria, mas era a que eu merecia. Ela estava magoada, e a culpa era minha.O silêncio voltou a preencher o carro, até que o n
Ethan Narrando O evento terminou com aquela formalidade forçada que eu já estava acostumado. Discurso daqui, elogio dali, fotos, mais fotos, e apertos de mão vazios. Mas o que realmente me incomodava era o olhar insistente de Lorenzo em cima da Sophie. Ele sequer disfarçava. Sophie estava ao meu lado o tempo todo, cumprindo seu papel com perfeição, profissional como sempre. Mas aquilo não me acalmava. Pelo contrário, me irritava ainda mais. A forma como ele a observava me fazia querer arrancar aqueles olhos do rosto dele.Seguimos para o almoço em um restaurante renomado, reservado com semanas de antecedência para essa ocasião. O tipo de lugar onde só se entra com sobrenome e conta bancária recheada. A mesa ficava em uma sala privativa com vista para a Avenida Paulista. Tudo escolhido pela minha Construtora, como sempre. Sentei na cabeceira, como devia ser. Sophie se posicionou ao meu lado direito, como deve ser. Mas Lorenzo... Lorenzo se sentou bem em frente a ela. Claro.O almoço c
Sophie Narrando Essa viagem foi uma verdadeira tortura. Como se não bastasse lidar com Ethan e seu ar controlador o tempo inteiro, ainda tive que aturar um cliente milionário da construtora — daqueles que acham que o mundo gira ao redor do próprio umbigo. Prepotente, fútil e, sinceramente, cansativo.Tudo bem, o homem chegou longe, não posso negar que inteligência ele deve ter, mas a forma como falava dava pra sentir a pitada de vaidade escondida no fundo de cada palavra. Como se estivesse mais preocupado em ser notado do que em realmente fechar negócios. E pra completar o pacote, ele ainda achou de bom tom comentar que eu "parecia mais uma modelo do que uma secretária". Olha o nível da abordagem.Não que eu esteja menosprezando modelos, longe disso. Mas nunca desejei seguir esse caminho. Sempre preferi usar o meu cérebro. Sempre me senti melhor atrás de uma mesa, coordenando, organizando, planejando. Sempre escolhi fazer meu trabalho de forma impecável, mesmo que ninguém aplaudisse.
Ethan Narrando Depois de um dia exaustivo, tudo que eu queria era um bom banho, uma dose generosa de uísque duplo e o silêncio absoluto da minha casa. Mas é claro, nada na minha vida acontece como eu planejo.Assim que virei a esquina do condomínio, lá estava o carro da Savana. Parado, como se fosse dona do lugar. Suspirei, já sentindo a dor de cabeça se formar. Emparelhei do lado e abaixei o vidro.— O que você tá fazendo aqui? — perguntei seco.— A gente precisa conversar.— Tem que ser agora? Outro dia, outra hora. Acabei de chegar de viagem. Tô um caco.Mas ela insistiu. Claro que insistiu. Sempre acha que o mundo gira em torno dela. Revirei os olhos, entrei com o carro e liberei a entrada pra ela também.Assim que desci, ela estacionou o dela. Nem esperei.— O que é tão importante assim, hein? — perguntei, já sem paciência.— Posso entrar? Tem alguém aí que eu não possa ver?Detesto esse tipo de joguinho. Não respondi nada. Só virei as costas e fui andando, ouvindo os saltos del