Ao contrário do que Lia imaginou, Carlos viu uma oportunidade no que ela falou. Imediatamente começou a relatar os termos do contrato entre as empresas e depois sobre o casamento:
— Será um casamento proforma, durará apenas um ano, que deverá ser o tempo em que decidirão o vencedor da licitação. Você terá apenas que morar na mesma casa que ele, pois será anunciado para todos o casamento de vocês e precisam manter as aparências. — Tem certeza de que ele cumprirá o contrato e os acordos? — O casamento será a garantia, você acha que suporta um ano de casamento? Lia pensou que, se tivesse liberdade de ir e vir, morar em outra casa não atrapalharia seus planos. Já tinha planejado morar separada dessa família irresponsável. Está bem, eu concordo, mas preciso conhecê-lo primeiro. Carlos abriu um grande sorriso de satisfação e logo estava se levantando e chamando Adalberto para preparar um jantar, seguiu então para o escritório e ligou para seu futuro genro, convidando para o jantar naquela mesma noite, talvez até oficializassem o noivado. Sem que ninguém percebesse, Raquel saiu de fininho e subiu as escadas para o seu quarto, deixando sua mãe conversando empolgada com Lia, sobre os preparativos do casamento. Quando entrou, trancou a porta, pegou o telefone e enviou uma mensagem: “Podemos nos encontrar?” “Sim, quando e onde?” “Agora, no mesmo lugar de sempre.” “Te espero lá.” Ela saiu escondida e foi direto para o hotelzinho de quinta em que sempre se encontrava com aquele que era para ser seu noivo, mas agora, se casaria com sua irmã. Anoiteceu e a sala de jantar estava impecável. Com os novos funcionários, tudo ficou perfeito e a casa cheirava a comida fresca e gostosa. Lia estava bem arrumada, mas sem excessos, não gostava dos modismos atuais, fosse para vestimenta, cabelos ou unhas. A campainha nem foi tocada e Adalberto já estava abrindo a porta para o convidado, que entrou no recinto, sério e sem expressar emoções. Toda a família se levantou e os olhos dele foram direto para Lia. “Que coincidência agradável, realizarei meu desejo de ter aquele Bentley sem nenhum trabalho ou sacrifício. Você vai comer na minha mão, bebê.” — Você? — Ele a olhou sorrindo. Mesmo achando o homem arrogante, tinha que reconhecer que ele era um bonito espécime. Alto, definido, elegante e muito másculo. — Boa noite, senhor, Romão Teixeira. — Lia ouviu bem quando a polícia disse seu nome. — Estou em desvantagem, não sei o seu nome... — Ele aproximou-se, sem mudar sua postura ou expressão, fingindo não ter ouvido falar sobre ela. Carlos Brandão adiantou-se para apresentar a filha: — Como vai, senhor Teixeira? Essa é minha primogênita, Lia Brandão. Então esse é o seu nome…como conseguiu um Bentley? — Foi bem direto, provocando-a. — Por favor, senhor Teixeira, sente-se. — Convidou Noêmia. Todos sentaram-se e Romão aproveitou para ficar bem em frente a Lia, que respondeu: — Não consegui, comprei! Romão trincou os dentes, odiando a mulher petulante. Ainda bem, que Raquel o avisou sobre a arrogância de sua irmã, cheia de pose e mandando em tudo. Raquel sentou-se ao lado dele, cheia de pretensões, não iria dar seu namorado de bandeja para a irmã. — Não seja indecente, Raquel, sente na poltrona. — ordenou seu pai, desfazendo seus planos. Depois de uns drinks, Adalberto avisou que o jantar estava servido e a família seguiu para a sala de jantar. Lia até se admirou com a arrumação. A sala havia voltado aos seus anos de glória. A louça era de porcelana de carrara, as taças de cristal de titânio e os talheres de prata. A toalha de linho era antiga e bordada a mão e no centro da mesa, um belo arranjo de orquídeas frescas. Mas o requinte mesmo, foi as baixelas de prata que serviram a comida, até caviar tinha na mesa. — A Lagosta está divina e esses aspargos na manteiga, perfeitos. Obrigado por esse jantar excelente. — Afinal, Esse é um jantar de noivado, senhor Teixeira, é especial, hoje estamos brindando a fusão de nossas empresas e famílias. Lia notou quando Romão olhou para sua irmã e ela abaixou os olhos, contendo o sorriso. Pensou que teria muitos problemas pela frente com aqueles dois, mas no final do jantar, ficou concluída a negociação e seu pai cuidaria do contrato. O mês passou rápido e sem nem perceber, chegou o dia do casamento. — Você está maravilhosa, filha. Terei muito orgulho de te levar ao altar. — Mas cadê o contrato, pai? Sem contrato, eu não caso. Ele fez um ar de esquecido e enfiou a mão por dentro do paletó do terno, tirando alguns papéis dobrados. Noêmia entrou agitada para avisar que estava na hora de irem. Andem logo, É normal a noiva se atrasar, mas nem tanto. Brandão abriu o contrato sobre a mesa e deu a caneta a ela para assinar, Lia procurou onde estava escrito que duraria só um ano e não precisaria dormir com ele. O pai apontou para o final da última folha e ela viu ali o prazo de um ano, mas não conseguiu continuar lendo, pois, sua mãe continuou insistindo, então seu pai abriu a última folha e ela assinou. A cerimônia Foi simples, a maioria dos amigos eram empresários que tinham negócios com as duas famílias, o noivo estava muito elegante, assim como a irmã da noiva, que resolveu também trajar um vestido branco. Lia achou o fim da picada, sua irmã parecia querer a irritar e conforme observava todo aquele cenário ao ar livre, com um caramanchão, onde foi colocado o altar para a cerimônia. Como se fosse uma grande pantomima, participou de tudo, assinou os papéis e até jogou o buquê, como se estivesse representando o papel em uma peça de teatro. O noivo mal falou com ela durante toda a cerimônia e a breve comemoração, até que a segurou pelo pulso e apenas disse: — Vamos embora! Quando chegaram ao carro, ela se surpreendeu por ser o seu Bentley e ele entrar no lugar do motorista, sem abrir a porta do passageiro para que ela entrasse. Aquele casamento estava começando de uma forma muito errada e com muita desconsideração. Por sorte, ela se preveniu e comunicou a sua advogada, assinou vários papeis para que ninguém lhe roubasse nada. Um ano passaria rápido, mas não era tola de deixar tudo que construiu à mercê de sua família ou de seu marido. — Para onde estamos indo? — Escolhi um local especial para nossa lua de mel. Você gosta de caçar? — Nunca experimentei. — Foi uma resposta inteligente, pois na verdade, ela jamais pensaria em matar algum tipo de animal, fosse grande ou pequeno. — Não se preocupe, não vamos caçar, mas ficaremos em uma cabana de caça. — Ela notou quando entraram por uma estrada de terra e depois de passarem pela última casa que era uma mansão, percorreram mais uns dois quilômetros e chegaram a uma cabana. — Chegamos, o que acha? Ninguém vai nos incomodar e é bem confortável do lado de dentro. Lia abriu a porta e desceu do carro quando percebeu que ele não iria ajudá-la. Seguiu atrás dele para a cabana, ele abriu a porta e se virou para pegá-la no colo. — Como manda a tradição. Seu pai me fez prometer que a trataria com toda a pompa e circunstância de uma noiva especial. Ela não falou nada e logo após entrar, ele a colocou no chão, Lia pode ver que realmente era uma cabana de caça, mas estava bem mobiliada e suprida de tudo o que era moderno. — Quanto tempo ficaremos aqui? — Tirei quinze dias de folga, creio que será o suficiente. — Suficiente para quê? — Como assim para quê? Está no contrato, um ano de casamento para você me dar um filho.Com a boca aberta de espanto, ela ficou parada, olhando para ele sem acreditar. — Não é isso que está no contrato, é um ano de casado e só estaremos unidos para garantir a parceria empresarial. Ele tirou de dentro do bolso interno do casaco, igual fez o seu pai, os papéis que ela assinou e mostrou-lhe na segunda folha, bem em cima. “... e neste prazo de um ano, terá que ser gerado um herdeiro.” — Não pode ser! Então Lia lembrou da correria na hora de assinar o contrato, seu pai fez de propósito e sua mãe cooperou. Deixaram para assinar no último momento para que ela não tivesse tempo de ler e conferir. Assinou confiando no seu pai e percebeu tarde demais que ele não era digno de confiança. Olhou a sua volta e avistou uma poltrona de couro, onde se jogou, totalmente derrotada por aquela traição. Lembrou-se que há duas semanas sua mãe insistiu em levá-la ao médico, mesmo ela dizendo que não havia necessidade, pois estava muito bem. A médica preencheu seu formulário, perguntou
Na casa da família Brandão, sem ter noção do que a filha passava, Carlos expulsou a rolha da garrafa de champanhe, que estourou, e todos comemoraram. — Estamos salvos. Eu sabia que aquela menina um dia iria me servir e muito. — Regozijou-se ele. — Mas era eu quem devia ter me casado com Romão. — reclamou Raquel. — Pare de ser ingrata. Sua irmã está lhe fazendo um favor, mesmo depois de você ter roubado todo o dinheiro que ela nos enviou e você ainda está reclamando? — É mãe, mas agora é ela que está se refestelando com ele, o meu homem, o meu macho que deveria estar comigo. Carlos não teve dúvida, ao ouvir a forma vulgar com que sua filha estava falando, levantou a mão e acertou seu rosto com um forte tapa. As duas mulheres ficaram horrorizadas, nunca tinham sido agredidas desta forma. — O que pensa que está fazendo, Carlos? Como se atreve a bater na cara da nossa filha? Não sabe que não se bate na cara de ninguém, principalmente de uma mulher? — Ela não é ninguém, é a
Chegando em casa, Romão viu que, sua mãe, andava de um lado para o outro na sala, perturbada com a presença de Raquel, sentada no sofá. — Que bom que você chegou, meu filho, deu tudo certo? — Claro que sim, mamãe. — Ela reclamou ou fez escândalo, como foi? Enquanto a mãe falava, Raquel levantou-se e grudou-se em seu braço, emburrada. — Foi bem mais tranquilo do que eu esperava. — olhou para Raquel. — Aliás, aproveitando que você está aqui, precisamos conversar. — Ela não só está aqui, ela se mudou para cá. Chegou com duas malas e se instalou no seu quarto. — Obrigado, mãe. Vamos para o escritório, Raquel. Ele segurou-a pelo braço. Amava-a por sua doçura e delicadeza, por sempre o apoiar sem ligar para o seu passado de Dono do morro, mas se instalar em sua casa, no seu quarto, sem pedir permissão? Foi um grande erro. Agora que ele estava casado, como o grande empresário que é, não pode deixar nenhum escândalo desse tipo vazar e atrapalhar seus negócios. Também tinha o fato
Romão ficou intrigado, não sabia no que acreditar. Uma mulher forte que se dedicou a carreira, ganhou muitos prêmios, mas deixou a família em dificuldades financeiras, não parecia muito justa. Estava indeciso. Não era um homem bom, obtinha o que queria sem pedir licença, mas gostava de se ver como justo. Desde quando liderava o contrabando e o tráfico no morro, mantinha tudo em ordem com mãos de ferro. Sempre protegeu mulheres e crianças de maldades e abusos. Agora se tornou um abusador por acreditar em uma mentira. Será que sua menina era tão descrente da competência da irmã que não acreditava em sua capacidade de conquistar sucesso profissional? — Então, sua filha é uma arquiteta profissional e ganha a vida com seus projetos? — Creio que sim. Não sei muito sobre sua vida no exterior. É impossível alguém ter tanto dinheiro só desenhando riscos num papel. — Raquel disse, entrando no escritório, despeitada e não querendo que seu namorado descobrisse a verdade. Romão a olhou sério
Romão levantou-se para sair, mas a governanta o chamou. — Senhor Ferreira, o buffet do casamento deixou aqui algumas caixas com bolo e salgadinhos, o senhor não gostaria de levar para sua esposa? Ele parou um instante para pensar e chegou à conclusão que seria uma ótima desculpa para voltar a cabana, ainda neste dia. Havia prometido que a procuraria dia sim, dia não, mas podia aparecer com uma desculpa. Queria vêla e colocar o plano de sua mãe em prática. — Prepare uma boa embalagem que vou levar para ela. Obrigada, Zuleide. Chegando à cabana, surpreendeu Lia, que estava deitada no sofá. Sentia-se apática e ainda dolorida, mas sentou-se rapidamente, percebendo que a porta da frente abriu. Havia ouvido o som do motor de seu carro, chegando, mas pensou que era ilusão de sua cabeça, já que ele prometeu voltar só no dia seguinte. Quando ele apareceu, ela olhou-o com olhos arregalados e medrosos, não suportaria mais uma sessão de sexo como a do dia anterior. — O que faz aqui
O susto e a expressão dele diziam tudo: ele não acreditava no que Raquel era capaz de fazer e fez contra os próprios pais. — Como assim, do que você está falando? Raquel não é assim. — Só depois que eu cheguei, descobri que todos os e-mails e fundos que enviei para ajudar a família, foram interceptados por Raquel. Ela apagou os e-mails e transferiu todo o dinheiro para sua conta particular. Encontrei uma situação tão caótica na casa, que precisei comprar comida ou passaríamos fome. Enquanto isso, Raquel desfilava com uma bolsa de marca da moda e joias caríssimas. — Eu dou a Raquel o que ela quer, portanto, isso não significa que ela usou o seu dinheiro. — Eu tenho provas, fui ao banco e segui o dinheiro. Mas se você quer continuar se enganando, o problema é seu. Romão não pensou duas vezes, levantou-se e saiu como um foguete, deixando Lia sozinha, saboreando o bolo do casamento. O jantar ficou totalmente esquecido. Entrando no carro, antes de ligá-lo, lembrou que o carro
Lia não quis deixar ele perceber sua mágoa e frustração com seus pais. Tudo teria sido diferente se eles tivessem contado a verdade, ela poderia até conceder seus óvulos para eles terem um filho. — Não se preocupe, cuidarei deles. Conversei com a Raquel e creio que ela vai pôr a cabeça no lugar. — Ela confessou que pegou o dinheiro ou deu uma desculpa? Para nós, ela disse que se deixasse o dinheiro na mão do papai, ele ia gastar tudo sem resolver questão nenhuma. Romão olhou para ela e lembrou que Raquel falou a mesma coisa para ele, então, era uma desculpa ensaiada, o que aumentou a desconfiança e desagrado dele. — Sim, basicamente foi isso que ela falou, mas não negou que pegou o dinheiro. Disse que o dinheiro estava em uma conta conjunta da família e todos eles podiam mexer e ela gastou com suas necessidades para que ele não gastasse de forma negligente. — É uma desculpa aceitável, já que ela não negou, tira a culpa do roubo, mas não nos leva a nada continuar com essa discuss
Cláudia foi para o corredor da ala cirúrgica e sentou para esperar a amiga sair da cirurgia e saber o que aconteceu. Não demorou muito e logo a maca passou, levando a paciente para o quarto, então foi falar com a doutora. — Como ela está, doutora? — Você é parente? — Sou a advogada responsável por ela. — Ela foi abusada, precisou levar alguns pontos, mas ficará bem. — Meu Deus, isso é terrível! — Exclamou indignada, mas não fez mais comentários, esperaria para falar com Lia, primeiro. — As leis mandam denunciar qualquer crime de abuso. Por isso, já enviamos os dados para a delegacia da mulher. Obrigada doutora, vou conversar com ela e decidir o que fazer. — Pode solicitar o prontuário e a descrição dos procedimentos, fale com a assistente social. Mas a senhora sabe qual é o procedimento legal nesses casos. — Sim, eu sei, vou contar a ela, mas será melhor esperar. Obrigada, daqui em diante é comigo. Claudia seguiu para o quarto, chegou quando tiravam a maca, entrou e encontr