Cristiano finalmente perdeu o controle da própria raiva.
Ele pegou o celular e fez uma ligação.
Do outro lado, atenderam quase imediatamente.
— Senhor Cristiano.
— Descubra agora onde estão Karine e Isabela. — Ordenou, sem rodeios.
O assistente, Samuel, hesitou por um segundo.
— Sim, senhor.
— Agora. — Cristiano rosnou.
Chovia com força. Já era tarde da noite.
O que ela estava tentando fazer?
Queimar tudo o que existia entre eles...
Isabela já tinha feito birra antes, mas nunca daquele jeito.
Naquele instante, um desconforto inexplicável surgiu no peito de Cristiano. Era uma sensação vaga, mas incômoda.
Medo.
Samuel foi rápido.
Dez minutos depois, ligou de volta.
— A senhora Isabela está no Residencial Prime, na região de Acácias.
Os olhos de Cristiano se estreitaram.
— O que ela está fazendo lá?
"Acácias."
Ele não se lembrava de nenhum amigo deles morando naquela área.
— A senhorita Karine também está lá.
Ao ouvir o nome de Karine, o rosto de Cristiano escureceu de vez.
Na cabeça dele, mulher não devia ter melhor amiga. Quando tinha, era como ganhar dez cérebros a mais.
Sempre que Isabela se juntava com Karine, nunca vinha coisa boa depois.
Quando Cristiano chegou ao Residencial Prime, Isabela, exausta depois de um dia inteiro de caos, já tinha adormecido.
Karine já havia ido embora.
Isabela se recusara a ir para a casa dela. Karine precisara voltar para organizar alguém que pudesse cuidar dela.
Isabela mal tinha conseguido pegar no sono quando o interfone começou a tocar, insistente e urgente.
O som a arrancou do sono de repente.
Ela achou que fosse Karine, que tivesse esquecido alguma coisa.
Levantou-se ainda meio sonolenta e abriu a porta.
— Esqueceu o que...
A palavra nem chegou a terminar.
Ao ver Cristiano parado ali, o rosto de Isabela escureceu na hora.
— Como você descobriu esse lugar?
O semblante dele estava frio e rígido. O terno preto tinha respingos de chuva.
— Como você acha?
Ao notar que Isabela vestia apenas um pijama, a irritação dele aumentou ainda mais.
Cristiano inclinou a cabeça e olhou para dentro do apartamento. Não viu mais ninguém.
Só então a pressão no ar ao redor dele pareceu diminuir um pouco.
— A Karine disse que você sofreu um aborto. — Disse num tom aparentemente razoável. — Eu não vir aqui te acompanhar ficaria feio, não acha?
Enquanto falava, fez o que sempre fazia.
Estendeu a mão, segurou o braço dela e tentou puxá-la para os próprios braços, num gesto automático e familiar.
Mas, desta vez, Isabela não cedeu.
Ela permaneceu parada.
E o olhar que lançou a ele estava visivelmente mais afiado do que antes.
Ao encarar aquela frieza nos olhos dela, o coração de Cristiano falhou por um instante.
Mas, no segundo seguinte, ele forçou um sorriso.
— Tá bom, tá bom... Você abortou. — Disse num tom displicente. — Eu fico aqui cuidando de você, tudo bem?
Aquela maneira relaxada, quase debochada, deixava claro o que ele realmente pensava.
A raiva que Karine tinha acabado de apaziguar voltou a explodir dentro de Isabela.
Ela ergueu o pé e chutou Cristiano com força.
Ele não esperava.
O golpe acertou o abdômen, direto.
— Porra... — Cristiano soltou um gemido abafado de dor e largou o braço dela por instinto.
Diante daquela Isabela eriçada e defensiva, como um ouriço pronto para ferir, Cristiano sentiu a cabeça latejar.
Aquilo estava começando a sair completamente do controle.
— Você já fez escândalo, já queimou um monte de coisas da casa... — Disse Cristiano, impaciente. — Ainda não descarregou essa raiva toda?
Isabela permaneceu em silêncio.
Mas o olhar dela ficava ainda mais gelado.
Descarregar?
Aquela raiva só iria cessar quando alguém virasse sacrifício.
Ela soltou uma risada baixa, sem responder.
O deboche contido naquela risada soou extremamente ofensivo aos ouvidos de Cristiano.
A cabeça dele começou a latejar.
— Tá bom, tá bom... A culpa é minha. — Cedeu, num tom cansado. — Tudo culpa minha. Agora vem comigo para casa.
Enquanto falava, ele estendeu a mão outra vez, tentando puxá-la.
Isabela deu um passo para trás, esquivando-se.
A frieza e a distância dela fizeram o rosto de Cristiano afundar de vez.
O ar ao redor parecia rarefeito.
— Aquela é a minha casa? — Isabela riu, cheia de ironia. — Minha casa com a escritura no nome da Taís?
Taís Pereira.
Irmã mais nova de Cristiano. Extremamente próxima de Lílian.
A mansão onde Isabela e Cristiano moravam depois do casamento já não estava há muito tempo no nome dela.
O imóvel pertencia legalmente a Taís.
A família Pereira nunca escondeu o desprezo por Isabela ter crescido em um orfanato.
A condição para permitir o casamento tinha sido clara. Casamento discreto, sem divulgação.
Sempre que Cristiano tentava dar a ela qualquer bem fixo, Bruna intervinha nos bastidores, retirava tudo e colocava no nome das duas filhas.
A casa onde Isabela acreditava viver como esposa já tinha sido transferida havia muito tempo para Taís.
Tudo isso para garantir que ela não tocasse em absolutamente nada da família Pereira.
— A casa está no nome da Taís. — Disse Isabela, sem elevar a voz. — E você ainda diz que aquele é o meu lar. Não acha isso ridículo?
O olhar de Cristiano vacilou por um instante.
— Então amanhã eu transfiro para o seu nome. — Respondeu, impaciente. — Pronto, resolve?
O tom deixava claro que ele já estava sem paciência.
Isabela não quis mais prolongar a conversa.
Estendeu a mão e tentou fechar a porta.
Cristiano, porém, segurou a folha da porta com força.
— Belinha. — A voz, antes suave, agora soava dura. — Até para fazer escândalo tem limite.
— E qual é esse limite? — Isabela ergueu levemente a sobrancelha.
A emoção que deveria explodir estava totalmente sob controle.
Até quando falava de Lílian, a voz dela permanecia calma.
— Você e a Lílian vivem nessa ambiguidade toda. — Disse. — E ainda quer que eu saiba me controlar?
Cristiano ficou em silêncio.
O peito dele subia e descia com força, tomado pela irritação.
— Não me coloca sempre junto com ela. — Rebateu, com raiva contida. — Eu não tenho relação nenhuma com a Lílian.
Isabela sorriu, fria.
— Em Nova Aurora inteira, todo mundo acha que, depois da morte do Marcos, você vai assumir o lugar dele. Ninguém sabe que você é casado. Ninguém sequer sabe que sua esposa se chama Isabela. — Ela o encarou diretamente. — E você ainda diz que isso não tem nada a ver com você?
Seis meses inteiros de silêncio, invisibilidade e humilhação.
Desde a morte de Marcos, Cristiano e Lílian passaram a aparecer juntos em praticamente todos os eventos.
Havia até gente insinuando que os filhos fossem de Cristiano.
Alguns rumores iam ainda mais longe. Diziam até que a morte de Marcos tinha alguma ligação com ele.
Ao ouvi-la mencionar aqueles boatos, o corpo de Cristiano enrijeceu.
— Você acredita nessas fofocas?
"Fofocas?"
Isabela olhou para ele em silêncio.
Cristiano sentiu a força com que ela empurrava a porta aumentar.
A voz dele ficou mais pesada.
— Ela está doente. — Disse. — Depressão. Você sabe disso, não sabe?
A palavra "depressão" fez o frio nos olhos de Isabela se transformar em geada.
— Claro. — Respondeu, num tom glacial. — Depressão. Por isso esse seu rosto é o melhor remédio. O calmante exclusivo dela.
Depressão.
Que desculpa perfeita.
Sempre que Lílian surtava, a primeira reação da família era ligar para Cristiano e mandá-lo ir acalmá-la.
Isabela fechou os olhos por um instante.
— Amanhã, assine o acordo de divórcio que eu vou mandar. — Disse, fria. — E cuide dela pelo resto da vida.
Que cuidasse quanto quisesse.
Aquela ligação distorcida e doentia a enojava profundamente.
Diante da indiferença dela, a paciência de Cristiano se esgotou de vez.
— Isabela!
— E mais uma coisa. — Ela abriu os olhos novamente. — Avise a Lílian para aguardar a intimação judicial.