Bela não dormiu naquela noite.Revivia o beijo em looping. O calor. A tensão. O gosto de urgência. A forma como os dedos de Pravat apertaram sua cintura como se segurassem algo prestes a escapar. Mas, acima de tudo, ela revivia a expressão dele ao se afastar — como se tivesse feito algo imperdoável. Um misto de desejo e arrependimento, como se tivesse quebrado uma promessa que não queria ter feito. Algo que ele não sabia como consertar, mas que já o consumia por dentro.Na manhã seguinte, Bela tentou seguir com a rotina. Aula de composição tradicional, um trabalho em grupo sobre harmonias folclóricas, almoço rápido no campus. Tentou se manter focada. Mas a presença dele rondava tudo — como fumaça que se infiltra pelas frestas. Cada passo, cada palavra dita pelos colegas parecia ser uma sombra distante do que realmente importava. Ela tentava desviar o pensamento, mas era impossível. Pravat estava ali, em cada canto do seu dia, sem estar fisicamente presente.Pravat não apareceu. Nem um
O sol da manhã não era tão quente, mas o peso sobre os ombros de Bela era o mesmo de uma tempestade prestes a cair. Um daqueles temporais que se anunciam em silêncio, mas que você sente no fundo do estômago, como se a pressão do ar fizesse o mundo ao redor se condensar e se tornar mais denso. Ela sabia que algo estava prestes a acontecer, uma mudança que não poderia mais ser evitada, mesmo que tentasse ignorá-la.Ela não sabia o que exatamente a havia levado até aquele ponto. Talvez tivesse sido o beijo. Ou as palavras não ditas logo depois, que se perderam naquelas horas tensas entre eles. Ou talvez fosse o modo como Pravat a fazia sentir — como se estivesse sempre no limite entre o abismo e o voo, com o olhar profundo e a presença avassaladora que ele exalava. Cada vez que ele a tocava, mesmo que fosse com um simples gesto, ela se sentia empurrada para a borda de algo maior, algo arriscado e perigoso.Agora, tudo parecia uma linha tênue entre o que ela queria e o que seria melhor pa
A cidade parecia diferente depois daquele encontro. Os mesmos caminhos que antes pareciam rotineiros agora pulsavam com uma estranha tensão, como se cada pedra do calçamento soubesse de algo que ela ainda não sabia por completo. Cada esquina, cada sombra, cada som — tudo parecia carregar o peso das palavras que ainda ecoavam na cabeça de Bela. As vozes ao seu redor se tornaram sussurros distantes, irrelevantes diante da avalanche de pensamentos que martelavam em sua mente. Ela sabia. Sabia que não podia mais ignorar os riscos, que a linha que separava o cotidiano da tempestade estava cada vez mais tênue.Mas também sabia que, ao lado de Pravat, ela não podia simplesmente se afastar. Não depois de tudo o que tinham vivido, das camadas que haviam se despido um diante do outro, revelando verdades doloridas e desejos irreprimíveis. Algo havia sido despertado — algo que não podia mais ser enterrado sob a desculpa da segurança ou do bom senso. Era mais forte do que ela, mais forte do que o
A semana seguinte foi um turbilhão de emoções e decisões. O que parecia ser uma leve esperança logo se transformava em uma carga de dor, e Bela sentia a pressão crescer a cada dia. As noites tornaram-se longas e insones, e os dias, um misto de expectativa e frustração. Cada segundo parecia carregar o peso de uma decisão não tomada, de palavras que nunca chegavam.Pravat estava diferente, mais distante. Ele tentava manter a fachada, manter a rotina e a compostura, mas o peso de sua família, da história que o aprisionava, parecia finalmente ter vencido qualquer tentativa de se manter próximo a ela. Ele a evitava, sem dizer nada, e Bela sentia um vazio crescente entre eles, uma linha tênue prestes a se romper. O sorriso que antes a fazia esquecer os problemas agora era apenas uma lembrança, e a ausência dele se tornava cada vez mais insuportável.Ela não podia negar que sentia a ausência dele de uma forma quase física. Cada mensagem sem resposta, cada olhar desviado, era como um golpe no
A noite caiu lentamente sobre a cidade, como um manto de veludo escuro que apagava os contornos dos prédios e silenciava o burburinho das ruas. As luzes amareladas dos postes piscavam tímidas, refletindo-se nas poças deixadas por uma garoa recente, como se até o céu estivesse indeciso, preso entre o choro e o alívio. Mas o pensamento de Bela estava em outro lugar — um espaço sombrio, interno, onde as sombras de suas dúvidas e medos se misturavam com os conflitos não ditos de Pravat. Ela tentava não pensar demais, mas era impossível ignorar a angústia crescente que se infiltrava como fumaça por cada brecha de sua alma.Ele estava se afastando. Ela sabia. Sentia. Não fisicamente — ainda —, mas emocionalmente. Como um fio de ligação que se parte em silêncio, um gesto que deixa de acontecer, um olhar que se evita. Como se o amor deles tivesse se tornado um fardo que ele não conseguia mais sustentar, embora ela ainda o segurasse com ambas as mãos, os dedos machucados pela insistência. Cada
O sol estava se pondo, tingindo o céu de Bangkok com tons alaranjados, vermelhos e dourados, como se o próprio universo estivesse ciente do peso das decisões que estavam por vir. O calor do dia se dissipava lentamente, mas a tensão no ar era palpável — densa, quase visível. As buzinas e o burburinho da cidade pareciam ecoar ao longe, como se o mundo estivesse em segundo plano para o que realmente importava: aquele momento.Pravat e Bela estavam sentados na varanda do apartamento dele, observando o horizonte. As luzes da cidade começavam a se acender uma a uma, refletindo no rio Chao Phraya, que serpenteava com lentidão sob as pontes e prédios antigos. A brisa leve balançava os cabelos dela, e o silêncio entre eles era menos sobre falta de palavras e mais sobre a presença esmagadora da realidade.Eles estavam mais próximos do que nunca — mais conectados em sentimentos, em propósito, em medo. Mas, como ambos sabiam, isso não significava que estivessem a salvo. O tempo parecia conspirar
A decisão de Pravat ecoou no ar, como um grito em meio a um silêncio ensurdecedor. Quando ele escolheu Bela, ele sabia que não estava apenas desafiando seu pai, mas também rompendo com um sistema que havia controlado sua vida por tempo demais. Era como quebrar as correntes de uma prisão invisível, cujas grades haviam sido forjadas com obrigações familiares, expectativas sufocantes e uma tradição que esmagava qualquer fagulha de autonomia. Mas as palavras do pai ainda ecoavam em sua mente como um trovão surdo:"Você acha que está pronto para isso?"Ele sabia que as consequências seriam dolorosas, mas naquele momento, nada mais parecia importar. Escolher Bela não era apenas um ato de amor — era uma afirmação de identidade, uma rebelião contra tudo que lhe fora imposto. Eles haviam escolhido um ao outro, e isso era o que realmente fazia sentido, mesmo que o mundo ao redor deles começasse a ruir. Ainda assim, Pravat não conseguia afastar a sensação de que uma tempestade estava prestes a c
A verdade sobre os planos de seu pai foi um golpe inesperado, devastador, como se o chão tivesse se aberto sob os pés de Pravat. Ele sempre soube que o pai era um homem ambicioso, controlador, até mesmo frio em muitos momentos… mas jamais imaginou que seria capaz de arquitetar algo tão ardiloso, tão vil. A revelação caiu sobre ele como uma avalanche, esmagando não apenas sua confiança, mas também todas as memórias que carregava da infância, todas as tentativas de compreensão, de justificativa. Aquilo que ele considerava conflitos naturais entre pai e filho agora se revelava parte de um jogo de manipulação muito mais sombrio. O choque foi um soco no estômago, uma traição que doía mais fundo do que qualquer ferida física.Durante dias, ele mal conseguiu dormir. Caminhava de um lado para o outro, como um animal enjaulado, tentando entender onde tudo havia começado a desandar. A raiva, no início, era crua, cega, como um fogo selvagem que ameaçava consumir tudo. Mas à medida que o tempo pa