Sinto o cheiro dela antes da porta abrir.
Samiel encontrou mais uma.
Quando as portas se abrem, o perfume do sangue dela invade as minhas narinas… como se me desse um soco no estômago. AB -, o único que podemos beber.
Sami entrou sorrindo, é uma conquista encontrar uma dessas, ainda mais quando nem sequer estávamos procurando.
Alguma coisa na forma como ela me olhou, ingênua demais, me irrita. Não gosto das mais puras, gosto das almas corrompidas, daquelas que se mantém no limiar, precisando só de um empurrão para se tornarem o que eu sou.
Preciso dela para alimentar o meu clã, mas não preciso ficar olhando para a sua inocência, então, empurro Zara para o lado no sofá e saí do salão de jogos.
Um instante depois, ela está na pista de dança, aproveitando o corpo de Samiel, sem fazer ideia de que ele a está oferecendo para mim. Ele precisa da minha aprovação para continuar com o plano de trazê-la para o clã.
Observá-la assim, vulnerável e ao mesmo tempo selvagem, faz minha decisão vacilar. A atração não é só pelo sangue, é pela forma como ela se move, no limite entre a provocação e a entrega voluntária.
Ela me olha nos olhos, finalmente consciente do meu olhar, e eu posso negar, posso recusar, mas não consigo. Meu corpo reage também, a pulsação acelerada não pelo sangue, mas por cada linha do corpo dela, cada curva que eu já sei que vai se encaixar perfeitamente nas minhas.
A primeira mão no quadril dela marca meu território, sem pressa. Ela não recua. Ótimo. Seu corpo responde ao meu, se moldando à minha força, obedecendo à minha vontade de forma quase instintiva. Cada contato do meu quadril com a bunda dela faz a mesma pergunta: você quer pertencer a isso agora, garotinha mortal?
E a dança se torna um teste silencioso. Em cada esfregar eu avalio e aprovo, Samiel já percebeu a minha aprovação.
E quando termina, eu sei que a minha decisão está tomada: ela tem o que é necessário. A inocência não importa mais; ela tem fogo, fome e força suficiente para entrar no clã. Não é só mais uma vítima, é potencial puro, e eu não estou resistindo à atração, como meu pai, o pai do Sami — e todos os outros caídos — não resistiram.
Então, por que ainda não a quero por perto?
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— Você o que? — pergunto a Samiel. Minha voz é baixa e sem emoção, mas por dentro, estou ardendo.
— Eu ofereci um emprego para ela aqui. — Ele diz, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
Encaro o meu vicarius, meu braço direito, sentado na minha frente, no escritório:
— Você trouxe uma estranha para dentro do clã.
— Porra, Caelith, não vamos encontrar ninguém igual a ela. Linda… sem família…
— Eu ainda não disse sim.
— Você gostou dela. Eu vi. Reagiu mais a ela do que às outras.
— Eu ainda não disse sim, Samiel — repito, agora com menos calma.
— Nós precisamos manter essa garota por perto. Não sei como ela ainda não foi reivindicada por nenhum outro clã do país. Se não formos nós, vai ser outro.
Ele pega alguma coisa do bolso e coloca sobre a mesa, o objeto faz um estalo suave contra a madeira.
Pego a munição de liga metálica com ponta de quartzo que eles usaram contra Samiel.
— Quartzo, hum? — avalio de perto a bala — eles estão ficando abusados.
Onix e ametista podem nos atrasar e doem como o inferno, eles usam essas munições quando querem impor limites. Mas elas não matam a gente.
Já o quartzo, a maldita pedra sagrada…
— Foi um aviso bem sério. Eles não querem a gente na cidade. — Sami diz.
— Em quanto tempo ela se curou? — pergunto. Isso diz muito sobre como ela reage ao nosso sangue.
Ele abre um daqueles sorrisos que fazem as humanas arrancarem as calcinhas.
— Rápido, cara. Foi muito rápido.
Aperto a base do nariz e suspiro.
— Como ela perdeu o emprego?
Cruza os braços no peito e eu sei que vem merda. Samiel sabe que eu gosto de ser discreto quando me mudo para um lugar.
— Fiz uma ligação para a pessoa certa.
— E o que você pretende fazer com uma dançarina nessa boate? Vai mudar o estilo do lugar?
Agora ele j**a o corpo para trás na cadeira de couro e ri alto.
— Ela não é dançarina, cara… Ela é contadora.
Silêncio.
Sinto minhas têmporas latejarem.
— E o que eu vou fazer com a porra de uma contadora?
Ele dá de ombros.
— Contabilidade.
— Saia, Samiel — digo, baixo, mas ele já entendeu o meu tom. — E nada de detalhes com ela até que eu diga.
Ele está certo. Ela tem tudo para ser uma victus perfeita.
E mais uma vez eu me pego pensando que não quero essa mulher por perto. Mesmo que isso não faça nenhum sentido para mim.
Que merda está acontecendo comigo?