Eu deveria estar acabada, mas estou estranhamente cheia de energia quando chego no trabalho.
Antes que possa ligar o computador na mesinha no escritório, Sabrinna, ocupa o espaço ao lado do meu, como todos os dias.
Mal deixa a bolsa sobre a sua mesa e envolve meu rosto nas suas mãos.
— Meu Deus, Lexy, você está bem? — Os olhos são preocupados, a voz acelerada.
Puxo o rosto das mãos dela e as seguro com as minhas.
— Brinna, me desculpa… eu não vi a hora passar e… teve o tiro e…
Estou tão perdida que mal consigo explicar tudo que aconteceu.
— Tiro? — agora ela parece desesperada.
Minhas mãos tremem enquanto puxo o blazer e encaro mais uma vez, a pele lisa, sem nem cicatriz.
— Eu juro que tomei um tiro no braço… de raspão, mas… — paro de falar, isso tudo parece uma loucura até para mim mesma.
— Acho que você foi drogada.
Meus ombros ficam duros.
— Drogada?
— Eu te vi dançando lá, Lexy, te vi com os donos da boate… — ela aperta as minhas mãos nas dela, que agora tremem — mas os seguranças não deixavam ninguém se aproximar de você… foi tão estranho.
Mas se eu fui drogada, foi antes de entrar, ainda na fila. Ou como poderia imaginar o tiro?
— Não fui drogada, Brinna. Acho que tem alguma coisa errada com a minha cabeça. Acho que preciso ir ao médico.
Ela me olha com olhos de pena.
Eu fui criada em um orfanato, minha amiga sabe todas as dúvidas e os medos que eu carrego em relação às minhas origens. Ela sabe que, no orfanato, me drevelaram o meu histórico: pai desconhecido. Mãe com transtornos mentais, que cometeu suicídio.
Então, Brinna não precisa ler a minha mente para entender que, neste instante, estou questionando minha própria sanidade.
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Os números do meu balancete estão colidindo com as lembranças de um certo corpo enorme tocando o meu… a respiração forte e tão masculina contra a minha orelha…
Passei quase a noite inteira com Samiel, mas são olhos de aço que estão transformando meus pensamentos em um novelo de lã embolado.
A voz da assistente de recursos humanos me tira de dentro de mim de repente. Não faço ideia do que pode querer comigo, minha conduta na empresa sempre foi exemplar.
Mas quando saio de lá, estou desolada.
Claro, a questão de perder o salário me assusta, não tenho dinheiro guardado para mais do que um mês. Mas é a sensação de inadequação que agora aperta o meu peito.
Ouvir tão diretamente que a empresa à qual você se dedica há anos já não precisa mais de você… dói.
Brinna está me encarando com olhos úmidos. Fomos eu e ela, por cinco anos, lado a lado, dia após dia.
Agora acabou.
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Eu, uma garrafa de vinho — quer dizer, um terço de garrafa de vinho — e as minhas tristezas. Assistindo “Entrevista com o Vampiro” na TV.
Levo a garrafa à boca mais uma vez e a campainha toca. Esse é o problema de morar em um prédio na beirada da rua, sem muro e sem porteiro: as pessoas simplesmente aparecem. Provavelmente, é Brinna, que veio me consolar.
Olho pelo olho mágico e… que merda é essa?
— Como você sabe onde eu moro? — pergunto, ainda com a porta trancada.
— Abra. Vim conversar — Aquela voz calma e inebriante surge como música clássica para a minha mente cansada.
— Você é algum tipo de psicopata ou o que?
— Quando você desmaiou, olhei sua carteira de motorista, para saber quem você era. Não foi difícil encontrar seu endereço depois.
Faz sentido. Tudo é fácil para os ricos.
Contra qualquer mínimo vestígio de bom senso, eu abro. Porque a voz dele me acalma… e o rosto perfeito pode me fazer esquecer esse dia.
Lá está Samiel, com um ombro forte apoiado no batente da minha porta, casual… e perfeito.
— Só abri porque tenho muitas perguntas sobre essa madrugada.
Ele sorri e o meu coração reage, ansioso.
Meu apartamento é um studio pequeno, com chão de cimento queimado e uma cama que domina quase todo o ambiente. No canto, uma cozinha mínima. Ao lado do banheiro, meu armário. Entre a cozinha e a cama, um sofá e uma mesinha de frente para a TV.
Samiel se esparrama no sofá. E eu me sento também, deixando o assento do meio vago.
— Vocês me drogaram? — minha voz falha, mas tento soar firme. — E o tiro? Eu sangrei… eu vi!
Ele nem pisca. Seu olhar é tão fixo que sinto meu estômago incomodar.
— Por que você está bebendo sozinha? — pergunta, ignorando a pergunta. — E direto da garrafa?
— Tive um dia ruim. Agora responda.
— O que houve no seu dia?
— Demitida. — Faço uma pausa. — Por que você está aqui? Eu sou uma garota comum, não faço o tipo inesquecível… ainda mais para um cara com a sua aparência. Por que vir até a minha casa?
— Eu posso te ajudar com a questão do emprego. A Nox precisa de um contador. E você ganharia muito mais do que nesse último emprego.
Balanço a cabeça, estou confusa, o vinho está me deixando tonta.
— Como você sabe o quanto eu ganhava? Espera… como sabe que eu sou contadora?
Um pânico gelado percorre as minhas costas.
Eu contei a minha vida para ele ontem? Estou tendo os mesmos surtos psicóticos que a minha mãe? O que mais aconteceu em todas aquelas horas que eu não vi passar?
— Nós dormimos juntos ontem? — Vou direto ao ponto.
Ele levanta uma sobrancelha e abre um sorriso que é pura malícia. Mas não responde.
Então, a fúria explode de dentro para fora.
— Não vou deixar que façam piada da minha vida. Se não quer me responder, vá embora da minha casa.
Tento me levantar, mas ele é mais rápido. Me puxa para o seu colo e me encaixa, com uma perna de cada lado do seu quadril.
— Ninguém te drogou… — o sussurro quente que sai da boca dele encontra a minha pele e derrete qualquer resistência que eu ainda tinha. Inspiro fundo, tentando absorver esse calor dentro de mim. — Seu tiro realmente já cicatrizou.
As mãos dele deslizam até meu quadril, possessivas, agarrando cada lado com firmeza. Então ele me move. Para frente. Para trás. Devagar no começo, só o suficiente para eu sentir cada centímetro da ereção dele pressionando contra a minha calcinha fina, no vestido curto.
— Eu estou aqui porque você não é uma garota comum… — as palavras saem cortadas, ao mesmo tempo em que aumenta o ritmo. — Não para pessoas como eu.
Minha respiração já está descompassada, meu quadril se move sozinho, buscando mais, querendo mais fricção. Os dedos dele apertam com mais força, conduzindo meus movimentos contra a dureza dele, me fazendo roçar cada vez mais fundo.
— Foi por isso que eu investiguei sua vida, seu endereço, seu trabalho… — ele continua, cada palavra dita contra minha boca, tão perto que quase é um beijo, mas não é.
Meu corpo se curva contra o dele, sentindo a rigidez latejante pressionando direto no meu ponto mais sensível.
Os movimentos agora são rápidos, frenéticos, um atrito delicioso e cruel que me deixa à beira de implorar por mais.
— E não… — ele fala entre dentes — não dormimos juntos.
Ele para. Bruscamente. Meu corpo inteiro treme, desesperado pelo que não veio.
— Quando acontecer… — a voz é de anjo, mas as palavras são puro pecado — nada vai te deixar esquecer.
Me tira de cima do colo dele, sem esforço nenhum. E vai para a porta.
— Se quiser mais respostas, te espero na Nox amanhã.
Fico sozinha no silêncio do meu apartamento, com as pernas tremendo.
Amanhã. De novo.
Se não sou louca, esses homens vão me enlouquecer.