Trisha McNa
Depois de passar mais uma noite sem dormir e sem aparecer para o almoço de domingo em família sob o pretexto de ter uma emergência no hospital a segunda-feira chega.
Quando chego no hospital vou direto para o meu consultório e começo as consultas agendadas do dia, todas elas são pós-operatórias, para alguns pacientes já dou alta do tratamento e para outros mais exames e as vezes outros procedimentos cirúrgicos.
Perto do horário do almoço alguém b**e na porta e eu libero a entrada. E lá entra ele, com seu porte imponente e lindo de morrer, o cabelo arrumado e a barba bem-feita.
– Bom dia dr Trisha.
– Bom dia dr Lorenzo, sente-se – indico com a mão e ele se senta. –Em que posso ajudá-lo?
Nossa Senhora das mulheres na seca, seu cheiro delicioso toma todo o ambiente. É... realmente faz muito tempo. Tá parei!
– Hoje pela manhã ouvi muitos burburinhos sobre algo que aconteceu na noite de sábado. – Ele começa a falar me observando atentamente, provavelmente procurando alguma demonstração de medo ou repúdio.
– Hum...– Me limito a dizer ao mesmo tempo que me recosto em minha cadeira e entrelaço os dedos no colo mostrando o quão calma estou com o assunto. – Adepto a fofocas chefe? – Não contenho ao ser irônica.
– Não. – Ele sorri. – Só gostaria de ouvir a versão dos verdadeiros envolvidos, já que escutei a mesma história de formas tão diferentes que não sei se realmente aconteceu algo ou foi um surto coletivo.
– Não pensou em procurar o outro envolvido primeiro? Afinal homens escutam homens.
– Não, a voz da experiência me fez vir aqui primeiro, quero ouvir de você. Me conte o que aconteceu doutora Trisha.
Então falei o ocorrido, só tirei o fato da minha "fama" até porque ele já deve saber, não duvido que essa foi a primeira coisa que soube de mim quando chegou, agora quanto aos novos fatos me surpreendeu o fato de ele me escutar com atenção sem me interromper nenhuma vez, só percebi ao terminar todo o meu relato que seu rosto estava mais sério do que o normal.
– Esse tipo de atitude por parte do sexo masculino é recorrente aqui nesse hospital?
– Qual? – Dou uma risada irônica e sem nenhum humor. – Ser chamada de vadia e puta mesmo nunca tendo tido nenhum relacionamento com ninguém aqui dentro? Ou ter dado qualquer tipo de abertura para que pensem assim? Sim doutor, e para você saber não se é ouvido essas coisas somente dos homens, o que torna a situação ainda pior.
– Algum motivo para isso? – Me pergunta com a testa franzida.
– É o preço de ser uma pessoa pública desde sempre, nada demais. – Dou de ombros mais uma vez respondendo da forma mais vaga que consigo.
– Pessoa pública? Non capisco. – Não basta o sotaque ele ainda tem que falar italiano e eu tenho que manter a compostura.
– Venho de uma família influente e conhecida na mídia, nada tão importante assim, pelo menos não para mim e minha família. Mas para os outros é muito. – Suspiro cansada, aparentemente ele não sabia dessa parte da minha vida. – Vai ouvir muito sobre minha pessoa pelos corredores chefe, só peço que analise cada palavra proferida para decidir o que é verdade e o que não é, e principalmente se vai acreditar ou não.
– Certo, obrigado por me contar. Vou ouvir a outra parte e tomar as devidas providências a partir daí.
– As ordens doutor. – Ele se levanta e vai até a porta, mas antes de abri-la se volta para mim.
– Você iria reportar o acontecido?
– Provavelmente não, as fofocas iam ser o suficiente para minha condenação. – Ele me olha incrédulo.
–Cazzo! Isso não seria justo. – Ele replica e me olha nos olhos.
– E quem disse que a vida é justa? – Falo e ele se vira para a porta a abrindo, mas o chamo antes que saia.
– Sim?
– Quem foi à voz da consciência? – Sorrio já sabendo a resposta.
– Elizabeth é uma boa amiga. – Ele diz e sai de vez da minha sala e só assim eu respiro fundo, agora seria mais um para me julgar junto aos outros.
Peço um sanduíche com suco para entregarem na minha sala, então depois de comer me encontro com a equipe que vai participar de uma cirurgia pré-agendada comigo. Levamos duas horas para concluí-la então adiantei algumas papeladas e no início da noite uma ruptura no apêndice de um menino de dez anos chegou na emergência, a cirurgia foi complicada pois a demora para trazer a criança para o hospital foi grande então as chances de ele ter uma septicemia, seguida de uma infecção generalizada, que pode levar ao óbito era grande.
Conseguimos fazer a cirurgia com sucesso e limpar toda a área possivelmente infectada. Foi administrado antibióticos intravenosos e agora era só esperar para ver seu pequeno corpo melhorar. A equipe estava apreensiva, os exames das próximas horas seriam cruciais.
Não cheguei a ver Beth nesse plantão, mas recebi uma mensagem me dizendo que estava tudo resolvido. Termino minha noite comendo na cantina do hospital, despois de tantas horas sem comer ou beber nada estava morrendo de fome.
Vejo o dr Dumont passar por mim com cara de poucos amigos e seguir reto. Amém, menos um problema para mim, além dele também vejo outros funcionários me olhando e claro julgando.
Em algum momento eu iria saber o que foi decidido pelo chefe e se as coisas fossem favoráveis a mim o boato de que eu provavelmente estou tendo um caso com ele já era certa.
Meus devaneios são interrompidos quando meu celular do hospital toca, eis que surge um parto prematuro e sou chamada para cuidar do bebê. Todos os dias e noites poderiam ser sempre assim cheios para minha cabeça ter paz, deixo metade da minha refeição intocada e vou para onde o dever me chama.
O parto não foi tão complicado como imaginávamos que iria ser, mas o bebê precisava de cuidados especiais e foi direto para a UTI neonatal. Quando todo o processo de tratamento terminou e eu pude respirar mais aliviada voltei correndo para o caso anterior de apendicite que de acordo com os últimos exames não havia progredido para uma infecção.
Meu plantão já estava no fim eu estava exausta, mas sabia que ao chegar em casa o sono iria vir com pesadelos, eu não estava cansada o suficiente para desmaiar e não sonhar. Os remédios ajudavam, mas não muito então eu só continuava trabalhando horas sem fim. Quando dei por mim a segunda-feira já havia virado noite de quarta-feira.
– Ei! Onde está indo? – Beth me para no corredor.
– Acabei de sair de uma cirurgia e estou indo tomar um banho e depois comer alguma coisa. – Ela me olha estranho e segura meu braço para eu não andar de novo.
– Você vai para sua casa.
– Nem vem Beth, o que vou fazer lá? Deitar e olhar para o teto? – cruzo os braços.
– Que tal dormir? Descansar. Sabe o que é isso?
– Eu dormi aqui.
– Quando? – puxo na memória e não consigo me lembrar. – Você cochilou por trinta minutos hoje de manhã deitada no meu colo.
– Viu! Eu dormi. – Lhe dou um sorriso que logo some pela expressão que ela faz, não é difícil de imaginar os motivos dos irmãos respeitarem ela, é por puro medo.
– Você está aqui desde as sete da manhã de segunda. – Ela olha seu relógio de pulso. – Agora são dez e quarenta da noite...
– Viu, nem faz tanto tempo...
– De quarta Trisha, hoje é quarta.
– Quarta? Tá de brincadeira! – Pela cara dela não era brincadeira. – Não é tão ruim assim, olha eu tenho mais uma cirurgia daqui a pouco, depois dela eu vou embora.
– Não senhora, você está cansada, vai para casa e no seu próximo turno você volta.
– Então nem preciso ir, meu plantão é hoje. – Sorrio vitoriosa, mas ela não sorri comigo apenas olha para algo atrás de mim. Me viro devagar já com um sorriso ensaiado já imaginando quem seja e bingo.
– Oi chefe! – falo dando meu melhor sorriso falso que não é retribuído.
– Oi Trisha, oi Beth. – Essa o responde com aceno de cabeça. – Se recusando a ir embora doutora?
– Não, só cumprindo meu plantão. – Me faço a desentendida.
– Esse seu plantão é diferente dos outros, dura quantas horas?
– Vinte e quatro por quarenta e oito?
– Está perguntando para mim? – ele franze a testa e Elizabeth vulgo amiga da onça disfarça uma risada colocando a mão na boca.
– Não, é esse mesmo.
– Mas se escutei bem você chegou às sete da manhã de segunda e ainda não foi embora. O que houve?
– Ah não foi nada, estava cuidando de alguns pacientes aí foram aparecendo outros e outros e eu fui ficando e ficando...
– Entendo. – Suspiro aliviada. – Pegue suas coisas e vá para casa descansar. – Ok, acabou o alívio.
– Mas...
– Mas nada senhorita. Para casa. Te vejo na sexta-feira de manhã.
– Não pode ser amanhã? Eu prometo descansar, nem precisa ser lá em casa pode ser aqui mesmo na sala de descanso.
– Niente cazzo! – Eita que o bicho ficou bravo e ainda mais sexy.
Meu Deus, preciso ir mesmo para casa já tô pensando besteira.
– Volto amanhã então. – Estendo a mão para firmar um trato que é ignorado.
– Não estou negociando doutora, sexta as seis da manhã, nem um minuto a menos. Boa noite para vocês. – Ele diz e se vai pelo corredor.
– Um belo exemplar masculino hein amiga. – Beth me cutuca com o ombro enquanto nós duas o olhamos ir embora.
– Ah, fica quieta Elizabeth, quer saber vou embora tentar dormir já que não tem outro jeito.