Trisha McNa
Acordo com os primeiros raios de sol entrando pelas janelas sem cortinas, ainda é bem cedo e como estou acostumada a dormir pouco decido me levantar logo.
Me levanto do colchão em que estou deitada da forma mais silenciosa que consigo para não acordar nenhuma das meninas e olho em volta, Hillary está jogada de qualquer jeito e eu nem sei como está se sentindo confortável nessa posição, Sophie está encolhida abraçando o travesseiro que deveria estar em sua cabeça como quisesse se proteger de algo e ocupa um pequeno espaço do seu colchão, quando olho para Elizabeth a encontro com os olhos bem abertos olhando para mim e eu já sei que fugir para o hospital será impossível, não com esses olhos escuros questionadores me olhando dessa forma, ela logo se levanta e caminhamos juntas até a cozinha.
– Fugir no dia da sua mudança? – Ela me diz parando do meu lado com as mãos na cintura.
– Eu juro que ia e voltava bem rapidinho, vocês nem iam perceber.
– Aham, sei bem esse seu rapidinho. – Ela suspira de forma cansada, como se o mundo pesasse muitos quilos em suas costas o que eu não duvido pois tudo realmente pode ser bem complicado na casa dela, todos nós temos cargas emocionais pesadas e as vezes parece que as dela são grandes demais até para ela uma mulher de muita garra e força. – Esse apartamento é um perigo para você, perto demais para o hospital. – Ela vai até a geladeira me fazendo rir e se vira para mim antes de abri-la. – O que foi?
– Não tem nada aí demente, eu vou me mudar hoje.
– Ah é. – rimos juntas e isso acabe fazendo ela relaxar. – Vou tomar um banho para despertar e depois vou na padaria que vi perto da esquina e você nada de fugir.
Concordo com a cabeça e ela se vira para o corredor e caminha tranquilamente até o banheiro, eu fico simplesmente parada no mesmo lugar me sentindo a pessoa mais injusta do mundo por pensar que meus problemas são grandes tendo como melhor amiga Elizabeth que de alguma forma consegue transformar sua vida dura com a mãe e os irmãos em algo que ela consegue lidar, algo que eu não sei se conseguiria. Não saí do lugar nem mesmo depois de ela tomar um banho, se trocar e ir comprar o café da manhã na padaria da esquina.
Saio do meu torpor e vou tomar o meu banho e me trocar também termino bem a tempo de Beth chegar com Amanda, Noah e o nosso café da manhã. Amanda não perde tempo e coloca o filho perto das dorminhocas para que ele as acorde com seus gritinhos felizes e as jogadas de corpo em cima das tias.
Hill acorda rápido e logo o pega no colo dando vários beijinhos nele o fazendo gargalhar, com todo o barulho Sophie também acorda e nos olha de forma diferente por um tempo, mas logo um sorriso aparece em seu rosto.
Fizemos o mesmo que a noite passada colocamos tudo no centro da roda de colchões e tomamos café ali em meio a risadas mesmo que a minha mente esteja longe dali agora pensando na paciente do dia anterior.
Deixo as meninas arrumando tudo e vou até onde será meu quarto e ligo para Miah, a interna que ficou com a garotinha ontem.
– Oi Miah, como foi a noite?
– Oi doutora Trisha, ela ainda está dormindo por conta dos medicamentos, mas a polícia e o conselho tutelar estão aqui, pelo que eu soube por eles o tal primo foi preso e ela passará pelos psicólogos, o doutor Lorenzo deixou tudo sob controle.
– Ok, passo por aí mais tarde para vê-la. – Respiro fundo sentindo uma angústia forte que quase se assemelha a uma dor física. – Ela é apenas uma criança para passar por tudo isso.
– É verdade, uma tristeza sem tamanho, os pais estão com ela e eles estão muito abalados também. – Uma porta b**e do outro lado da linha. – Estou passando meu plantão agora, vejo a senhora segunda.
– Está bem querida, obrigada por me manter informada, bom descanso.
Eu desligo e me sento no chão bem no canto com as costas encostada na parede, fecho os olhos já sentindo meu corpo balançar pelo choro compulsivo que me toma um choro silencioso que aprendi por necessidade.
–Você é minha noiva e tem que fazer as minhas vontades.
–Eu estou cansada Lucca tive um dia cheio, podemos só dormir juntos por favor?–Cansada de cuidar daqueles pirralhos? Eu quero e você vai dar o que quero. Agora! Aposto que para os outros médicos que você dá não faz cú doce, vai até sorrindo como a vadia que é.– Não existe mais ninguém, só estou cansada do trabalho.Me vejo prensada com o rosto contra a parede com força, minha calça e calcinha sendo arrancadas, sinto as suas partes encostadas na minha e só espero ele terminar o que quer. Depois de alguns minutos ele me solta satisfeito e sai me deixando ali com seu gozo escorrendo entre minhas pernas.Volto à realidade quando escuto alguém me chamar, me levanto rapidamente, corro até o banheiro da suíte e lavo meu rosto tirando qualquer vestígio das minhas lágrimas. Assim volto para a sala onde um monte de gente entra e sai uns com móveis, outros arrumando a comando das meninas que parecem animadas com toda a bagunça. Percebo Beth me olhando de longe com ar preocupado, mas lhe lanço um sorriso nada sincero e vou atrás de algo para fazer bem longe dela.
Em poucas horas tudo já está no seu devido lugar, as meninas já haviam ido embora e eu claramente já estava indo para o hospital. Se alguém por algum minuto pensou que eu não iria para lá assim que tivesse chance se enganou. Tranco minha porta ao mesmo tempo que escuto o elevador começar a fechar, corro e coloco a mão no sensor o fazendo abrir novamente. Dou de cara com Lorenzo meu querido chefe que me lança um lindo sorriso.
– Boa tarde doutor. – Digo entrando e ficando ao seu lado.
– Boa tarde doutora. Não me diga que é a minha nova vizinha? – o olho sem entender por um momento.
– Ah, acho que sim. Desculpe pelo barulho de hoje, mudanças tendem a ser caóticas, e com as minhas amigas me ajudando fica ainda mais.
– Tudo bem, quase nem ouvi nada, tenho um sono pesado e estava bem cansado. – As portas se abrem no térreo e saímos juntos em direção ao estacionamento. – Indo para o hospital?
– Sim e o senhor?
– Mercado. – Ele ri – Pode me chamar de Lorenzo.
– Pode me chamar de Trisha, o vejo por aí doutor, boas compras. – Aciono o alarme do meu carro e abro a porta quando ele me chama. – Sim?
– Alguma emergência no hospital?
– Não. Só não consigo ficar muito tempo em casa.
– Entendo, até mais então.
Me despeço com um aceno de cabeça e logo já estou na movimentada avenida que vai para o meu destino, chego lá em menos de dez minutos o que é uma maravilha mesmo com trânsito. Como hoje não é dia dos meus atendimentos habituais me troco e vou direto para a área do trauma. Ajudar pessoas e ocupar a mente é isso que eu quero hoje.
Entre um trauma e outro vou ver a menina de ontem e converso por bastante tempo com ela, checo todos seus exames e a faço se sentir mais confortável, converso também com seus pais que estão inconformados por não terem descoberto antes de tudo isso acontecer. O responsável pela atrocidade foi preso e seu colega que também participava também havia sido preso, iriam pegar uma boa sentença eu pessoalmente já havia conversado com Ethan sobre o caso e mesmo que não estivesse sendo tratado em sua delegacia estava ajudando a ferrar com os cretinos a terem o que merecem.
No final das contas era bom ter os amigos de volta. Eu sentia falta disso e não havia me dado conta, a noite com as meninas que não foi nada solitária como todas as outras, voltar a participar dos domingos em família sem preocupações e o medo de fazer algo que seria interpretado errado, trabalhar com meus pequenos anjos e curar seus corpinhos doentes ficando no hospital quanto tempo fosse necessário para isso.
No início da noite um acidente de carro nos traz quatro pessoas adultas e duas crianças bem assustadas. Por sorte nenhuma precisou de cirurgia, mas uma delas quebrou o braço então ajudei o ortopedista a acalmá-la e fazer o gesso. Eu não sou muito fã desse cara pois suas piadinhas de duplo sentido me irritam, mas não posso fazer nada contra isso. Saímos juntos para o corredor e ele me para puxando assunto.
– E então doutora, topa uma saidinha essa noite?
– Não, obrigada. Vou ficar por aqui hoje, quero verificar alguns pacientes e ajudar na emergência.
– Só uma cerveja e uma boa conversa, nada de mais, até porque hoje você não está de plantão não precisa ficar aqui.
– Não estou a fim dr Dumont, hoje o dia foi agitado e quero ficar aqui mesmo, trabalhar e ocupar a mente.
– Ah, sendo assim podemos dar uma passada no quarto de descanso e ocupar sua mente de forma proveitosa. – O olho irritada, o que esse ser está insinuando?
– Acho que não entendeu o que eu disse doutor, eu estou trabalhando e o senhor deveria fazer o mesmo.
– Eu já estou de saída, esse foi meu último atendimento do dia, você sabe que poderíamos aproveitar que não vamos trabalhar nessa noite de sábado e nos divertirmos juntos. Pode ser aqui, na minha casa ou na sua se preferir.
– Vá aproveitar seu sábado no raio que o parta e me deixe em paz. – Falo com raiva e ele parece se assustar.
– Que isso Trisha, só uma saidinha e uma foda sem compromisso, todos aqui sabem que você gosta de usar os homens e jogar fora.
– Como é? – Respiro fundo para não me alterar mais do que já estou, sei bem qual é a minha fama por aqui. A sem coração que deixou o noivo no altar para fugir com outro que aparentemente larguei também, deixando dois homens iludidos.
– Podemos pular a bebida e ficar só na foda, não me importo de ser usado.
Minha mão arde pelo impacto que ela faz no rosto do cretino que me olha com raiva.
– Me respeite dr Dumont, quem pensa que é para falar esse tipo de coisa para mim? Minha vida pessoal não te diz respeito e meça suas palavras ao falar comigo. – A calma já deixou meu corpo e grito sem me importar com quem está a nossa volta.
– Ah, vai se fazer de santa agora? Todo mundo sabe a puta que é. – ele grita também. – Tá se achando demais para uma qualquer.
– Faço da minha vida o que eu quero, e transar com um macho escroto que nem você não é uma delas. Fique bem longe de mim e aguarde uma advertência da diretoria por assédio.
Saio pisando duro dali, sei bem a fama que me acompanha, mas ser destratada desse jeito nunca havia sido, me recuso a chorar pois sempre vai haver homens assim. Sigo para a sala dos médicos somente para pegar minha bolsa e logo em seguida para a saída sem nem ao menos trocar de roupa e vou para minha casa, minha nova casa.
Abro a porta e vejo os poucos móveis que comprei, paredes brancas sem nenhum detalhe quase que sem vida. A cozinha já veio pronta, só acrescentei as cadeiras do balcão, mas ao entrar nela agora depois de voltar do trabalho vejo que as meninas deram uma enfeitada a mais e tinha até utensílios que eu nem sei para que servem, um bilhete na geladeira me mandando fazer compras era a certeza de que elas haviam voltado aqui. Como se eu soubesse cozinhar, fizeram isso para benefícios próprios com certeza.
O único cômodo que arrumei com algum esmero, mas nem tanto, visei o conforto mesmo foi o meu quarto, mas agora o olhando vejo que também não tem nada meu ali, nenhuma particularidade minha, apenas móveis escolhidos de qualquer jeito para servir para uma noite de sono proveitosa, ainda bem que o vendedor e as meninas não me deixaram escolher qualquer coisa porque se não ficaria ridículo. Eu adoro decorações de ambientes, me sinto feliz em deixar tudo ainda mais bonito, mas não para mim.
Não mais...