A cidade pulsava ao seu redor, mas Katherine não sentia nada. Nenhum som, nenhum ar, apenas o zumbido estático da descrença sacudindo seus ossos. Os postes de luz lançavam um brilho dourado e fraco sobre o pavimento escorregadio, refletindo a imagem distorcida e retorcida do homem que ela amava há oito anos – seu Dony – ao lado de outra mulher.
Não era o fato de estar com alguém que a paralisava. Era o modo como ele a tocava. Como sussurrava algo que ela não podia ouvir, mas já conhecia. Aqueles gestos... tão íntimos, tão dele. Com as mãos cravadas nas laterais do casaco, Katherine permaneceu imóvel, observando. As mesmas mãos que antes a acolhiam nos dias difíceis agora repousavam sobre o corpo de outra. Os mesmos lábios que prometeram eternidade agora pertenciam a um presente que não incluía mais ela. Ela quis fugir, fechar os olhos, respirar. Mas o corpo se recusava a obedecer. O mundo girava ao seu redor, e ela afundava, lentamente, na dor muda de quem compreende o fim antes mesmo das palavras. O celular vibrou em sua mão, arrancando-a de seu transe. Uma mensagem. Dony: Kate, eu sei que prometi, mas surgiu um imprevisto de trabalho. É importante, precisamos fechar isso. Me desculpe, amor. Te compenso depois. Te amo. Volto pro café da manhã. Uma risada seca escapou de sua garganta. Um som estranho, áspero, desprovido de vida. Dezoito desculpas naquele mês. Dezoito vezes ele prometera. E agora, essa. Sobre a mesa da sala, o bolo de aniversário permanecia intocado. As velas derretidas escorrendo como lágrimas. Uma metáfora perfeita para mais uma noite passada sozinha. O celular apitou novamente, notificações de redes sociais. Quase por reflexo, ela abriu os stories. Felicitações de amigos, memórias antigas. Até que o último vídeo congelou seu sangue. Uma mulher sorridente, eufórica, filmava de dentro de um hospital. A legenda era simples, mas devastadora: “Mal posso acreditar. Estamos tão felizes. Que dia!” E então, a voz dele. Ao fundo. Baixa. Familiar. Inconfundível. Katherine apertou o celular com força. Os dedos tremiam. Um gosto amargo subiu por sua garganta. A próxima imagem era ainda pior — um vulto masculino, parcialmente borrado, mas dolorosamente reconhecível. Ela não precisava ver o rosto. Conhecia os detalhes, conhecia aquelas mãos. Um baque surdo. O telefone caiu no chão. A dor veio em ondas. Um soluço, seco e sufocante, rasgou-lhe o peito. Com os dedos trêmulos, discou o único número que fazia sentido naquele momento: a mãe de Dony. O telefone tocou. Uma vez. Duas. — Katherine? — a voz do outro lado de sua sogra estava trêmula, quase um sussurro. — Não posso falar muito, estou no hospital. Houve um susto com o bebê de Ester... mas está tudo bem agora. Ela nem precisou ouvir o resto. As peças se encaixaram num estalo cruel. E então tudo ficou em silêncio, por dentro e por fora. Como se o mundo tivesse parado. Como se tudo que um dia ela foi tivesse se quebrado em mil pedaços. Algumas pessoas se chocam e criam universos. Outras se quebram no impacto. E naquela noite, Katherine Morgan era só ruínas.