SILVÂNIA EM VIDA

Era noite quando Silvânia resolveu ir até a janela para observar o que acontecia na rua — hábito que jamais abandonara. Assim que afastou a cortina, viu o vizinho chegando com uma mulher desconhecida. Como a esposa dele estava na praia, Silvânia imediatamente imaginou tratar-se de uma amante. Curiosa e sempre pronta para uma boa maledicência, decidiu “confirmar”.

Desceu até a porta, abriu-a com teatralidade e chamou o vizinho pelo nome.

— Quem é a moça? — perguntou, com ar inquisidor.

O vizinho respondeu com calma:

— Minha irmã, Mariana.

E, virando-se para a jovem, acrescentou:

— Esta é a vizinha aqui do lado, Silvânia.

A mulher ficou sem graça ao perceber que a moça linda que ela já estava julgando era, na verdade, irmã do homem. Ainda assim, insistiu:

— E de onde veio a moça?

O vizinho explicou que Mariana viera da capital para visitá-lo e, principalmente, para iniciar um tratamento de saúde. Como a quimioterapia é um procedimento bastante invasivo, ela precisaria de alguém que cuidasse dela após as sessões — e ele era a única família viva que a jovem tinha.

Silvânia voltou para casa desconcertada e desconfiada. Encontrou o marido na cozinha e despejou a novidade:

— O vizinho chegou tarde com uma jovem bonita dizendo que era a irmã dele!

O marido, com paciência, respondeu:

— Eu já sabia. Ele comentou comigo outro dia que a irmã chegaria esta semana. Ela tem câncer e veio fazer tratamento. Ele precisa cuidar dela depois das sessões.

Sem ter o que rebater, Silvânia deixou de lado aquela suspeita e direcionou a atenção para um novo barulho que acabara de ouvir. Outro carro chegava, seguido de um estrondo terrível. Assustada, correu novamente até a janela e viu que o carro havia batido no muro perto de sua casa.

Como era a fofoqueira oficial da rua, não perdeu tempo e correu até o local. Ao se aproximar, percebeu que havia uma pessoa morta dentro do veículo. Rapidamente chamou o Corpo de Bombeiros para o socorro e a identificação.

A madrugada se arrastou entre idas e vindas de bombeiros e policiais. Silvânia, que não pregou os olhos, voltou para casa exausta, comeu algo e tomou um café enquanto esperava notícias — ainda não sabiam quem estava no carro.

Quando o dia amanheceu e os vizinhos começaram a abrir suas portas, uma das moradoras avistou o carro destruído e começou a gritar desesperadamente. Correu em direção ao veículo, e logo se descobriu que o corpo preso às ferragens era o de seu filho.

Silvânia, escutando os gritos, correu para fora.

— O que aconteceu? — perguntou à vizinha, tentando parecer prestativa.

A mulher, chorando, respondeu:

— É o meu filho… ele está ali dentro…

Foi só então que Silvânia se deu conta de quem era a vítima fatal. Ela, que vira tudo desde o início, resolveu sair de fininho, constrangida por ter acompanhado a madrugada inteira sem perceber que o acidentado era alguém tão próximo.

Toda a Vila entrou em comoção — a morte do rapaz abalou profundamente a comunidade.

Enquanto isso, o marido de Silvânia preparou o próprio café, desejou-lhe bom dia e saiu para o trabalho. Assim que o sol estava alto, Silvânia achou apropriado ligar para a vizinha que estava na praia — a esposa do homem que havia chegado com Mariana na noite anterior.

Com a voz cheia de falsa preocupação, perguntou sobre a viagem, comentou a tragédia da morte do rapaz e, é claro, aproveitou para dizer:

— Ah, e ontem teu marido chegou com uma moça muito bonita…

A vizinha suspirou, profundamente consternada pela notícia da morte do garoto, mas respondeu com firmeza:

— A moça é minha cunhada. Ela chegou ontem mesmo. Veio para fazer tratamento de câncer, e meu marido vai cuidar dela.

Silvânia desligou decepcionada. Duas oportunidades de fofoca, duas frustrações. Nenhuma briga para assistir, nenhum escândalo para espalhar.

Naquela manhã, percebeu que não tinha novidade alguma para contar — para ela, talvez, a pior tragédia do dia.

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