Capítulo 5

Chegando à casa dele, um apartamento pequeno num bloco no bairro de Laksevåg, Martin a ajudou a tirar o casaco e o pendurou, depois a ajudou a retirar o salto, pegou a bolsa de mão dela, eram essas pequenas atitudes que a fascinavam em um homem. Ele mostrou seu pequeno apartamento a ela, da entrada era possível ver o banheiro, um corredor curto levava a um quarto, o de Magnus, a cozinha ficava de frente a esse quarto, e de frente ao corredor se via a porta da sala.

Os dois ficaram na sala conversando em um sofá pequeno, de couro e que tinha apenas três assentos. Ele sempre muito educado, pedindo desculpas pela bagunça, que estava fora, no mar, que não esperava trazer ninguém em sua casa. Os dois seguiram conversando e após algumas horas estavam cozinhando juntos e arrumando um pouco a casa. Rindo e falando bobagens o tempo todo. Toda vez que passavam um pelo outro na sala se abraçavam um instante. Colocaram um filme e foi ficando tarde, ambos cansados do dia, com sono, Anya até gostaria de ter dormido lá, naquela cama larga, naquele quarto convidativo que estava situado na sala, com portas corrediças largas e brancas, onde sentada no sofá se via quase todo o quarto.

Começaram a se despedir, mas dava para se notar que nenhum dos dois queria de fato que ela fosse. Não aconteceu absolutamente nada entre eles esse dia. Depois de tanto fogo, tanto desespero em possuir um ao outro, os dois, quando tiveram a chance de fazer tudo o que queriam, conversaram bastante e ela foi embora para sua casa.

Ele não era do tipo que tomava iniciativa quando se tratava de seduzir uma mulher para conseguir uma noite de sexo. Ela era muito aberta e espontânea, mas não queria que ele pensasse que ela dormia com um homem no primeiro encontro.

11 de julho de 2016

Os dois se encontraram de novo. Depois de terem conversado muito na internet, dessa vez mais frequentemente, e no meio de tantos assuntos diferentes que Anya foi capaz de encontrar em cada diálogo entre os dois, resolveram procurar uma viagem para fora do país. Ele falava que queria sair um pouco de Bergen, que trabalhava muito, estava cansado e queria vivenciar outras culturas, respirar outros ares. Ela também precisava de uma viagem após tanto tempo só estudando e trabalhando, e para esquecer o que realmente estava consumindo seus nervos, a lembrança da violência que tinha sofrido, e toda vez que olhava no espelho ali estava ela, a cicatriz na sobrancelha. Martin falava que ainda bem que ela era enfermeira, pois saberia cuidar de seu machucado, ele já havia visto a troca de curativos, viu os seis pontos costurados, disse a ela:

— Não vai ficar feio, Anja. Nem vai dar pra notar. Você vai continuar linda!

A mulher adorava os elogios que ele fazia, mesmo que não fosse de conversar muito, mas de vez em quando fazia um elogio a ela.

Qual mulher não gosta?

Os dois procuraram horas por uma viagem que desse certo para os dois. Ele queria uma viagem que tivesse voo direto, não queria ficar em aeroportos esperando, enquanto ela queria um voo barato, mesmo que ficasse algumas horas esperando. Ela propôs que viajassem para Lagos, que ficava uma hora de carro do aeroporto de Faro, em Portugal. Explicou que os dois poderiam ficar no apartamento de sua amiga Mikeli, assim não precisariam gastar tanto com hotel e restaurantes. O investimento seria somente com as passagens, ela até sugeriu que os dois poderiam fazer comida em casa. A proposta dela era para que saíssem um pouco de Bergen e se conhecessem melhor.

Eles foram adiando esses planos impulsivos, pois ela até tinha dinheiro para viajar, mas nas condições dela, que poderia pagar por seus bilhetes aéreos, uma estadia na casa de sua amiga, por 12 dias, mas nada de luxo, como passagens super caras ou hospedagem em hotéis de luxo, isso Martin não conseguia entender, e muito menos se predispunha a pagar, o que seria lógico já que as exigências eram dele.

O problema foi que as vezes que Anya tentou estabelecer um diálogo entre eles, Martin se mostrava desconfortável, mas apenas quando o assunto era dinheiro, ou um relacionamento futuro. Várias vezes Anya se sentiu inferior por ele comentar que as norueguesas tinham seu próprio dinheiro e não era normal um homem pagar algo para uma mulher só porque estavam saindo juntos. Anya ficava desconcertada, muitas vezes ela não contava sobre um problema financeiro, sobre uma conta, ou que naquela semana ela não poderia extrapolar nos gastos, para que ele se oferecesse para pagar. Ela contava por que ela era assim, essa era a personalidade dela. Ela explicou inúmeras vezes que aquele era o seu jeito, com todo mundo, com as amigas, com os amigos, com todos, mas ele sempre ficava muito sério e aborrecido se eles tinham esse tipo de conversa, e Anya ficava sem saber como lidar com aquilo.

Então era melhor não falar sobre isso. Desistiram da viagem e os dias foram passando, eles trocaram telefone finalmente e até já estavam se ligando.

Capítulo 6

15 de julho, 18:15

O

s dois estavam se encontrando mais frequentemente, fazendo trilhas que começavam da montanha de Løvbakken até o centro de Bergen, na montanha de Fløyen. Dessa vez eles foram à montanha mais próxima à casa dele, a trilha que seguiram começava atrás do prédio onde ele morava. Ela estava engraçada vestida nas roupas militares masculinas de treino dele. Eles correram, treinaram, brincaram, falaram coisas obscenas como passatempo. Eram visivelmente felizes e satisfeitos com a companhia um do outro. Ele a forçava a testar sua resistência, às vezes queria que ela pudesse subir uma montanha correndo tão rápido quanto ele, mas como Anya não o fazia, ele mostrava um pouco de desapontamento. Nesses momentos, ela falava que Martin poderia subir correndo que mais cedo ou mais tarde ela chegaria ao topo.

Ela queria que o namorado entendesse que estava tudo bem para ela, mas isso, a espera por ela, o deixava meio aborrecido, não falava nada, mas deixava claro que não a considerava uma esportista, que talvez ela não fosse a mulher ideal que procurava. Esse era o pensamento dele.

Chegando no topo da montanha Martin tirou de sua mochila duas xícaras de madeira, usadas em acampamentos, tirou uma garrafa térmica, com água quente, um minipote do café preferido dela, Nescafé Gold Médio, e o adoçante que ela usava. Pôs um tapete de piquenique, na grama, encostado a uma rocha onde poderiam se apoiar e descansar da longa subida, uma barra de cereal para cada e frutas. Ela ficou tão maravilhada com aquele gesto que o olhou de maneira diferente. Aquilo mexeu com ela. Os homens não entendiam a importância desses pequenos gestos, afinal, não era por ter levado tudo aquilo para um piquenique nas montanhas. Eram os detalhes, o cuidado.

Esse foi o erro número 2. Se apegar aos detalhes.

Ele estava dificultando para ela. Como resistir? Como viver um sonho sem se deixar levar por ele. Como poder ter tudo aquilo, mas não se deixar fascinar, nem se envolver, nem fazer planos, nem esperar nada?

Martin a olhava dentro dos olhos como se ela fosse a única que existisse. Anya conseguia se ver dentro daqueles olhos azuis. O que fazer? Qualquer passo em falso poderia afastá-lo, já que o homem corria do amor e de relacionamentos, como quem corria da forca, da guilhotina.

Não queria se machucar, por isso preferia não amar. De tanto repetir isso Anya entendeu e respeitava as vontades e opiniões dele, mas era difícil se relacionar com uma pessoa sem se envolver. Como poderia fazer isso?

Capítulo 7

16 de julho de 2016

O

 relacionamento progredia como tinha que ser, nesse dia resolveram sair para uma festa latina, Martin tinha curiosidade de conhecer outras culturas de perto, tudo que já tinha ouvido falar sobre o ritmo latino era a sensualidade e o quanto muitos noruegueses gostavam dessas festas. Eles se encontraram no Tonga Bar, um lugar latino que recebia noruegueses e estrangeiros de todo tipo que gostavam de dançar reggaeton, bachata, funk, axé, kizomba, não só ritmos quentes da América Latina e África eram tocados lá, mas tudo o que fizesse sucesso no momento.

Naquela noite Anya se preparou com capricho, colocou um vestido rosa-nude, colado no corpo, com alças largas e um pequeno decote, entre os seios. O vestido não era muito curto, o escarpam era da mesma cor do vestido. Seus cabelos loiros, longos até a cintura, estavam presos num coque estilo medieval, unhas pintadas, usava uma maquiagem leve para noite, mas combinando com o que vestia. Já Martin estava com a mesma camisa xadrez, de flanela, calças jeans e tênis. Ela odiava os looks dele. Como sempre ela tinha uma mesa para os dois, gostava de chegar cedo nos lugares, pois assim poderia escolher onde ia sentar e não ficar segurando casaco a noite toda ou lutando para comprar um drink no bar. Eles pediram umas bebidas e a noite foi muito boa. Conversaram bastante, beberam muito, e dançaram muito. Ela ficou muito surpresa com o modo em que ele dançava.

— Nossa! Onde você aprendeu a dançar assim? Dança como um latino! E esse requebrado? WOW!

Então depois de muita dança tornaram a sentar. De vez em quando Martin comentava que todos os homens do bar estavam olhando para ela. Que falavam entre si quando ela dançava.

Ela respondeu: — Que bom que é assim. Quem sabe você percebe que eu estou solteira por opção. E além do mais, deixe que olhem! Você não se sente bem sabendo que a garota que eles querem tá é com você?

— Sim. Você é minha — ele falou isso na brincadeira, mas para Anya soava como algo mais profundo, já que estava gostando dele, mas Martin sempre falando que não estava apaixonado e que nunca teriam um futuro juntos.

No final da noite foram para a casa dele. Apesar de visivelmente bêbada, Anya negava, afinal ficou bêbada propositalmente.

Sabe um daqueles dias que você quer passar dos limites? Esse foi o dia de Anya, que não queria ficar na fila do táxi esperando uma eternidade, pois todos os bares e baladas de Bergen haviam terminado naquele mesmo horário, os bares deixam de servir bebidas por volta da 1 da manhã, já cerveja, sidras, coquetéis com baixo teor de álcool, às 2:00, e todos fecham entre 2:30 e 3:00. O que significava que todo mundo estava nas filas para pegar um táxi.

Martin então sugeriu que fossem andando, cerca de 10 minutos, para a ponte Mølenpris, onde sabia que os táxis paravam para pegar passageiros. Os mesmos táxis que estavam indo para o centro, para as imensas filas. A mulher concordou e os dois foram andando, ela em seu salto agulha, um passo para frente e três para trás, enquanto Martin ria das tiradas de Anya, cuidava dela, mas falava que ela estava bêbada. Eles pararam num quiosque para comer um kebab, uma comida árabe, muito popular na Noruega, já que existiam tantos imigrantes do Oriente por lá, já que é um dos países que mais concedia asilo para refugiados de guerra, fazendo com que existisse uma grande mistura cultural, esses refugiados eram alocados tanto nas cidades pequenas, quanto nas maiores. Havia ainda os casamentos de noruegueses com estrangeiros de todos os lugares do mundo.

Depois de comprarem o kebab no quiosque, seguiram para a ponte de Mølenpris. Era divertido vê-la tentando subir as escadas, quase caía para trás e ele de plantão com os braços abertos atrás dela, caso caísse, ele a seguraria. Ela ainda se virava com a mão na cintura e indagava aquele gesto dele, reclamando que aquilo era totalmente desnecessário e que as pessoas podiam pensar que ela estava bêbada. Martin não conseguia parar de rir, pois até o modo que falava a entregava. No final da escadaria, próximo da igreja de Mølenpris, havia uns contêineres de lixo, Anya o olhou com certa timidez e disse:

— Martin, preciso realmente fazer xixi.

Ele perguntou se ela não poderia esperar, estavam quase chegando ao ponto de táxi.

— Você acha realmente que eu iria lhe pedir isso se eu pudesse esperar? — respondeu.

Então foi fazer xixi atrás dos contêineres, Martin aproveitou e, um pouco distante de onde ela estava, também se aliviou. Ela fazendo xixi de cócoras, bêbada e falando:

— Ei, Martin! Estou escutando o seu xixi! — Ele ria! — E você não está escutando o meu está?

Ele rindo: — Não!

No táxi ela foi com a cabeça no ombro dele até chegar no apartamento. Martin segurava a mão de Anya, alisava, apertava. Beijava-a na testa e segurava suas mãos com muita força, os dedos entrelaçados. Ao chegarem, ele a ajudou a sair do táxi e queria carregá-la, mas como não paravam de gargalhar a tarefa era quase impossível.

Já dentro ao apartamento decidiram por mais uma cerveja, mas Anya, cansada e ainda bem altinha, não conseguiu terminar a sua. Foram fazer mais comida, pois o kebab não fez bem a ela e acabaram jogando fora. Terminaram de comer e foram se deitar na cama dele. Ele ajudou-a a se despir, emprestou uma camisa e se deitaram juntos embaixo do edredom, beijando-se muito e com muita paixão. Alguém vendo de fora poderia jurar que era um homem apaixonado por uma mulher, afinal a tratava com muito carinho. Pequenos gestos que um homem geralmente não faz quando não está envolvido com uma mulher. Ela quis fazer amor com ele aquela noite, estava pronta para isso, sem receios, mas ele achou que era melhor apenas dormirem, que não queria fazer sexo com ela bêbada. Eles poderiam esperar. Isso mexeu com o coração de Anya, foi ali que se entregou de vez. Estava muito apaixonada por ele. Era até mais que isso. Ela o admirava!

Na manhã seguinte, 17 de julho de 2016, lá estavam os dois aquecidos embaixo do edredom, conversando sobre a ressaca dela, ele buscou água, remédio para dor de cabeça e até mesmo perguntou se ela queria café da manhã na cama. Puxando-o para a cama os dois começaram a se beijar ardentemente, então Martin começou a sugar os seios femininos por cima da blusa, enquanto Anya se contorcia sob ele, enfiou a cabeça sob o tecido e passou a sugar os seios com força; ao mesmo tempo em que sentia uma dor fina, ela gostava, encolhia-se e se retorcia, às vezes com um pouco da dor, ele foi beijando-a na barriga, beijando mais abaixo, por cima das calças, entre as pernas dela, cheirando tão fortemente que dava para ouvir o trago da respiração.

Retirando as calças de pijama que ela vestia — Anya não o deixou retirar a blusa — ele ofegava e a olhava intensamente nos olhos, rosto no rosto o tempo todo, era assim que ele gostava de fazer amor, olhando nos olhos, boca na boca, sentindo a respiração, ela segurando a calcinha nos quadris, ele então ficou totalmente nu e , fizeram sexo pela primeira vez.

Anya chorava, mas Martin a penetrava cada vez mais forte e rápido, com mais e mais intensidade, e as lágrimas caíam. Era como se algo estivesse sendo roubado dela, era seu corpo, alguém estava invadindo, alguém estranho que ela mal conhecia. Ela o queria, absolutamente, mas sentiu um pouco de mágoa por ser penetrada daquela maneira, por ele vasculhar o corpo dela por dentro. Era apenas um sentimento confuso sobre sexo e paixão. Ela sabia que ele só queria sexo, enquanto ela queria muito mais, então esse foi o motivo da mágoa por ela ter se entregado naquele momento.

Depois da primeira vez, ficaram por horas conversando na cama. O porquê de ela ter chorado, sua mágoa, Martin a ouvia atentamente, mas era difícil saber o que o homem pensava. Se ambos sabiam as regras, ele sempre deixou bem claro que não ficariam juntos, que não queria um relacionamento com ninguém, e Anya falou que sabia disso, que estaria em Bergen em junho, julho e a metade de agosto, mas que depois disso voltaria a viajar para Førde, para concluir seus estudos de enfermagem.

Martin não perguntava muito sobre a vida dela, o que tinha feito antes, como a vida dela tinha sido, pois tinham um acordo de que falariam somente coisas superficiais, nada de sentimentos íntimos ou de detalhes da vida antes de se conhecerem; que ele não precisava saber o endereço dela, da situação de vida dela, dos relacionamentos passados, nada. Ela sabia que ele era solteiro, morava naquele apartamento com um amigo, trabalhava na marinha de Bergen e isso bastava. Ele concordou. Então ela até respondeu no início que era enfermeira em seu país, que até chegou a trabalhar cuidando de idosos, mas não entrou em detalhes sobre quando se mudou para Noruega ou coisas mais estressantes;

Ele perguntou no que ela já havia trabalhado, ainda ressaltou que:

— Eu sei. Não vamos perguntar muito, mas você não precisa dizer onde trabalhou, quando trabalhou, quanto ganhava, se foi bom ou ruim, só no que trabalhou.

Então ela foi contando só o que julgava ser superficial. Seu primeiro trabalho foi num hotel como camareira, logo que chegou na Noruega, sem nem saber falar a língua, depois passou a ser garçonete no restaurante desse hotel e com pouco tempo recepcionista.

Anya contava isso com orgulho de quem sabia por tudo o que passou e enfrentou sozinha com três filhos num país que não era o dela, com outro clima, outra cultura, para ela era um feito muito grande e que a orgulhava. Depois havia trabalhado num quiosque chamado Narvesen, onde abria a loja de manhã, sozinha, e algumas vezes, quando seu plantão era na parte da tarde, ela o fechava, também sozinha. O Narvesen é um quiosque comum na Noruega, uma loja que vende de cachorros-quentes a revistas, jornais, jogos lotéricos, refrigerantes, etc. Contou também que trabalhou nos correios separando cartas e prestando outros serviços de escritório; teve ainda o tempo que trabalhou em outro quiosque, no mesmo estilo do Narvesen, porém maior e que fazia comidas por entrega, Mix God biten. Depois trabalhou como segurança por alguns anos, até resolver entrar na faculdade de enfermagem.

— Trabalhou como segurança?

— Sim. Olha aqui as fotos de quando cheguei na Noruega.

— Nossa você tem mais de 20 mil fotos.

— Sim, tenho fotos da minha vida toda, desde 2005 até agora, 2016. Estão guardadas online.

— Você devia trabalhar com fotos.

— Meu ex sempre dizia isso. — Ela nem mesmo gostava de mencionar o nome do ex.

Martin queria ver todas as fotos, mas ela não o deixava pegar o telefone. Isso acabou virando luta corporal, de um lado ele tentando pegar o telefone, do outro ela o escondendo, Anya gritando e Martin rindo. Um beijo entre uma cócega e outra.

Mostrou fotos vestidas em seu uniforme de segurança, com seu rádio e escuta, e começaram a fantasia de quem era mais durão, ele que era militar ou ela que era segurança. Os dois brincavam de socos, de agarrar, quem conseguia prender quem, e nessa brincadeira ficaram ofegantes, cansados, transpirando, o que acendeu novamente a paixão, a vontade de fazer sexo. Essa luta corporal terminou em sexo. Sexo selvagem. Então eles fizeram de novo, mais uma vez após algumas horas desde a primeira vez.

Anya não gostava da maneira que ele fazia amor. Era estranho. Ela ficava por baixo dele e ele segurava na cabeceira da cama, subia e descia seu corpo no dela, roçando e esfregando pele com pele de uma forma que chegava a arder a pele dela, chegava a doer. Ela por baixo e ele subindo e descendo o corpo dele que estava totalmente grudado no dela, os dois nus, era uma dor física para ela embaixo dele, e ela achava muito estranho o fato dele se segurar com os braços na cabeceira da cama fazendo movimentos de sobe e desce como se estivesse treinando. Só assim ele conseguia ir até o fim. Ela ficava muito desconcertada, mas não queria falar sobre isso. Ele também demostrava timidez a esse respeito.

Ela definitivamente não gostou de fazer amor com ele, mas achava que era o início, que os dois precisavam se conhecer e se acostumar melhor um com o outro.

Na manhã seguinte, uma segunda-feira, ela saiu cedo junto ele, que ia trabalhar e ela pegaria o carro para voltar para casa. Martin até ofereceu a chave da casa, dizendo que ela poderia dormir até mais tarde e deixar a chave na caixa de eletricidade do lado de fora quando fosse embora.

Nesse dia, após um final de semana inteiro juntos, não trocaram mensagens, ficaram em silêncio, Anya não sabia ao certo se tinha liberdade para ligar, ou m****r mensagens. A verdade é que tinha medo de parecer insistente, também não sabia se ele era do tipo de pessoa que se você não procura, não dá sinal de vida. Era muita incerteza, algo novo e inesperado, o que vivia naquela relação. Ela apenas teve experiência com casamentos, com relacionamentos estáveis e duradouros durante sua vida toda. Não uma relação baseada em “ficar sem compromisso”, Anya ainda não sabia ao certo o que experimentava com Martin.

Se por um lado o homem afirmava que ela podia tudo: ligar, falar sobre qualquer assunto, por outro, se ela tomava uma atitude sem o consultar antes, ele demonstrava total insatisfação. Por exemplo, um dia Anya convidou uma amiga, , para encontrá-la na casa de Martin, pois ela estava quase de saída e ia dirigir para casa, como as duas moravam juntas, iriam juntas, de carro, até em casa. Anya sabia o quanto Martin era reservado, o que era dele era dele, dizia que não precisava de mais amigos, já os tinha o suficiente, amigos de uma vida toda, desde a infância, alguns poucos da escola naval.

As afirmações dele deixavam Anya insegurança de que ele talvez pudesse não gostar, ela ligou para ele que não atendeu, provavelmente estava ocupado no trabalho. Mesmo assim pediu a amiga que a encontrasse, pois lembrou que Martin havia se oferecido para dar carona a essa mesma amiga algumas vezes, quando Anya precisou buscá-la. Lembrou também que em outra ocasião ele havia falado que ela poderia vir jantar com eles.

Quando Martin chegou em casa e encontrou as duas deitadas, no quarto, conversando, a expressão de que odiou a invasão de sua privacidade foi tão óbvia, que Anya se sentiu obrigada a dar uma explicação. O mau humor dele era tão grande que não tinha como a amiga não perceber e as duas nem queriam continuar mais ali. Ele falou que ela não poderia ter feito aquilo, levar uma desconhecida para a casa dele, para o quarto dele, e ficar lá conversando com ela na cama dele, que ele chegou do trabalho cansado e não esperava aquilo. Não havia desejado aquela situação na casa dele. A amiga de Anya foi para sala e mesmo que elas houvessem feito almoço para eles, o clima era tão ruim que elas foram embora sem nem mesmo tocar na comida. Depois disso, o casal ficou bastante chateado um com o outro. Tanto, que só voltaram a se falar por causa de Anya, que sempre tentava olhar para certas situações difíceis com mais otimismo. Depois que a raiva passou ele a ouviu e ficou tudo bem.

Capítulo 8

19 de julho de 2016, terça-feira

M

artin parecia inquieto, lembrando de uma conversa que os dois tiveram, um rapaz na faculdade de Anya havia tentando várias vezes se aproximar dela, desde que a jovem iniciou sua graduação em enfermagem.

A inquietação dele vinha das mensagens que Anya deixou que ele lesse. Por si só esse fato já era preocupante, afinal, Martin tinha acesso a todas as mensagens dela dos aplicativos de namoros, mas as mensagens que o tal rapaz mandou em privado, ela só permitiu que Martin visse algumas. As que leu diziam que ele estaria em Bergen durante toda a semana e gostaria de encontrá-la, tomar um café, conversar. Que tinha algo muito importante para dizer.

Martin sentia dentro de seu coração que o que esse rapaz, de nome Noah, tinha para falar para ela de tão importante era pedi-la em namoro sério ou algo desse gênero. Martin não sabia ao certo o que queria da vida. Ele tinha convicção de que não queria se casar, ter filhos, animais, enfim, não queria um relacionamento sério, muito menos amar alguém. Pelo menos era o que repetia para si mesmo todos os dias. Não que não tivesse a chance de amar e ser amado, ele convivia no meio de muitos amigos e amigas de alto padrão norueguês: médicos, militares, enfermeiras, engenheiras, pessoas bem estruturadas e formadas, tanto homens, quanto mulheres.

O homem ficou em sua casa, sozinho, depois do almoço, lembrando de algumas conversas que teve com Anya, em que afirmou não ter a intenção de magoá-la, foi assim que contou sobre alguns casos em que se afastou das companheiras por elas terem dito que estavam apaixonadas. Explicou ainda, que antes de conhecê-la pessoalmente estava saindo com outra menina e que ela tinha muita coisa em comum com ele. Que era solteira, não tinha um passado complicado, tinha uma boa profissão, seu próprio apartamento, carro e era esportista, ressaltou que era exatamente uma mulher assim que poderia dar certo com ele, mas que mesmo assim, não tinha fé de que um dia se casaria ou dar certo com alguém. Disse que mesmo gostando desse relacionamento anterior, não foi o suficiente para dar o que ela queria. A menina queria um relacionamento sério e se declarou para ele. O nome dessa menina era Elisa.

Com o coração pesado, Anya o aconselhou a ir atrás dessa menina, se gostava dela ele poderia tentar, mas Martin respondeu que não, que deixou de responder suas mensagens havia um tempo. Então ele não voltaria atrás.

Martin pensou que se ele mesmo já havia dito para Anya que não gostava dela e que até gostava de outra, mas que mesmo assim não iria ficar com essa outra, pois não queria algo a mais com ninguém, imaginou que nada a impediria de estar com esse rapaz naquele dia, já que eles não haviam se quer trocado mensagens por algum tempo. Eles poderiam estar em um encontro talvez, pensou. Ou até mesmo um encontro de amigos.

Ficava cada vez mais inquieto, pensando que não tinha o direito de sentir ciúmes, nem de pensar mal dela ou falar algo sobre isso. Então resolveu telefonar para ela.

Anya ficou até surpresa, pois o achava muito frio para esse tipo de atitude. Tratava-a muito bem quando estavam juntos, mas se distanciavam 10 minutos depois que se separavam e era como se ela não tivesse existido. Ele não era bom em m****r mensagens e nem entrar em contato, um simples ‘bom dia’ ou ‘boa noite’ não era de se esperar dele.

Naquela terça-feira de julho, Martin a convidou para visitá-lo em sua casa. Ela estava com alguns problemas financeiros, pois teve que m****r dinheiro para ajudar em um caso de doença em sua família, no Brasil. Fora suas despesas com uma casa de três andares, três filhos, carro, viagens para a faculdade — que ficava há 3 horas de Bergen — toda semana, e milhares de outras contas.

Anya realmente não queria e não podia continuar gastando dinheiro com gasolina, pedágio, festas e passeios, com nada fora de seu orçamento. Afinal de contas ela era mãe, além de estudante, o que significava uma economia limitada. Mesmo assim, mais uma vez foi vê-lo, como fez todo o tempo em que estavam juntos, ela dirigia praticamente todos os dias de sua casa para a casa dele, ou do trabalho para a casa dele, já que sua casa era um pouco afastada e os ônibus não vinham com tanta frequência. O que era comum na Noruega, as pessoas aos 30 e poucos anos já serem estáveis, não cabia na realidade de uma pessoa que mudou de país e era mãe solteira. Anya era instruída, viajada, inteligente, entendia o ponto de vista dele e tentava se adaptar às novas regras e se integrar as expectativas de todos, mas Martin não aceitava o fato que uma estrangeira por algum motivo poderia não ter os mesmos padrões de vida de uma pessoa que nasceu e cresceu na Noruega. Ele se irritava facilmente se o assunto fosse o orçamento sempre limitado dela.

Anya chegou ao seu apartamento. Toda vez que se viam era a mesma coisa, a intensidade, de repente os problemas e preocupações não existiam, eles pulavam um no outro literalmente sem falar nada e se beijavam, namoravam com o olhar.

Naquele dia, sentaram-se na sala e ficaram um pouco mudos, Martin estava mais estranho que o normal, ele não era muito bom em comunicação, mas Anya percebeu que ele estava sério, afastado, inquieto. Tentaram assistir um filme, na cama, mas ele parecia que não estava satisfeito com a presença dela ali. Cansada de ser ignorada, perguntou se estava tudo bem ir embora e se poderia pegar uma caixa de cerveja na geladeira dele, que devolveria outro dia, mas que estava pensando em visitar umas amigas em Fyllingsdalen e se foi. Era terça-feira, dia incomum para beber, mas ela quase nunca estava livre nos fins de semana ou quaisquer outras datas e feriados, então aproveitava quando podia.

Chegando na casa de uma velha amiga, Marta, a alegria era estrondosa. Marta, como sempre, tinha feito comida típica brasileira, música rolando, mais duas ou três pessoas na casa. Geralmente onde as brasileiras moravam eram sempre assim, procuravam se reunir e qualquer motivo era transformado em festa. Uma sempre chamava a outra e cada uma trazia uma coisa, de repente virava um carnaval improvisado com muitas piadas, bons momentos e às vezes uns draminhas.

Martin era estranho. Ele mesmo afirmava isso. Não entendia seus próprios sentimentos e lutava até contra eles. Ele queria que Anya tivesse ficado em sua casa, mas não conseguia expressar o que queria dizer. O que tornava ainda mais difícil para compreender suas expectativas com relação ao que viviam.

Para uma mulher deveria ser bastante frustrante conviver com uma pessoa que nunca sabia o que queria e quando sabia não expressava.

Horas depois de ela deixar sua casa, Martin mandou uma mensagem perguntando aonde ela estava. Ao responder, Anya aproveitou para convidá-lo a se juntar a seus amigos. Meio a contragosto, meio com vontade de ficar com ela, o jovem foi ao encontro dela. Chegou na casa da amiga, foi bem recebido, jantou com elas, observava tudo que Anya fazia, como ela tinha livre acesso onde quer que chegasse, era do tipo que de repente já estava enturmada na cozinha trocando ideias, ralando uma cenoura ou pondo a mesa, carregando cadeiras. O jantar foi muito agradável e todos pareciam bastante satisfeitos, menos Martin.

— Há algo errado, Martin? Há algo que você queira me dizer?

— Eu não sei exatamente.

— São as minhas amigas mais velhas? A música? A comida? O que está te aborrecendo?

— Nada.

Como as amigas estavam distraídas na cozinha, ela o levou para um cantinho no sofá para conversar.

— Me fala vai. Sou sua amiga, eu não mordo. Não dói conversar, sabia?

— Eu pensei que você estava com seu amigo Noah. Ele está em Bergen e você sumiu dois dias. Pensei que você tivesse saído da minha casa hoje pra encontrar ele.

— Estou aqui, como disse, na casa das amigas em Fyllingsdalen. Mesmo que você tivesse pensado isso antes, agora você viu que não era, viu que eu estou aqui.

— Eu sei.

— Então não tem mais motivos pra continuar chateado.

— Eu sei.

— Quer ir pra casa?

— Quero. Você vem?

— Claro.

Os dois continuaram essa conversa no caminho de volta ao apartamento dele. Eles se entenderam. Anya sempre pedia a ele para falar mais, para se abrir, não esconder o que ele realmente pensava. Ele concordara e eles ficaram bem novamente. Anya gostou de saber que ele estava inseguro e com ciúmes, embora, ao mesmo tempo, se sentisse insultada por ele achar que ela seria capaz de sair da casa dele para encontrar outro homem. Ele tinha o dom de a confundir. Mesmo confusa e magoada, Anya transou com ele a noite toda.

Notas do autor:

 [IG1]Esse trecho não fez sentido com a maneira como terminou o ‘capítulo’ anterior, nem como esse começa. Ele quebra o gancho?

 [IG6]Isso é estupro. Logo precisa de um aviso de gatilho no início do livro.

 [IG9]No início do livro há a indicação de que ela teve os filhos na Noruega? Não!

 [IG11]Onde estão os filhos dela? As crianças simplesmente sumiram, não são mais citadas, apenas como “ela é mãe solteira”.

As crianças estão muito com o pai de Elias, e com uma brasileira adulta que mora na casa de Anya, Maria, que paga aluguel para morar lá, já que Anya estuda e mora em uma outra cidade para concluir a faculdade. Na Noruega as crianças são totalmente independentes, vão morar sozinhas noutra cidade com 16 anos, acompanhadas pela escola. Quase nenhum adulto de 18 anos mora com os pais.

 [IG14]Anya não mora com os filhos?

Mora em Førde, quando está em Bergen os visita, quando eles também estão em casa.


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