O JOGO

POV: NICHOLAS BLACKWELL

Os primeiros dias foram como uma batalha silenciosa.

Eu tentava manter a postura profissional com ela, mas meus gestos traíam a minha concentração. Estava enlouquecendo. A observava demais. Me aproximava sem necessidade. Fazia perguntas que não precisavam ser feitas — apenas para ouvi-la responder.

Ela tentou ignorar. Mas quanto mais ela fazia isso, mais difícil era sair de perto dela. A forma como passava perto demais. Como prendia o cabelo enquanto escrevia os códigos, ou preenchia um relatório, sempre me pegava com um sorriso enviesado.

-*-

Eventos beneficentes sempre me pareceram um desfile de egos e hipocrisias. Mas como CEO de uma das empresas responsáveis pela principal doação do ano a instituições filantrópicas, comparecer a esses eventos era inevitável.

Era uma noite pra toda a equipe encher a cara, enquanto meia dúzia de oportunistas tentavam puxar o saco da diretoria.

Nessa noite, porém, meu incômodo se tornou uma pouco maior, no minuto em Hannah chegou.

Ela entrou no salão vestindo um vermelho de tecido leve, que fluía sobre o corpo como se emoldurasse cada curva. As alças finas deixavam o colo suavemente exposto, sem exageros — mas com o exato grau de ousadia pra fazer meu sangue ferver. O braço direito nu revelava uma tatuagem marcante: um lobo entrelaçado por flores, como uma assinatura silenciosa de quem já sobreviveu ao caos e aprendeu a florescer mesmo sangrando.

O cabelo preso em um coque displicente, com alguns fios soltos emoldurando o rosto, dava a ela um ar quase etéreo — como se a força e a suavidade nela coexistissem em equilíbrio perigoso.

Nada nela era gritante. Mas ainda assim... quando ela entrou, parecia que o ambiente inteiro pertencia a ela.

Nossos olhares se cruzaram e se sustentaram só alguns segundos, antes de ela fazer questão de deixar claro que estava me ignorando ali.

Claro que não demorou para que os olhares se voltassem para ela. Especialmente os do diretor Relações Públicas e Comunicação da Onyx, Peter Laughton. Um idiota educado demais, para ser honesto. O tipo de homem que olha como se fosse dono de tudo. E naquele momento – para testar o limite do que eu era capaz de tolerar – ele estava olhando pra ela.

Ele se aproximou demais. Falou algo ao pé do ouvido dela que a fez sorrir. Aquele sorriso. O mesmo que ela se recusava a me dar. Aquilo me atravessou.

Sem pensar, fui até ela.

— Srta. Simmons, você veio sozinha? — Uma pergunta casual.

— Eu sempre venho sozinha. — ela me respondeu com um tom que baixou uns 2 graus a temperatura do ambiente e depois desviou o olhar. — É mais fácil não decepcionar ninguém assim.

— Srta. Simmons, poderia me acompanhar?

Ela olhou para mim, o sorriso se apagando.

— É algo urgente, Sr. Blackwell? Eu estava conversando com o Sr. Laughton sobre o protocolo do Centurion.

— Claro. Mas preciso revisar um detalhe sobre a nossa segurança.

Ela cruzou os braços.

— Que estranho. Achei que o Senhor não gostasse de tratar assuntos de trabalho em eventos sociais.

A resposta me cortou como navalha. Tentei manter a compostura.

— Mudança de planos.

Ela suspirou e se afastou de Laughton. Me acompanhou até a varanda lateral do salão. A vista de Manhattan brilhava ao fundo. Mas tudo que eu via era ela.

— Isso foi ridículo.

— Eu não gostei do jeito como ele te olhou.

— Isso é problema dele. E meu. Não seu.

— Você trabalha pra mim.

— Ainda assim. Eu não sou sua propriedade.

O silêncio caiu entre nós. Tenso. Elétrico.

Ela deu um passo para trás, mas continuava me desafiando com o olhar.

— Sabe o que é pior? — ela disse. — Ele foi extremamente gentil e nada invasivo como você está sendo agora. E isso me irrita mais ainda.

— Eu não precisaria me intrometer se você não me ignorasse e parasse de fugir.

— E você, para de me caçar. Não sou um prêmio. Sou sua funcionária.

Ela virou de costas, pronta para se afastar. Mas a segurei pelo braço, sem força — apenas o suficiente para que ela não fosse.

— Hannah, espera...

— Me solta, Nicholas. Você não me quer. Só quer controle. Mas eu não sou uma boneca! — ela disparou, ainda com os olhos em chamas.

Ela disse isso e eu senti meu corpo inteiro se contrair. Cerrei os dentes, como se tentasse segurar algo dentro de mim que nem eu entendia.

Ela voltou para dentro. Sozinha.

E eu fiquei lá, parado, engolindo o veneno do meu próprio ciúme. Ignorando todas as mulheres que tentavam puxar assunto. Fingindo ouvir os elogios e as bajulações. Mas meus olhos estavam sempre procurando por ela.

Ela dançando com um estagiário. Ela sorrindo para uma analista. Ela, vivendo.

E eu? Morrendo de vontade de tomar tudo aquilo pra mim.

Mas não podia.

Ainda não.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App