Henry, Henry, Henry...

— Desculpe, fiquei muito surpresa. ─ Eu disse sem jeito, massageando a têmpora com os dedos. ─ Não consigo acreditar que você é sobrinho daquele homem!

A personalidade não é uma questão de família, e isso é um ótimo sinal. Mas a beleza sim deve ser hereditária. Embora Henry não tenha cabelos loiros como seu tio, ainda é muito bonito. Com os cabelos castanhos e os traços bem definidos, posso dizer que há sim semelhanças físicas entre os dois, mesmo que sutis.

─ Não se desculpe. Você já tem planos para o almoço? ─ Perguntou confiantemente.

Henry, confiante, tinha seu próprio charme.

Havia combinado de almoçar com Mike e o restante do pessoal no mesmo restaurante de ontem. Mas agora que encontrei Henry, Mike terá que me desculpar mais tarde.

─ Na verdade, sim, mas não é nada demais. Posso ir com você.

─ Ótimo.

No elevador, observei silenciosamente quando ele apertou o botão do estacionamento.

─ Vou levá-la a um lugar legal. Podemos conversar à vontade lá.

Sorri sem pensar.

─ Eu deveria ter adivinhado que você não iria almoçar no restaurante da esquina.

Ele olhou para mim, fingindo estar ofendido.

─ Para calar a sua boca, saiba que almoço lá na maioria das vezes.

Sorri.

─ Não te vi ontem. ─ Estreitei os olhos.

─ Eu estava fora da cidade.

Ok, isso me convenceu por enquanto.

Alguns minutos depois, chegamos a um restaurante sofisticado. No último andar de um prédio comercial, em um espaço amplo, mesas estavam espalhadas pelo salão, mantendo uma distância segura entre si para garantir a privacidade dos clientes. As mesas estavam elegantemente decoradas com talheres de prata e arranjos de flores, lustres pendiam do teto, e uma música suave tocava ao fundo.

─ Então, é aqui que você almoça? ─ Perguntei enquanto o seguia até uma mesa.

─ Não. ─ Ele puxou a cadeira para que eu me sentasse. ─ É aqui onde iremos almoçar hoje.

Henry escolheu uma mesa no canto, com a parede toda de vidro, proporcionando uma das vistas mais bonitas que já vi na vida. Nova York, vista de cima, era incrivelmente bela.

─ Eu tive quase a mesma reação quando vi isso pela primeira vez. ─ Disse Henry.

Eu pisquei, ciente de que talvez estivesse demonstrando muita emoção. Olhei para ele.

─ Nunca tinha visto Nova York de uma perspectiva tão alta. A cidade é linda.

Até o mar parecia absurdamente bonito e atraente; naquele momento, esqueci de como ele poderia ser terrível.

─ Eu nunca perco uma oportunidade de apreciar as paisagens da cidade. No térreo, tudo é muito corrido, mas aqui... ─ Ele tocou a mesa suavemente. ─ Nada é corrido aqui,é apenas bonito.

Eu sorri para ele. Henry era delicado e elegante, do jeitinho que eu tinha saudades.

Enquanto nosso almoço não chegava, conversamos bastante. Henry era o oposto do tio. Era descontraído, engraçado e não parecia querer controlar nada. Ainda não caiu a ficha de que eram parentes legítimos.

─ Você foi embora tão de repente, não pudemos nos despedir. ─ Eu iniciei o assunto delicado enquanto comíamos.

Henry assentiu.

─ Depois que minha mãe faleceu, meu pai achou que o melhor era me mandar para fora do país. Ele pensou que eu iria superar mais rápido onde não tivesse vestígio dela... E essa decisão foi tomada de repente.

Ele não demonstrava tristeza ao falar, embora tenha se passado alguns anos, mas talvez tivesse mágoa, não pela perda e sim pela decisão egoísta do pai.

─ Sinto muito pela sua mãe.

─ Obrigado.

─ Então, você se formou e fez faculdade onde?

─ No Canadá. Foi difícil no começo, mas como eu não conhecia ninguém e não tinha distrações, acabei sendo obrigado a focar nos estudos e deixar as dores para depois.

─ Então... ─ Procurei um jeito de formular a pergunta sem ser sem noção. ─ Você acha que seu pai tomou a decisão certa?

─ Claro que não. ─ Ele respondeu imediatamente. ─ Meu pai não soube lidar com a morte da minha mãe, e eu lembrava muito ela. Ele não fez isso por mim, Anahi. Ele me mandou embora por ele.

Meu Deus, será que o pai de Henry é irmão do Ben? É tão fácil imaginar aquele homem arrogante e controlador agindo dessa forma. Se livrando do filho para não ficar se lembrando da esposa falecida recentemente.

─ Caramba. ─ Fiquei em silêncio.

Henry parou de comer, soltou os talheres e ficou me encarando.

─ Você parece ter algo a dizer. Não esqueci desse rosto que não consegue esconder nada. ─ Ele sorriu.

É, eu tinha que confessar. Eu não era boa em esconder minhas emoções, nunca fui.

─ Tudo bem. Mas não me leve a mal, eu quero muito fazer uma pergunta.

─ Pode fazer. - Disse com tranquilidade.

─ Ben é irmão do seu pai?

Para a minha surpresa, Henry riu. O suficiente para esconder a boca com o guardanapo. O sentimento de constrangimento me consumiu. Havia falado algo errado?

─ Acha que eles são irmãos por causa da atitude escrota do meu pai?

Balancei a cabeça positivamente no mesmo instante, sem pensar. Henry riu ainda mais.

─ Meu tio foi totalmente contra a atitude do meu pai, mesmo eu lembrando a irmã mais velha dele.

Meu queixo quase caiu, mas o mantive no lugar.

─ Desculpa, e-eu não sei o que pensar.

A vergonha tomou conta de mim, o suficiente para me deixar ainda mais constrangida. A irmã do Ben morreu, e eu pensei o pior dele nessa situação.

─ Não foi nada demais, relaxa. E como está a sua avó? Ela ainda tem aquele restaurante?

Sendo transportada para memórias do passado, acabei sorrindo. Eu, Henry e outros amigos sempre íamos comer lá, minha avó adorava receber os meus amigos. Eu sorri.

─ Sim. Mesmo sendo idosa, ela ainda cozinha lá. Contratamos duas ajudantes de meio período para ajudá-la.

─ Legal, eu gostaria de ir lá.

─ Claro! Vamos marcar, ela vai adorar te ver!!

Eu saí do elevador rindo, sem conseguir me controlar.

─ Eu ainda não acredito que você fez aquilo no teste para entrar para o time. ─ Eu não conseguia parar de rir enquanto caminhava até a minha mesa.

─ Não me culpe por tentar, eu queria mesmo entrar para o time e ser popular.

─ Você já era popular, Henry.

─ Por ser extremamente bonito e rico, não por fazer parte do time.

─ Ai mds! ─ Me joguei na minha cadeira, rindo sem parar. ─ Não acredito que estou ouvindo isso.

Antes que eu pudesse parar de rir, a porta se abriu. Com um sorriso largo travado no rosto, acabei me virando e dei de cara com um Ben muito sério me olhando de volta. Seu olhar congelava os meus ossos. Eu parei. Passei tanto tempo rindo que desfazer o sorriso agora foi doloroso. Eu limpei a garganta tentando disfarçar e escutei uma risadinha de Henry. Foi o suficiente para o tio dele se virar para ele. Henry ficou sério e arrumou a postura.

─ O que você está fazendo aqui? ─ Ben perguntou.

─ Vim falar sobre os detalhes da publicidade do novo hotel, Sr.

Eu levantei a sobrancelha. Henry agora estava tão sério e executivo, nem parecia o mesmo cara de segundos atrás.

Ben também o olhava cético. Nem ele devia estar acreditando na dupla personalidade do sobrinho. Mas não disse mais nada, apenas saiu do caminho para que Henry pudesse entrar.

─ Até já, Anahi! ─ O homem mais novo sorriu para mim antes de entrar na sala. Eu sorri de volta.

O sorriso gentil de Henry foi substituído por uma carranca do tio dele. Ben me lançou um olhar de desgosto antes de fechar a porta.

Não só de sorrisos vive uma secretária de Ben Cooper. Voltei ao trabalho marcando a reunião que ele havia pedido.

●●●

Voltei para a minha mesa. Dessa vez, apreciando o silêncio que tanto me agrada. Não imaginei que aquela mulher faria amizade tão rápido, ela parece ter facilidade com isso.

─ Vejo que já conheceu a nova secretária. ─ Me sentei na cadeira.

─ Na verdade, já nos conhecemos. Estudei com ela antes de ir para o Canadá.

Ótimo. As coisas estavam ficando ainda melhores.

─ Desculpe se a incomodamos, não imaginávamos que você já tivesse chegado.

E agiriam pelas minhas costas se eu não estivesse aqui. Neguei com a cabeça.

─ Não se preocupe com isso. ─ Respondi. ─ Vamos falar sobre o hotel.

O maldito hotel estava me dando dor de cabeça desde que ganhamos a licitação. Foi difícil pra caramba conseguir, mas de brinde veio um cliente exigente e que não entendia nada.

Henry falava sem parar. O garoto tinha a mente aberta desde pequeno, sempre teve facilidade para resolver problemas. Sua mãe estaria orgulhosa do homem que ele estava se tornando.

─ Então, acredito que se fizermos uma apresentação e mostrarmos ao Sr. Martin que podemos usar o design anterior na publicidade do hotel, ele pode repensar. ─ O rapaz encerrou seu discurso.

─ Sua ideia é boa, Henry. Gostei mesmo. Mas você está esquecendo de uma coisa.

O rapaz inclinou o corpo para a frente involuntariamente, esperando eu terminar a frase.

─ O Sr. Martin é cabeça-dura, é um velho que não está aberto a novas ideias. Não acredito que ele vá se deixar convencer.

Henry suspirou.

─ Vejo que ele já encheu a sua paciência. Mas deixe-me tentar, prometo que organizarei uma equipe e iremos convencê-lo. Apenas chame-o aqui.

Respirei fundo. Era evidente que o garoto estava tentando provar seu valor, que havia gastado muita energia nisso e estava disposto a continuar gastando. Mas eu não entro em lutas já perdidas.

Como bom observador, Henry percebeu minha resposta antes que eu precisasse verbalizá-la.

─ Mobilizar a equipe para um projeto do zero vai gerar mais desgaste do que me deixar tentar. Você tem muitos outros projetos, deixe-me resolver esse.

Com quem esse garoto aprendeu a ser tão cabeça-dura? Eu não tinha mais energia para lutar contra ele. Assenti.

─ Você tem apenas uma tentativa, Henry.

Para minha surpresa, o brilho voltou aos olhos castanhos da minha irmã.

Henry saiu da sala, controlando sua empolgação. Embora sua ideia seja boa, eu não acho que seja suficiente para convencer o Sr. Martin. Aquele homem antigo não aceita ser contrariado.

'Toc toc'

Anahi Lopez entrou na sala logo em seguida.

Fixei os olhos nos papéis que se encontravam na mesa, enquanto escutava os saltos finos caminhando até mim. Suspirei irritado. Até o som dos seus saltos finos era irritante. Onde estava com a cabeça quando a contratei?

Ah, já sei. Ela vai me pagar por tudo o que disse.

─ Sr. Cooper, já agendei a reunião com o Sr. Patterson. Insisti um pouco hoje, mas a secretária dele disse que ele não poderá hoje. Então marquei para amanhã.

Até a sua voz.

Peguei a caneta e assinei um papel, respondendo sem olhá-la.

─ Desmarca, não estarei no escritório amanhã.

─ O quê? ─ Perguntou surpresa.

─ Iremos visitar um cliente em sua ilha. Não estarei no escritório.

─ Iremos?

Ela faz de propósito? Tenho mesmo que ficar desenhando tudo?

Levantei a cabeça apenas para encontrar os olhos desafiadores de Anahi, mesmo que agora ela não estivesse me desafiando.

Sem me dar ao trabalho de explicar mais uma vez, apenas assenti para o que já era óbvio.

─ É literalmente uma ilha? ─ Tinha algo diferente na voz dela.

Estreitei os olhos.

─ Nós vamos ter que pegar um barco ou algo assim para chegar até lá?

Levantei a sobrancelha, ela não podia estar perguntando sério.

─ Entendi. ─ Anahi assentiu, mas não se moveu para sair.

─ Algum problema? ─ Perguntei, já sem paciência.

─ Não! ─ Respondeu no mesmo instante. ─ Vou voltar para o meu trabalho. ─ Ela estava... disfarçando alguma coisa? ─ E ter outra briga com a secretária do Sr. Patterson.

A mulher saiu da sala tão rápido que o seu cabelo foi apenas um borrão loiro.

Passei o restante do dia no escritório. Por causa da faculdade, Anahi saiu uma hora mais cedo. Outro problema. O que deu em mim para efetivar uma pessoa que nem sequer havia terminado a faculdade? Era claro que os estudos poderiam atrapalhar seu desempenho no trabalho, ou o contrário. Mas, pela primeira vez, eu não pensei o suficiente. E isso pode ter sido um erro.

Antes do elevador parar, antes das portas se abrirem e eu sair, já escutava uma risada escandalosa que tomava conta do ambiente. Não era reconhecida, mas eu torcia para que não fosse quem eu estava imaginando. A irritação apareceu só em imaginar.

Saí do elevador, passando pela porta de vidro que separava aquele ambiente de trabalho no segundo andar. Ali, havia um grande escritório compartilhado, equipes ocupando o mesmo espaço, duas mesas com um layout vantajoso. A mesa se parecia com um X esticado e as bordas arredondadas. Havia espaço para 6 pessoas e, no meio, havia um espaço limpo que poderia ser usado na hora de criar projetos. E bem ali naquele espaço, ao lado da cadeira de Mike William, Anahi Lopez estava sentada, rindo com toda a equipe que deveria estar trabalhando.

Todos os outros pararam no mesmo instante quando me viram, imediatamente começaram a fingir estar trabalhando, como se eu fosse algum idiota cego.

Mike William fingiu uma tosse, e só assim Anahi olhou para o lado, me encontrando ali.

Um rápido relance de surpresa passou por seu rosto, mas ela engoliu saliva e ergueu a cabeça. O que há de errado com essa mulher?

─ Eu te liberei uma hora atrás, você não devia estar em casa a essa hora?─ Controlei minhas palavras.

─ Mike vai me dar uma carona. ─ Deu tapinhas no ombro do rapaz e voltou a sorrir. ─ Chegarei rapidinho.

Respirei fundo.

Mulher, você não faz ideia do que está se metendo.

Sem mais nada a dizer, me virei e saí do escritório, irritado com o cinismo da loira.

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