Capítulo 3

Kaori foi para a cozinha de cabeça baixa, cruzou com a Ivone. A Lisa também saiu, logo a Lisa voltou falando que o Rui podia levar ela pra casa. Ela respondeu de imediato que não precisava, porque ia ver o pai. Ficou muito chateada, e ele também, mas ninguém viu nada. Logo o Juliano passou lá para pegar ela, e foram pra casa dele. Ele queria saber tudo da consulta e promover uma aproximação da Joyce com a Kaori. Foram jantar fora, mas não foi muito legal, Kaori estava envergonhada, incomodada com sua aparência. Ver os dois como casal também era complicado, mas correu tudo bem, na medida do possível.

Na cabeça de Kaori, ela já tinha cumprido o que prometeu ao médico, indo ver pessoas e tentando se lembrar das coisas. De nada adiantou: o passeio só lhe causou dor e desconforto. A nova Kaori não tirava fotos, não postava nada nas redes sociais. O que mais chamou a atenção da família não foi isso, mas sim a educação e gentileza dela com todos. Após os 15 anos, ela havia mudado muito ficou mais rebelde, respondona, com a boca suja e se importando cada vez menos com a opinião e os sentimentos das pessoas ao redor. O maior medo da Lisa era que as memórias voltassem com turbulência, provocando mais mudanças negativas em Kaori. Ela podia voltar a ser rebelde e, agora maior de idade, ninguém ia conseguir segurá-la..

À noite, o Juliano levou ela pra casa de volta. Ela disse que tinha gostado de sair com eles, mentiu, na verdade. Depois, mandou para a Joyce a foto de um bebê parecido com ela e o Miyuki, de olhinhos puxados. Elas estavam se entendendo. A Joyce estava indo com calma e cautela; o relacionamento dela ficou em risco e ela não faria nada para perder o Juliano naquele momento. Quando a Lisa chegou, foi tomar banho com um pouco de pressa. Disse que ia sair um pouco, tomar uma cerveja com um amigo.

Kaori foi para o quarto da mãe, ficou vendo ela se arrumar e começou a fazer perguntas sobre esse “amigo”. Vendo a filha sozinha, logo a Lisa achou que era uma má ideia sair, quis desmarcar o encontro. Kaori disse que não era preciso, que ia ficar bem e até já ia pra cama. A Lisa se arrumou com a ajuda da filha, e saiu. Voltou cerca de três horas depois, não foi como o esperado, não foi bom o encontro.

No dia seguinte, quando Kaori acordou, a mesa do café já estava arrumada. A Lisa, de bom humor, limpando a casa e ouvindo música. Kaori perguntou, surpresa, se iam receber visitas pra comer, porque tinha muita coisa lá. A Lisa disse que era tudo pra elas duas. Sentaram-se à mesa e começaram a conversar sobre o encontro da Lisa. Ela disse que não foi tão legal, mas que estava melhor que nada. Então, incomodada com a Lisa mexendo no celular o tempo todo, Kaori falou:

— Mãe, a gente não pode mexer no celular tanto assim na mesa, né? Eu vou sair, ir pra sala, e tenho certeza que quando eu estiver assistindo aí você vai querer conversar.

Ela respondeu digitando:

— Você tem razão, filha, desculpa. Posso te fazer uma pergunta? Você não gosta de surpresas ainda ou isso mudou também?

Kaori disse que não sabia, super desanimada, que só vendo pra saber. Então o Miyuki irmão de Kaori falou, parado na porta:

— E agora, já dá pra saber se gosta ou ainda não?

Ela se levantou rápido e correu para os braços do irmão. Se abraçaram chorando, e ela falou:

— Por que você demorou tanto? Você não pode me deixar! Eu senti tanto a sua falta.

Logo atrás estava o Juliano, que também não aguentou segurar a emoção, vendo os dois tão unidos. A família toda começou a chorar. Kaori falou que não era pro irmão estar longe, nem pra ter demorado tanto pra ir ver ela. Ele respondeu, ainda abraçado:

— Eu sei, me desculpa, não deu pra vir antes. Que saudades de você! Cara mba, que susto. Como você tá? Quantos anos você tem hoje?

Começaram a rir. Ela disse que ainda era a irmã mais velha, por mais que não se lembrasse. Ele falou:

— Nunca mais faz isso! Eu achei que ia te perder. Como vou ser o filho preferido sem você pra me ajudar nisso?

Ela deu risada e ficou agarrada com ele. Sentaram todos à mesa. Kaori contou como estavam sendo os dias pós-acidente. Logo o Juliano foi embora, e os dois irmãos foram pra sala. Ela ficou deitada no colo dele, conversando. Ele tinha muita coisa pra contar da vida no exército, também contou coisas que aconteceram nos últimos anos.

Os dois iam passar o fim de semana todo juntos. Ficaram na casa da Lisa sábado o dia todo. À noite, foram pra casa do Juliano encontrar alguns familiares. Foram de Uber. No trajeto, ela já foi ficando nervosa por ver gente diferente. Fizeram um jantar, e enquanto só estavam os quatro, Joyce, Juliano, Miyuki e Kaori, tudo ficou bem.

Mas quando chegaram mais pessoas, falando alto, conversando, ouvindo música, Kaori começou a se sentir mal. Foram precipitados em organizar aquilo e não saiu como o planejado.

Em um momento de distração deles, ela saiu pra fora do apartamento, quase tendo uma crise de pânico. Desceu pelo elevador e foi andar no condomínio. Ela se sentou em um banquinho, mandou uma mensagem para a mãe perguntando se podia ir pra lá. A Lisa quis saber o que estava acontecendo, disse que ainda estava no trabalho. Enquanto as duas conversavam por mensagem, um cachorro se aproximou e começou a cheirar e lamber Kaori. Ela estava chorando, chateada, e tocou o cachorro se esquivando. Então o dono do cachorro correu até eles e o prendeu na coleira. Era o Thomás, um vizinho que ela havia ficado e não lembrava. Ele falou, surpreso:

— Oi. Desculpa, ele está agitado hoje.

Ela respondeu, limpando as lágrimas:

— De boa. Eu gosto de cachorros!

Ele ficou parado lá, olhando. Ela falou, sem graça:

— Nós nos conhecemos ou você vai roubar meu celular? Tá me olhando de uma forma estranha.

Ele pediu desculpas, balançou a cabeça que sim. Ela falou, levantando:

— Só para, por favor!

Ele ficou sem jeito e falou:

— Eu moro aqui, no andar de cima do seu pai. A gente costumava sair.

Kaori estava de pé e falou, interrompendo ele:

— Preciso ir pra casa, desculpa. Não tô me sentindo bem!

Ele disse que eram só amigos, perguntou se podia subir com ela. Ela disse que não e saiu andando. Ele ficou olhando, meio sem entender. Então ela parou, se virou pra trás e falou:

— Qual é seu nome?

Ele respondeu, e ela falou, chateada e envergonhada:

— Desculpa, Thomás, eu não me lembro.

Ele disse que estava tudo certo, desejou melhoras. Ela voltou pra junto de todos, foi lavar o rosto com tremedeira e falta de ar. A Lisa disse que ia buscar ela de Uber e que ia demorar um pouco. Enquanto esperava, ela foi pesquisar um pouco sobre o Thomás e não achou nenhuma rede social dele. Logo achou que ele era só um maluco dando em cima dela.

A Lisa foi até lá buscar os filhos. No caminho pra casa, rolou um debate entre o Miyuki e a Lisa, porque ele não era capaz de entender por que ela não queria ajuda financeira do Juliano para comprar um carro novo. Na verdade, Kaori também não entendia e se sentia culpada, porque ela acabou com o carro novo da mãe. A Lisa deu um sermão nele sobre terem se esforçado muito pra pagar os estudos dele e também sobre eles dois entenderem que a vida dela agora era sozinha.

No domingo cedo, a Lisa queria ir na feira ali no bairro mesmo. Kaori não queria ir, mas foi só pelo irmão. Lá, ele pediu pra tirarem uma foto. Ela não quis, começou a reclamar do cabelo, das sobrancelhas, das unhas, quase chorando. A Lisa falou, surpresa:

— Nossa, Kaori, eu não sabia que você estava incomodada com isso. Se tivesse me falado, eu teria dado um jeito.

Kaori respondeu, chateada:

— Eu nem lembrei, mãe, deixa pra lá. Você já está bem ocupada e cuidando muito de mim! Miyuki, pode tirar, só não posta nada, por favor!

Ele abraçou a irmã e falou que não precisava. Ficaram até cerca de 10:00 da manhã na feira. Depois foram pra casa. Logo o irmão dela, ia embora o Juliano ia lá pra buscá-lo. A despedida foi bastante triste. Nas lembranças de Kaori, aquela época foi um tempo em que os dois eram muito unidos, iam e voltavam da escola juntos, não brigavam muito ainda. E o irmão sabia exatamente como acolher ela naquele momento, enquanto os pais já ficavam mais confusos, dando tratamento especial.

Após o Miyuki ir embora, a Lisa comunicou a Kaori que estava de folga e que iam dar um jeito no cabelo dela. Ela perguntou, curiosa, se a mãe tinha feito algum curso nos últimos anos. A Lisa respondeu:

— De cabeleireira não, mas eu sei quem fez. Vamos sair, só pega o celular, é aqui perto.

Um pouco desanimada, Kaori aceitou. Foram caminhando até uma casa ali na rua mesmo. Tinham dois rapazes na calçada lavando o carro. A Lisa falou, entrando:

— Oi, meninos!

Kaori falou “oi” para os dois, ficou um pouco pra trás sem entender de quem era aquela casa pra Lisa ir entrando daquela forma. Quando ela foi sair da garagem para entrar na sala, deu de cara com o Rui, filho de Ivone. Ele falou, apreensivo:

— Desculpa, oi. E aí, tudo bem? Como você tá?

Ela respondeu, sem jeito, cabisbaixa:

— Não foi nada, eu estava bem na sua frente, então...

Ele falou, sem jeito:

— Eu queria me desculpar com você por aquele dia, eu não pensei bem.

Ela respondeu, olhando para onde a Lisa foi:

— Foi essa semana? Ou antes do acidente?

Ele disse que há alguns dias, no restaurante. Ela sorriu e falou, envergonhada:

— Não me lembro do que aconteceu, então acho que está desculpado. Estou com dificuldade pra guardar memórias recentes. Demorei duas semanas pra memorizar o divórcio dos meus pais. Sinto muito, não faço ideia de quem você seja!

Era nítido o quanto ela estava triste e chateada com aquele tipo de coisa. Ele disse que aquilo era normal, que havia acontecido algo parecido com um amigo dele que sofreu acidente de moto. A Lisa voltou, chamou ela pra entrar, apresentou a Daia, filha da Ivone. Elas foram para os fundos lá, a Daia fazia cabelos, tinha um salão. Kaori nem tentou conversar muito, com receio do que falar. Pediu pra se sentar na cadeira. A Daia começou a preparar ela, borrifou água e evitou lavar o cabelo, porque tinham pontos recentes e mexer no cabelo dela doía muito. Ela acertou o corte, desfiou as pontas pra deixar mais leve, foi perguntando se estava bom. Kaori só concordava com tudo.

Ela também fez as sobrancelhas. Todo o tempo, Lisa e Daia conversaram; Kaori quase não falou nada. Quando ficou pronto, bateram o secador pra tirar a umidade e então, ao finalizar, Kaori se olhou no espelho e sorriu. Agradeceu à Daia e ficou se admirando alguns instantes. A Lisa ficou bem contente em ver a filha se recuperando mais animada, mesmo que muito pouco.

A Ivone tinha saído e chegou, foi beijar e abraçar Kaori. Disse que ia fazer almoço e convidou elas pra almoçarem lá. A Lisa insistiu pra Kaori aceitar, elogiando a comida da Ivone. Foram sentar na cozinha. A Daia disse que ia sair, ir na casa da sogra dela. A Ivone pediu pra ela ficar e fazer companhia pra Kaori. A Daia respondeu espontânea:

— Mãe, eu só vi ela uma vez e ela nem lembra, também nem conversou comigo. Meu irmão que tem que ficar pra fazer.

A Daia era meio ogra, falava tudo na lata mesmo. Rui não era muito diferente também.

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