Mundo ficciónIniciar sesiónKaori e Juliano foram para a casa dele, no caminho ela se queixou da música no carro, estava incomodando ela. O neurologista já havia alertado que as dores de cabeça podiam ainda ser bem presentes por muito tempo. Ela perdeu a consulta no psicólogo e precisava do encaminhamento para ir ao psiquiatra, pra poder tomar remédios diferentes. Reagendaram para sexta-feira de manhã. Ao chegar no prédio, o Juliano perguntou se ela podia levá-los até o andar dele, ela chateada disse que não, que só tinha vontade de apertar o último número porque parecia ser mais interessante. Ele mostrou qual era e pediu para ela anotar no celular o endereço certinho, para se caso algum dia quisesse ir lá sozinha, ter como. Ele comentou que ela tinha amigos lá, já tinham dito aquilo antes e ela não lembrava os nomes. Ele disse que podia chamar a Rafaela pra ir lá. Em desespero ela respondeu:
— Ahhh não, pai, por favor, eu não quero ver ninguém ainda, eu nem sei o que estão falando de mim por aí, meu cabelo tá horrível, todo despontado, olha pra mim como tô feia e eu não quero tratar ninguém mal porque não consigo lembrar do quanto gosto de cada pessoa. O Juliano a abraçou e disse que não iam forçar nada, que todo mundo ia respeitar o espaço e a recuperação dela. Ela entrou na antiga casa, olhou tudo conhecendo os cômodos, se surpreendeu com a cor de seu quarto, porque a cor preferida dela era outra e aquilo nem tinha muito a ver com ela. Ele riu e disse que a cor atual preferida era aquela mesma. Ela foi deitar na cama dele, que era maior e mais confortável. Ele perguntou se ela gostaria de só conhecer a Joyce, coisa rápida. Ela perguntou se elas se davam bem, ele disse que sim, normal, e que Joyce a defendia dele até. Ela aceitou jantar com a nova namorada de seu pai, com a condição de que poderia só comer e ir deitar se quisesse. Ele concordou e foi fazer comida pra eles. Quando a Joyce chegou, foi até o quarto. O Juliano apresentou ela como noiva. A Kaori disse que tinha ouvido falar muito dela e que estava curiosa, elogiou a beleza da Joyce, perguntou a idade e se desculpou pela indiscrição, ironicamente, mas disse que era notável a diferença de idade deles. Super tranquila, a Joyce levou na brincadeira. Foram para a sala de jantar e a Kaori ficou quieta a maior parte do tempo. Ela estava muito diferente na própria personalidade, talvez fosse a influência dos remédios ou do inchaço do cérebro pós-lesão. Ela quase não comeu e educadamente perguntou que horas iria pra casa. O Juliano disse que queria deixar ela lá quando a Lisa já estivesse chegado, pra ela não ficar sozinha. No meio das conversas, tocaram no assunto da gravidez, aquilo gerou um desconforto entre as duas. A Kaori perguntou se já tinham contado a ela após o acidente, ele respondeu que sim, mas só uma vez foi falado no assunto. Então a Joyce disse que estava tudo bem, que a Kaori nem precisava falar daquilo. Ela respondeu chateada: — Desculpa, não sei como me sinto sobre isso. Até onde me lembro, eles estavam casados ainda. Desculpa! Posso sair da mesa? Ambos falaram que sim, que estava tudo bem ela não lembrar das coisas, mas a cara da Joyce não foi das melhores. No fundo, ela achou que aquilo era tudo mentira. A Kaori foi para o quarto deitar, incomodada em ter que esperar a mãe chegar para poder ir pra casa. Antes da Joyce ir embora, ela foi se despedir e se colocou à disposição da Kaori para se caso ela quisesse sair, conversar, fazer qualquer coisa. Ela disse que podiam ir juntos na consulta, já que a Lisa ia estar trabalhando. O Juliano corrigiu ela, dizendo que a consulta era de manhã e que a Lisa ia levá-la. Aquilo, as correções e a confusão mental até com memórias recentes, a deixavam muito triste consigo mesma e pedindo desculpas a cada erro cometido. Por isso, ela só foi ficando cada vez mais quieta. Ficaram de marcar algo no sábado à tarde, um passeio talvez. Depois, mais tarde, o Juliano levou a Kaori embora. A Lisa já estava pra chegar. Agora indo e vindo de ônibus, ela perdia muito mais tempo pra ir e vir do trabalho. O Juliano ficou lá esperando; ele também queria falar com ela sobre o carro. Ele queria ajudar ela a comprar um carro ou pagar as parcelas do que deu perda total. Ela não aceitou, pediu pra ele não insistir porque o foco ali era só a recuperação da Kaori. Na verdade, ele se sentia culpado demais, por ter ido usar a ex sabendo que a noiva estava grávida em casa, esperando ele retornar do aniversário da filha. Eles dois também sabiam que com certeza nada daquilo teria acontecido com a Kaori se ela não tivesse pego os dois na cama, depois de divorciados. Eles só não sabiam que o Daniel e a Rafaela tiveram participação, suas parcelas de culpa. Durante o período que a Lisa estava em casa, a Kaori levantava, comia forçada, mas na ausência dela só ficava deitada e sem comer nada, dormia a maior parte do dia à base de calmantes. Na sexta-feira, elas levantaram cedo, iam na consulta. Decidiram ir sem o Juliano foi ideia da Kaori. Já cedo, teve choro por causa da roupa. Com o braço engessado, não era qualquer coisa que ficava boa e, muito mais magra que o normal, tudo ficava sobrando, ou mostrando uma magreza absurda que realmente parecia “doente”. Aquilo a incomodava muito. Após revirar o guarda-roupa, encontraram um vestido soltinho que ajudou a disfarçar. Ela colocou um tênis branco all star e prendeu o cabelo como deu, estava realmente feio. Foram de ônibus. As consultas eram bem difíceis porque ela tinha que falar do que não queria e era muito confrontada. Também tinham exercícios de memória. Os médicos falavam que ela tinha que tentar conviver com as pessoas que eram próximas para estimular a memória. Ela saiu da consulta prometendo que ia fazer algo, encontrar uma ou duas pessoas. Demoraram mais do que o esperado e a Lisa precisava ir trabalhar, mas não queria mandar a Kaori pra casa sozinha. Ela deu duas opções: ir para o trabalho do pai pra depois ir pra casa com ele, ou ir para o trabalho dela passar a tarde. O medo dela era deixar ela sozinha pelas ruas no bairro novo, perdida. Ela poderia também passar mal. A preocupação toda era coisa de mãe, e com razão. Ela preferiu ir para o restaurante. Deram o celular pra ela ajudar a responder os clientes pra passar o tempo mesmo. Ela ficou sentada no canto, assistindo televisão a maior parte do tempo. Comeu bem, comparado aos dias de solidão em casa. A Ivone, amiga de Lisa, toda hora queria enfiar todo tipo de comida e doces na Kaori, dizendo que era normal ela comer bastante antigamente. Ela disse que não se lembrava da Ivone, mas que com certeza gostava dela. Já era mais de 17:00, estavam se preparando para o movimento da noite, era sexta-feira, dia de grande movimento. A Lisa, apesar de gerente, fazia de tudo, vestia mesmo a camisa da empresa. Ela estava na cozinha e, como não estavam abertos, só estava a Kaori atrás do balcão no salão. Um rapaz abriu a porta e foi entrando. Ela falou: — Não estamos abertos ainda, falta um pouquinho. Posso ajudar? Ele respondeu sério, encostando no balcão perto dela: — Tem certeza que não está aberto? Porque eu não posso esperar, só preciso de uma marmita, deve ter sobrado algo do almoço aí. Sem graça e incomodada, ela respondeu: — Moço, desculpa, mas estamos fechados. Se você voltar daqui 30, 40 minutos, uma hora, podemos te atender da forma adequada. Ele respondeu: — Você trabalha aqui? Porque eu nunca te vi antes e venho bastante aqui. Todo mundo me conhece! Ela respondeu sem jeito que infelizmente não podia ajudar ele naquele momento. Quando ele ia responder, a Lisa saiu da cozinha e falou: — Oi, Rui! Sua mãe estava falando de você agora mesmo, vou avisar que você chegou. Ele ficou olhando pra Kaori e sorriu debochado. Ela levantou e falou, chateada: — Se você me conhece, isso não teve a menor graça. Por causa de gente como você que eu venho evitando sair de casa! Ele ficou sem jeito e falou: — Desculpa, eu não pensei que... Ela interrompeu e disse, se afastando e enxugando as lágrimas: — Tudo bem, não foi nada.






