Surpresa

O sol já havia se escondido quando Ana chegou em casa, trazendo a mochila pendurada no ombro e o cansaço da faculdade nos olhos. Empurrou a porta com o pé, respirando fundo ao sentir o cheiro quente da lasanha vindo da cozinha.

— Cheguei, mãe! — anunciou, largando as chaves na mesinha da entrada. — Uhn... que cheiro bom. O que temos pra jantar?

Luna apareceu na porta da cozinha, com o avental sujo de molho e um sorriso contido.

— Lasanha. Leva suas coisas pro quarto, a gente já vai jantar. E seu irmão?

Ana revirou os olhos, jogando os sapatos num canto.

— Me deixou aqui e disse que ia sair, que só voltava mais tarde.

Luna soltou um suspiro leve e murmurou, quase inaudível:

— Nem pra jantar com a irmã... Mas acho que você não vai sentir falta dele hoje.

Ana não respondeu. Subiu as escadas, arrastando a mochila, sem perceber o leve tremor na voz da mãe. Ao abrir a porta do quarto, foi surpreendida por um grito e um salto:

— SURPRESA!

Hannah caiu sobre ela num abraço forte, os cabelos misturando-se, os risos escapando em soluços emocionados. Ana deu um grito abafado e, em seguida, riu alto, abraçando a amiga com força.

— Hannah! Sua doida! O que você tá fazendo aqui?!

— Não consegui mais ficar longe. Eu precisava te ver.

Ana sentiu os olhos marejarem, o coração apertando no peito. A amizade delas sempre foi daquelas que nem a distância conseguia enfraquecer, mas ver Hannah ali, de verdade, parecia um presente inesperado.

— Eu senti tanto a sua falta.

— Eu também. — Hannah sorriu, encostando a testa na dela. — Mas agora tô aqui.

Elas passaram a noite conversando, trocando confidências e rindo de memórias antigas. A luz do abajur manteve o quarto quente e cômodo, enquanto os ponteiros do relógio giravam sem pressa. Dormiram tarde, como nos velhos tempos, quando nenhuma conversa era pequena demais para virar madrugada.

No dia seguinte, Luna deixou que as duas dormissem um pouco mais. A casa estava em silêncio, exceto pelos sons vindos do jardim. Guilherme, o irmão de Ana, estava por lá desde cedo, seguindo o pedido da mãe para reorganizar os vasos e podar algumas plantas.

Quando Hannah e Ana finalmente se levantaram, ainda com os olhos semiabertos e cabelos bagunçados, desceram para tomar café. Ao saírem para o quintal, o sol já beijava as folhas com intensidade, e foi ali que o inesperado aconteceu.

Hannah parou subitamente no batente da porta.

— Uau...

Ana a olhou de lado, franzindo a testa.

— Que foi?

— Quem é aquele? — Hannah apontou com a cabeça.

Ana seguiu o olhar da amiga até o canto do jardim. Guilherme, com a camisa suada colada nas costas, estava agachado, ajeitando uma roseira. Os cabelos caíam desleixados sobre os olhos e os braços, agora mais definidos, moviam-se com precisão e calma.

— Hã? Não reconhece? Meu irmão.

— Nãaaaao... — Hannah arregalou os olhos. — Aquele chato do teu irmão???

Ana riu.

— Unhum. Ele agora é artista, sabia? Escultor, pintor... bem conhecido em Brisamar.

Antes que pudessem comentar mais alguma coisa, Guilherme se levantou, limpando as mãos na calça jeans, e notou a presença delas.

— As donzelas acordaram. Bom dia. — O sorriso torto apareceu. — Hannah, não sabia que você tinha voltado. Se soubesse, teria ficado pro jantar ontem. Hoje minha mãe me contou tudo.

— Muita coisa mudou, né? — Hannah respondeu, ainda tentando assimilar aquela nova versão de Guilherme.

Ela não conseguia parar de olhar. Algo nele estava diferente. Era mais do que o corpo ou o jeito seguro. Tinha algo no olhar, na forma como ele falava, como se tivesse atravessado alguma dor e voltado mais inteiro. Uma faísca acendeu dentro dela e, de repente, Hannah sentiu o ar rarefeito.

(*pensamento: "Não... quase sem fôlego... vai mais devagar, por favor... que corpo é esse?")

— Eita! Foi mal... — ela murmurou, notando que estava encarando demais.

Ana soltou uma risada.

— Ele até que melhorou, viu? Teve até uma namorada. Iam noivar. Foi ela quem descobriu esse dom dele pra pintura.

Hannah virou-se para Ana, surpresa.

— Sério?

— Sério. Mas a bonita encontrou um cara famoso por aí e terminou com ele. Desde então, meu irmão vive pras criações dele. Acha que vai esfregar na cara dela o que ela perdeu.

Hannah soltou um "unnnn" sem muita certeza do que dizer.

— Mas até eu trocaria, viu? O cara era um gostosão... e meu irmão, feio desse jeito? Sem chance!

Hannah tentou rir.

— (riso forçado) Hehehe... verdade. Feio que dói.

Mas o coração dela dizia outra coisa. Ainda ali, de pé, sob o sol morno da manhã, ela soube. Alguma coisa havia mudado.

Nela.

Nele.

Entre eles, talvez.

E enquanto voltava os olhos para Guilherme, que voltava a se ajoelhar diante de um vaso de hibisco, Hannah sentiu algo dentro dela florescer. Não era amor ainda. Não era paixão. Era curiosidade. Era desejo. Era um capítulo novo, ainda por escrever.

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