4- Matteo

Matteo:

— Venha, Matteo. Está na hora.

O gosto amargo de suas palavras me atingiu. Alessandro sempre dissera que me protegeria, mas, naquele instante, eu soube que algo estava prestes a mudar.

— Hora do quê? — perguntei, minha voz baixa, quase inaudível.

— Hora de saber a verdade. Era isso o que você estava buscando, não era? — Ele me lançou um olhar penetrante, e percebi que eu não tinha escapatória. — Você é um homem agora, Matteo. É hora de entender os negócios da família.

Caminhamos lado a lado por um longo corredor de pedras, até que ele abriu uma porta secreta escondida atrás de uma estante de livros. Descemos três lances de escada, e, à medida que a temperatura e a luz diminuíam, uma sensação de desconforto se intensificava dentro de mim. Eu sabia estarmos entrando em uma parte da mansão que eu nunca havia visto antes.

Entramos em uma sala escura, onde alguns dos homens de Alessandro já estavam reunidos. Eu os conhecia de vista, homens sombrios que vigiavam a propriedade dia e noite. Mas, naquele momento, havia algo diferente em suas expressões. Eles estavam sérios, atentos, como se esperassem algo importante. Aquela era a Blackwood, e suas expressões eram sombrias por minha causa.

Paramos diante de uma cela de pedra, onde uma figura encurvada e ensanguentada tentava, em vão, se erguer. A curiosidade venceu, e me aproximei das barras para olhar melhor. Lá dentro, um homem espancado e mutilado me encarava com um olhar vazio. Ele estava coberto de cortes, contusões, e um dos olhos estava inchado, quase fechado. Quando tentou falar, nada saiu, e eu percebi, com um calafrio, que haviam cortado sua língua.

Fiquei petrificado, olhando para aquele homem, incapaz de processar o que estava diante de mim. O homem que eu chamava de tio, que eu considerava como um pai, era o responsável por aquilo.

Alessandro, percebendo meu choque, falou com uma voz dura e sem emoção:

— Está vendo este homem?

— Sim… — sussurrei, meu corpo tremendo. O que estava acontecendo ali?

Ele apontou para o homem ajoelhado, que agora tremia ainda mais, em uma súplica muda.

— Esse homem traiu nossa família, Matteo. Ele escolheu a si próprio em vez da irmandade. É um rato. Um traidor. E como eu disse, farei o que for necessário para proteger esta família.

Antes que eu pudesse responder, Alessandro sacou uma arma de dentro do casaco e, com um movimento rápido, disparou contra a cabeça do homem.

O corpo caiu com um baque seco, o sangue espirrando na parede atrás dele.

Eu ofeguei, tentando prender a voz que ameaçava escapar da minha garganta. Medo, confusão e desespero inundaram meu peito. Como Alessandro podia simplesmente… matar alguém assim? Eu mal conseguia entender o que tinha acabado de acontecer. A Blackwood sempre fora um conceito distante para mim, algo que nunca poderia tocar a minha vida. Mas ali estava ela, brutal e impiedosa, diante dos meus olhos.

Alessandro guardou a arma como se fosse uma ferramenta qualquer e virou-se para mim, os olhos avaliando minha reação.

— É assim que lidamos com traidores nesta irmandade.

Havia apenas uma escolha. Ou eu me unia a eles, ou sucumbia. Naquele instante, compreendi que meu tio me queria ali não apenas para testemunhar, mas para me transformar.

— Você entende isso, Matteo? — perguntou, com um tom firme que não deixava espaço para dúvidas.

Segurei o choro e assenti.

— Sim, senhor.

Alessandro parecia satisfeito. Ele deu um tapinha em minhas costas enquanto os outros homens me observavam, aprovando minha resposta com um aceno. Eu passara no teste, mas sentia que algo em mim havia se partido. Em dez minutos, uma parte de quem eu era havia sido arrancada.

— Bem-vindo à irmandade, Matteo — ouvi os outros murmurarem em russo ao meu redor.

Naquela noite, deitei na cama com a mente turva, sabendo que um pedaço da minha alma havia morrido naquela cela.

Naquela noite, eu deixei de ser o garoto conhecido como Matteo Romano.

Naquela noite, eu me tornei parte da Blackwood. E nunca mais chamei Alessandro de “Tio”.

Depois daquela noite, minha vida mudou completamente. Alessandro agora me tratava menos como família e mais como um membro oficial da irmandade. Meu mundo se encheu de horários rígidos, reuniões e tarefas que precisavam ser concluídas, como se tudo fosse parte de um treinamento para algo maior.

Com o tempo, sentia o garoto que eu fora se esvaindo. Sumiram as conversas descontraídas com Alessandro, as tardes cozinhando com Caterina, as noites assistindo filmes antigos juntos. Sumiram as horas jogando videogame ou vagando pelos jardins da mansão. Qualquer resquício de infância foi arrancado de mim.

Esses momentos foram substituídos por aulas de autodefesa, lições sobre a estrutura da Blackwood e treinamento com armas. Para os outros, o garoto que eu era já não existia há tempos. Eu era tratado como um homem.

Como parte da Blackwood, fui enviado para a Academia Orlov, uma escola privada para “os filhos da Blackwood”. Alessandro gostava de dizer que era para a minha segurança e educação, mas eu sabia que era só mais uma desculpa para me isolar do resto do mundo. Na Academia Orlov, os professores faziam parte da irmandade, e os alunos eram jovens recrutados ou filhos dos principais membros da Blackwood. Todos ali tinham um único destino: juntar-se à irmandade. As aulas eram diferentes das de qualquer escola comum. Além de Matemática e Russo, eu aprendia sobre explosivos nas aulas de Química, estudava como falsificar documentos nas aulas de Arte e acima de tudo, aprendia sobre política. Tudo ali tinha um propósito: preparar-nos para servir à Blackwood, onde o sucesso de cada membro significava o sucesso de toda a irmandade, e onde não havia espaço para erros.

Tentei resistir, tentei me manter distante dessa realidade, mas a imagem do homem que vi ser morto na minha frente nunca desapareceu dos meus pensamentos, nem a frieza com que Alessandro o matou. Temia que meu destino fosse o mesmo se eu não me entregasse completamente.

Com o tempo, porém, percebi que a Blackwood era mais do que um grupo de criminosos. De uma maneira distorcida, eles eram uma família, uma irmandade que acolhia quem mais ninguém queria. Lutavam e morriam pela Blackwood, pois, para eles, não havia honra maior. Alessandro cuidava dos seus, e a Academia Orlov existia para isso: para dar um lar aos filhos de seus membros, para abrigar os órfãos e rejeitados de Moscou. Ele recompensava a lealdade com proteção, assegurando que todos tivessem um lugar ao seu lado. Por isso, tantos homens estavam dispostos a morrer por ele. E, aos olhos de todos, eu era o herdeiro natural de Alessandro, destinado a um dia ocupar seu lugar.

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