3- Matteo

Matteo:

A ideia de Alessandro para me proteger foi me arrancar de tudo que eu conhecia, me levar para a Rússia, a milhares de quilômetros da minha antiga vida. Moscou se tornou meu novo lar, um lugar de invernos frios e sombrios, onde precisei reaprender o significado de “família”. Alessandro não fez isso sozinho. Sua irmã, Caterina, me acolheu como uma mãe, trazendo uma ternura inesperada que, pouco a pouco, ocupava o vazio que eu carregava. Ela já tinha seus próprios filhos, adultos agora, mas minha presença parecia acender algo novo nela. Com seu jeito caloroso e gentil, ela me lembrava de minha mãe, e mesmo que no começo a língua fosse uma barreira, nos entendíamos nos gestos, nos abraços, em cada refeição que ela preparava, como se cada prato fosse uma promessa silenciosa de que eu estava seguro.

Caterina me acolhia como uma mãe faria, enquanto Alessandro assumia o papel que eu não sabia que precisava: uma figura paterna rígida, quase implacável. Ele não era como meu pai, Enzo, que transbordava vitalidade, mas, à sua maneira, ele me ensinava a sobreviver. A primeira regra foi o idioma — ele exigia que eu dominasse o russo, como se a língua pudesse me moldar, trazer à tona uma nova versão de mim. Com uma disciplina incansável, ele traçou meu caminho: uma educação rigorosa, habilidades de sobrevivência, e acima de tudo, a honra. Ele parecia determinado a reconstruir o garoto quebrado que encontrou naquela noite fatídica, como se quisesse transformar minha dor em força, minha perda em propósito.

Com o tempo, formamos um laço que nunca pensei ser possível. Eu já não me via como o garoto perdido de Nova York, mas como alguém que, de alguma forma, encontrara uma nova família. E durante anos, isso foi o suficiente. Eu sentia uma segurança que pensava nunca mais poder experimentar.

Enquanto isso, do outro lado do mundo, a tragédia que havia levado minha família continuava a alimentar a sede insaciável da mídia americana. Meu sobrenome se tornou um símbolo de mistério, o “acidente” um espetáculo macabro explorado a cada oportunidade. Mas Alessandro me manteve protegido. Em Moscou, vivíamos em uma propriedade isolada, fora do alcance dos repórteres e longe de tudo que pudesse me lembrar de Nova York.

Havia outra verdade escondida de mim: o destino da empresa de minha família. A MOREAU, o império que Enzo havia construído, estava sendo cuidada pelo velho amigo do meu pai, Carlo Ferretti. Ele assumira o papel de CEO interino, protegendo o legado da família Romano, zelando para que tudo estivesse em ordem quando eu pudesse, finalmente, retomar meu lugar. Para o garoto que eu era, todas as complexidades do mundo dos negócios e dos bilhões de dólares eram distantes, irrelevantes. Durante anos, apenas a promessa de Alessandro de que ele cuidaria de mim bastou para me fazer seguir em frente.

Eu não precisava de mais nada.

Até que um dia isso não foi mais o bastante.

A mudança veio devagar, uma sombra silenciosa crescendo dentro de mim. A segurança que eu sentia ao lado de Alessandro e Caterina foi, lentamente, cedendo espaço a outra coisa — um pulsar inquieto, uma necessidade latente que eu mal conseguia explicar. Era mais do que o desejo de reivindicar o que era meu. A cada dia, a lembrança da noite em que perdi minha família se tornava mais intensa, me corroendo por dentro. Eu queria justiça, mas não a justiça lenta e vazia das leis. Eu queria vingança, desejava que aqueles responsáveis pela nossa dor sentissem cada segundo de agonia que eu sentira naquela noite.

Sabia que não poderia mais apenas aceitar meu destino. Para honrar minha família, para dar sentido ao que havia sido tirado de mim, eu precisava assumir o controle. Precisava me tornar o homem que Alessandro se esforçara tanto para me transformar, aquele que teria forças para se vingar, para recuperar o que era nosso — e fazê-lo do meu jeito, com as próprias mãos.

Levou um tempo até eu entender completamente o que meu pai e Alessandro realmente faziam da vida. Não que a MOREAU não fosse uma empresa de verdade. Ela era — haviam mais de vinte mil funcionários ao redor do mundo para provar isso. Mas a empresa era muito mais do que aparentava.

A primeira vez que ouvi falar em "lavagem de dinheiro" foi no noticiário, meses antes de perder minha família. Eu não dei muita importância. Era só mais uma notícia entediante para mim, e logo voltei minha atenção para o gibi em minhas mãos, enquanto meus pais trocavam olhares preocupados. Eu era jovem demais para perceber o peso daquele assunto.

Quando cheguei à Rússia, fiquei algum tempo alheio a tudo isso. No começo, o idioma era uma barreira, mas eu era rápido para aprender. Aos treze anos, já conseguia entender conversas inteiras, e foi em uma dessas ocasiões que acabei ouvindo mais do que deveria. Passeando pelos corredores da mansão, parei quando reconheci a voz de Alessandro discutindo calorosamente com Marco, um de seus parceiros de negócios. A conversa era tensa, e o que ouvi esclareceu tudo: a MOREAU era uma fachada para a lavagem de dinheiro da Blackwood Solntsevskaya.

Um choque frio percorreu minha espinha. Eu já sabia da existência da Blackwood. Ouvi falar sobre eles na TV, mas pensava neles como uma ameaça distante, algo que acontecia fora daquelas paredes. Agora, percebia que o poder da Blackwood estava mais perto do que eu poderia imaginar. Ela era a maior e mais poderosa organização criminosa da máfia russa, controlando atividades ilegais desde os anos 80. Apesar de serem violentos, eles seguiam um rígido código de honra e lealdade.

Depois desse dia, fiz de minha própria missão desvendar o que se passava. Minha curiosidade não era apenas uma questão de saber mais — era sobre entender que tipo de vida eu estava herdando. Logo descobri que Alessandro Vitale, o homem que havia me acolhido após a morte da minha família, o homem que eu chamava de tio, era o Pakhan, o líder da Blackwood.

Foi durante uma dessas tentativas de entender o mundo ao meu redor que Alessandro me pegou de surpresa.

— Matteo! — ele disse, seu tom carregado de frustração e algo mais. Eu senti um aperto no peito. Não sabia exatamente o que ele estava sentindo, mas uma coisa era clara: não estava feliz comigo.

— Tio Alessandro... — Minha voz saiu rápida, com um toque de desespero. Minha respiração se acelerou, e meus olhos buscaram o chão, tentando escapar do olhar penetrante dele. Eu não queria que ele percebesse o quanto eu estava envolvido.

Esfregou a barba com a mão, os olhos fixos em mim. — Você já deveria estar na cama. Você conhece as regras, Matteo.

Engoli em seco, tentando me recompor.

— Sim, tio.

Alessandro trocou um olhar silencioso com Marco, que, em um aceno, se retirou da sala. Em seguida, ele pousou uma mão firme sobre meu ombro, estudando-me com uma expressão indecifrável.

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