Clara Vasconcelos
A casa parecia respirar num compasso próprio quando atravessei o hall, como se cada parede sentisse o peso do que eu trazia comigo: o rastro teimoso do perfume da loja, o farfalhar cansado do tecido novo e o eco sufocado de tudo o que foi dito e esmagado entre vitrines, provadores e expectativas que não eram minhas.
A porta se fechou atrás de mim com um clique educado, e por dentro um mundo inteiro se fechava também, dobrando-se como um guarda-chuva encharcado.
Maria surgiu do corredor com aquele sorriso que sempre soa como “estou aqui”. O tipo de sorriso que segura uma casa no lugar.
— Boa tarde, senhora… — ela começou, mas a voz suavizou quando viu meus olhos. — Chegou agora?
Assenti, tentando puxar do fundo do peito um sorriso que não doesse.
— Cheguei.
O olhar dela desceu para a sacola pendurada no meu antebraço, a sacola que parecia pesar uma tonelada e voltou ao meu rosto com um cuidado tão grande que quase me desmontou ali mesmo. Maria sempre sabe quando algo