Eu sabia que estava me comportando como uma garota mimada, mas o problema era o medo enorme de perder meu irmão. E ele percebeu disso, então resolveu mudar o assunto.
— Vamos parar de falar de mim e falar de você. Como você está? Parece cansada.
— O trabalho tem me consumido um pouco. O cansaço é porque estive de plantão e só saí agora pela manhã — me justifiquei.
— Agora tem um irmão para te dar ainda mais trabalho.
— Você sabe que jamais pensaria isso de você. Tenho uma coisa para te contar. Já devia ter falado antes, mas não queria pelo telefone. Quero que prometa que não vai contar nada para a mamãe nem para o papai, pelo menos por enquanto — ele me olhou curioso e assentiu com a cabeça. — Fui pedida em casamento!
— Como assim? Quem é ele? Eu nem sabia que você estava namorado! Já tinha até imaginado que você ia ficar para titia — brincou, e dei um tapa no ombro dele, o que o fez cair na gargalhada. — Agora fiquei curioso… quem é o corajoso que resolveu assumir a bomba-relógio chamada Amanda Bernardes.
— Bomba-relógio? — perguntei, rindo.
— O cara vai descobrir isso sozinho, não preciso dizer nada! Mas… quem é ele?
— O médico que me acompanhou até aqui mais cedo, o Julian. Somos colegas de apartamento — respondi, e vi os olhos do meu irmão se arregalarem. — Já ficávamos há bastante tempo, então ele disse que isso já contava como namoro… e me pediu em casamento. Ele é neurologista.
Nesse momento, Felipe deu uma gargalhada, e eu franzi a testa, sem entender.
— Talvez ele consiga colocar juízo nessa sua cabeça! — disse, ainda rindo. — Junta o útil ao agradável. Você vai ser a mulher e a estudo do caso dele ao mesmo tempo!
— Vai à merda, Felipe — falei, fazendo bico, embora soubesse que ele estava apenas brincando. Isso o fez rir ainda mais.
— Falando sério, irmã… espero que ele apareça por aqui em algum momento. Estou muito feliz por você! Você se dedicou demais para chegar até aqui. Abriu mão de muita coisa, deixou a vida social de lado para estudar. Agora é hora de aproveitar um pouco. Espero estar bem logo para podermos comemorar juntos. Ah, e diga a ele que o próximo passo só acontece se eu aprovar. Quero conhecer esse idiota pessoalmente para deixar claro os riscos que ele corre se te magoar.
Aquelas palavras encheram meus olhos de lágrimas.
— Não chora, sua manteiga derretida — disse ele, me puxando para um abraço. Ficamos ali, em silêncio, aproveitando aquele momento.
— Agora é minha vez, Sr. Felipe… você e a Lara estavam tentando ter um bebê há muito tempo?
— A Lara não pode ter filhos, Amanda — respondeu ele, e aquilo me pegou de surpresa. O encarei, esperando que continuasse. — Vamos ter nosso bebê por meio de uma barriga de aluguel. Mas, com todas as despesas médicas, adiaremos um pouco esse plano. No momento, tudo parece muito improvável… mas não quero pensar nisso agora.
— Vocês já iniciaram o tratamento?
— A clínica só estava esperando a pessoa que vai gerar o bebê. Estávamos pesquisando, estudando as possibilidades. São muitas coisas a considerar. Os custos não envolvem só o bebê… a mulher que for gerar também precisa de acompanhamento constante — explicou ele.
— Por que você não falou comigo? E
Ele me olhou, surpreso com a minha proposta.
— Eu nunca pediria que você abrisse mão da sua vida para realizar um sonho meu, Amanda. Você estava cursando medicina, se dedicou tanto... não seria justo.
— Irmão, é o seu sonho! O que são nove meses diante de uma realização tão importante? Eu sou a candidata perfeita para isso. Além do mais, já tenho cobertura médica, o que ajudaria a reduzir bastante os custos. E, pelo que entendi, você já pagou a clínica, não é?
— Mas, Amanda... você estaria gerando meu filho antes mesmo de ter o seu. Sem contar a situação com o seu noivo. Eu não quero te trazer complicações. E ainda tem a minha própria situação, que nem sabemos como vai evoluir.
— Justamente por isso quero te ajudar, Felipe. É o seu sonho, então me deixa fazer parte dele. Eu ficaria mais do que feliz em ser o meio para torná-lo realidade.
Eu não queria dizer em voz alta, mas sabia que havia a possibilidade de meu irmão não viver por muito tempo. E isso doía. Desejava, do fundo do coração, que o sonho dele de ser pai pudesse se tornar realidade. Sabia que eu podia ser a pessoa a tornar isso possível. Além disso, Julian entendia o quanto meu irmão era importante para mim — e eu acreditava que ele também me apoiaria nessa decisão.
— Você tem certeza disso, Amanda? — ele perguntou, sério. — Não quero que se sinta obrigada a aceitar por causa da minha situação. Podemos encontrar outra solução mais adiante.
— Nada me deixaria mais feliz do que carregar meu sobrinho... ou sobrinha — respondi, rindo.
Naquele instante, meu irmão ficou com os olhos cheios de lágrimas e me puxou para mais um abraço apertado.
— Obrigado, irmã! Você está realizando um grande sonho meu. Só espero que essa doença não me leve antes que eu possa segurar meu filho — ou minha filha — nos braços.
— Você vai superar isso, Lipe. Vai segurar seu filho nos braços, eu tenho certeza. Agora, descansa um pouco.
Na verdade, eu precisava acreditar naquelas palavras — mesmo sabendo que as chances ainda eram baixas. Não conseguia aceitar a ideia de perder meu irmão.
Me levantei da cama e fui até o pequeno sofá no canto do quarto. Deitei ali, peguei meu celular e enviei uma mensagem para o Julian.
(Amanda): Amor, como está seu plantão? Meu irmão está um pouco melhor. Vou passar a noite aqui, e a Lara vem me render amanhã. Julian, eu preciso conversar com você sobre algo muito importante.
(Julian): Oi, meu amor. Está um pouco corrido aqui, mas, se você quiser, eu te ligo mais tarde ou passo aí para a gente conversar. É só me dizer o que prefere.
(Amanda): Não precisa, amor! A gente conversa amanhã com calma. Sei que você está de plantão, então se concentra aí. Te amo!
(Julian): Diz para o seu irmão que em breve teremos tempo para nos conhecer melhor. Eu também te amo!
Aquele era um assunto muito delicado para ser tratado por telefone, e, como estávamos no ambiente de trabalho, preferi não misturar a vida pessoal com a profissional.